O contraste de arquitetura e paisagismo com poluição escancarada é uma lembrança que belo-horizontinos e turistas fatalmente guardam da Lagoa da Pampulha. E as metas iniciais de descontaminação do reservatório incluído no conjunto que foi elevado a patrimônio cultural da humanidade, em 2016, pouco avançaram. A administração municipal da época sonhava com um lago que permitiria recreação e até mergulho, sendo que o então prefeito Marcio Lacerda disse que pretendia velejar no manancial, em 2017. Isso seria possível se as águas, consideradas extremamente contaminadas, de classe 4, atingissem a classe 2 de qualidade segundo os parâmetros do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama). Contudo, o reservatório ainda se encontra na classe 3, na qual apenas os contatos indiretos e esporádicos são recomendados, sob risco de prejudicar a saúde humana. E é nesse nível que a atual prefeitura pretende manter a Lagoa da Pampulha. “O objetivo das ações (de despoluição) executadas na Lagoa da Pampulha é o enquadramento da água como classe 3”, informou a Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap).
Uma das fontes de poluição mais importantes identificadas na Pampulha durante a candidatura da sua orla como patrimônio reconhecido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) era o esgoto. Segundo os estudos desenvolvidos com essa finalidade, as fontes mais volumosas desses dejetos vinham de Contagem, na Grande BH, por meio dos afluentes que passam por aquele município e deságuam na Pampulha. Comprometida em atacar esse problema, a Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) conseguiu aumentar a coleta e tratamento da Bacia Hidrográfica da Pampulha de 87% para 95%, em 2017. Porém, essa cobertura estacionou nesse nível nos últimos 2 anos. O ingresso de esgoto, por meio desses mananciais, ainda é um problema flagrante que se consegue detectar pelo mau cheiro que exala nesses pontos de deságue e até visualmente, com a aparição de línguas negras contaminando a água.
De acordo com a Copasa, há atualmente cerca de 10 mil imóveis classificados pela companhia como “factíveis”, ou seja, aqueles que, mesmo com rede de esgoto na rua, ainda não estão conectados aos serviços de esgotamento sanitário. Situação que é observada devido ao fato de muitos dos moradores desses imóveis rejeitarem a cobrança pelo lançamento de esgoto. “Como a Copasa não tem poder legal para obrigar a população a interligar seus imóveis à rede de esgoto, a empresa desenvolve, permanentemente, trabalhos de mobilização social para conscientizá-la sobre a importância da coleta e do tratamento do esgoto para a saúde e o meio ambiente, no intuito de buscar a adesão desses imóveis ao sistema”, informou a companhia.
Uma ação da Prefeitura de Belo Horizonte chegou a ser lançada para tratar o esgoto que chega pelos córregos afluentes antes que esse material contaminado ingressasse no reservatório. O projeto Jardins Filtrantes, de 2016, visava a essa purificação dos dejetos por meio de pequenos cursos de água com pedras, areia e plantas aquáticas onde o esgoto é tratado antes de chegar ao lago. Contudo, em 2018, essa ação foi abandonada sob o argumento de que devido à “ampliação dos trabalhos de cobertura de coleta e interceptação de esgotos sanitários realizados pela Copasa, entre 90% e 95%, bem como os bem-sucedidos serviços de recuperação da qualidade da água da represa realizados entre 2016 e 2018, o poder público decidiu pela não implantação de intervenções para tratamento dos córregos afluentes. Portanto, foi descartada a implantação do projeto Jardins Filtrantes, originalmente proposto para o Córrego D’Água Funda”, afirma a Sudecap.
Atualmente, a Prefeitura de Belo Horizonte realiza três ações para despoluir a lagoa: a limpeza diária do espelho d’água, o desassoreamento e o tratamento da qualidade da água. A limpeza é realizada por cerca de 30 funcionários da superintendência, que diariamente recolhem seis toneladas de lixo, móveis, peças de veículos, utensílios e outros objetos. Na época das chuvas, esse volume chega a dobrar. Os serviços de desassoreamento têm como base o revolvimento de sedimentos depositados no fundo do reservatório ao longo de anos, por meio de retroescavadeiras. Uma nova etapa de desassoreamento teve início em outubro de 2018 e o contrato terá vigência até 2022. Com isso, a expectativa é de que sejam retirados aproximadamente 460 mil metros cúbicos em quatro anos. Serão investidos R$ 33 milhões nesses trabalhos. Na primeira fase, foram retirados 85.965 metros cúbicos de material, sendo prevista, para todo o ano de 2019, a coleta de 158 mil metros cúbicos de resíduos.
No tratamento da água são aplicados dois remediadores na lagoa, o Phoslock e o Enzilimp. O primeiro é capaz de promover a redução do fósforo e controlar a floração de algas. O segundo tem a função de degradar o excesso de matéria orgânica e reduzir a presença de coliformes fecais. No último relatório, apresentado em junho, quatro dos cinco indicadores já atingiram novamente a classe 3. Somente a concentração de fósforo total ficou um pouco acima da meta estabelecida, o que já era previsto, uma vez que o trabalho concomitante de desassoreamento da lagoa, ao revirar o lodo depositado no fundo do reservatório, eleva a concentração de fósforo na água.
Caça aos lançamentos irregulares
Para atingir a captação total do esgoto que chega à Lagoa da Pampulha, a Copasa informou que desenvolve, em conjunto com os municípios de Belo Horizonte e Contagem, um trabalho de identificação e correção de lançamentos indevidos de esgoto em galerias pluviais e sarjetas das vias públicas em vilas, aglomerados, favelas e em fundos de vales que, para ser corrigidos, exigem melhorias na urbanização. “No momento, a Copasa está realizando obras de desassoreamento do interceptor da margem direita da lagoa, localizado entre a Toca da Raposa e a Avenida Antônio Carlos, para evitar o extravasamento de esgoto na lagoa no período das chuvas. Essas obras, com recursos da ordem de R$ 10 milhões, foram iniciadas em agosto de 2018 e a previsão é de que sejam concluídas em dezembro de 2019”, informou a companhia.
O índice de remoção de 95% do esgoto foi conseguido depois de a Copasa ter implantado 100 quilômetros de redes coletoras e interceptoras e de construir nove estações elevatórias, que possibilitaram a coleta, a interceptação e o encaminhamento do esgoto gerado para a Estação de Tratamento de Esgoto – ETE Onça. “Essas obras foram concluídas em dezembro de 2016. Além disso, foram implantados, em 2017, mais 13 quilômetros de redes coletoras e interceptoras. Todas essas obras envolveram recursos da ordem de R$ 115 milhões e possibilitaram que mais imóveis passassem a ter a disponibilidade dos serviços de esgotamento sanitário”.