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Estado de Minas

'Se a Fhemig não se readequar, será deixada de lado', diz novo presidente

Novo presidente da Fundação Hospitalar de Minas, a maior no país, alerta para a necessidade de adequação estrutural e decreta: é preciso evitar desperdício de material, tempo e talentos


postado em 22/07/2019 06:00 / atualizado em 22/07/2019 07:43

"É preciso dar o valor que a Fhemig merece e rediscutir a otimização, para ver como ela vai se apresentar nos próximos anos. Se não se readequar, será deixada de lado", Fábio Baccheretti Vitor, médico radiologista e o mais jovem presidente da história da fundação (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
Ele tem apenas 35 anos, fez carreira no Hospital Júlia Kubitschek, na Região do Barreiro, em Belo Horizonte, onde começou em 2011 como plantonista da unidade de emergência e chegou a diretor-geral. Depois de passar 11 meses na função, o radiologista Fábio Baccheretti Vitor recebeu o maior desafio da profissão: estar à frente da maior fundação hospitalar do país, a do estado de Minas Gerais (Fhemig), da qual se tornou o presidente mais jovem.

E esse desafio inclui reinventar a maior e mais importante rede de saúde mineira. Da forma como está e vivendo um momento financeiro delicado, é questão de tempo para uma redução drástica no número de pacientes atendidos e na qualidade do serviço prestado pela instituição, acredita o médico. Melhorar processos e evitar desperdícios de materiais, tempo e talentos são prioridade em um cenário com recursos à míngua, redução no quadro de servidores e sem perspectiva de caixa mais gordo nem de reposição de profissionais. “É preciso dar o valor que ela merece e rediscutir a otimização da Fhemig, para ver como ela vai se apresentar nos próximos anos. Se não se readequar, será deixada de lado”, diz Baccheretti.

A fundação é a maior do Brasil e faz desde o atendimento primário até o de altíssima complexidade. Essa heterogeneidade faz dela uma instituição diferenciada. São 20 unidades prestando assistência exclusivamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS). O desafio de fazer melhor, estabelecido pela nova presidência, inclui unidades de especialidades mais completas, que possam tratar o paciente do início ao fim. Isso em um cenário em que a redução do número de servidores sofre o impacto ainda da aposentadoria de servidores cedidos pelo Ministério da Saúde, que não têm reposição legal. O Hospital Júlia Kubitschek, na Região do Barreiro, em Belo Horizonte, o segundo maior da rede, tinha 150 servidores do ministério no ano passado. Este ano, tem apenas 50 – 100 a menos e sem perspectiva de reposição. “A diminuição do recurso humano e o recurso de custeio não vem acompanhando o aumento de custo”, afirma o presidente.

Na área da saúde, contratações e substituições foram mantidas no início do ano, quando o governo dispensou contratados em secretarias estaduais. Mas outros cortes são vinculados à Lei de Responsabilidade Fiscal, que é automática e ultrapassa decisão de governo, conforme explica o dirigente da Fhemig. “Saúde é privilegiada em reposição de pessoal, mesmo a lei já estando estourada”, diz.

Sufoco na pediatria


A exceção este ano ficou por conta do Hospital Infantil João Paulo II, referência no estado. Durante o surto de dengue e a chegada do período de doenças respiratórias, a unidade experimentou o caos, com demanda aumentada em 400%. Pacientes chegaram a esperar até 15 horas por atendimento, por causa da falta de pessoal. Em alguns plantões, apenas dois médicos estava trabalhando, atendendo a consultas e pacientes internados, simultaneamente.

Nesse caso, as contratações não foram possíveis por causa de concurso público que ainda está válido. Pelas regras, o hospital não pode contratar, já que precisa convocar os já aprovados. O prazo legal para cada um, entre a convocação e a efetivação, chega a 60 dias. A situação só foi amenizada depois que o decreto de emergência editado pelo governo do estado diante da epidemia de dengue possibilitou contratações temporárias por 90 dias.

Fábio Baccheretti lembra que o João Paulo II funciona como porta de entrada de crianças na Região Centro-Sul de BH, é referência em todo o estado, além de proporcionar atendimento a doenças complexas. Diante do inchaço, a ideia da nova gestão da Fhemig é rediscutir o sistema com o município de Belo Horizonte, seja para melhorar o atendimento internamente, seja para planejar um atendimento pediátrico na própria estrutura municipal. A expectativa é de que a Prefeitura de BH assuma um atendimento infantil em sua rede para desafogar o único hospital especializado na capital. Mas, a discussão é incipiente.

Modelos de gestão também estão sendo implementados em toda a fundação para ter a real dimensão de quantas pessoas são necessárias em cada unidade, para cada serviço, possibilitando redistribuir eventuais excessos. Apenas com custeio, os gastos da Fhemig são de aproximadamente R$ 30 milhões por mês – valor usado para o pagamento de fornecedores, empresas de serviços, restaurantes, lavagem e locação de roupas, entre outros.

Na visão de Fábio Baccheretti, é urgente diminuir essa despesa, renegociando contratos. “Nosso custeio é maior que a capacidade financeira de honrar os compromissos em dia”, avisa. Evitar o desperdício se tornou uma palavra-chave para equilibrar situações também cotidianas, como estoque de certos medicamentos e prateleiras vazias de outros. É preciso planejamento de logística e suprimentos para comprar na quantidade certa e ter estoques mínimos, garantindo os insumos em tempo integral.

Hospital de Pronto-Socorro João XXIII é uma das estrelas do complexo, referência no atendimento a politraumatizados, queimados e a casos de intoxicação(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A PRESS - 20/12/2017)
Hospital de Pronto-Socorro João XXIII é uma das estrelas do complexo, referência no atendimento a politraumatizados, queimados e a casos de intoxicação (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A PRESS - 20/12/2017)


REFERÊNCIA MUNDIAL


E tudo tem que funcionar bem, mesmo com a saúde financeira fragilizada. “O grande facilitador é saber que o João XXIII (Hospital de Pronto-Socorro João XXIII) e outros, como o Júlia, têm serviço assistencial com especialistas que são referência no mundo inteiro”, afirma. A dimensão e a experiência que poucas unidades no país têm tornam o conhecido HPS, a maior referência em traumas da América Latina, estratégico. “Se ele perde a capacidade de atendimento, isso será sentido de forma imediata, e não apenas nas catástrofes.”

O novo presidente da Fhemig lembra o rompimento da barragem em Brumadinho, na Grande BH, quando todos os hospitais da grade de urgência foram acionados para receber pacientes internados no HPS e liberar, assim, leitos para possíveis vítimas – na época, o CTI estava lotado. O mesmo correu com pacientes queimados em incêndio em embarcação no Acre, transferidos para a unidade de referência em BH. “Esses processos mostram a importância do João XXIII e de outros hospitais que não aparecem no primeiro atendimento, mas são retaguarda. Em Brumadinho, o hospital acabou não recebendo a quantidade de pacientes que se esperava, pois houve muitos óbitos. Mas os profissionais fizeram acompanhamento psicológico das famílias no IML (Instituto Médico-Legal) e em Brumadinho. Brumadinho marcou muito a vida desses profissionais.”

Aprimorar o núcleo de regulação, medida implantada por portaria ministerial, é outra meta, para atacar a redução do tempo de permanência do paciente, a mortalidade e aumentar a ocupação de leitos. O Júlia Kubitschek é hoje referência para a rede em termos de resultados. O tempo de permanência caiu de 14 para 10 dias. E para cumprir essa meta, vale até metodologia que vem da Toyota. A fabricante de carros japonesa prega que é preciso ter o menor estoque possível e fazer de acordo com o que o cliente quer.

Traduzindo para a linguagem de hospital: evitar o desperdício de estoque, de talento e de movimento. O aprendizado da pós-graduação em gestão de saúde está sendo posto em prática e mais de 20 pessoas são treinadas para replicar as informações dentro da Fhemig. “A ideia é que você nunca ande como se fosse um spaghetti, mas em linha reta, de forma que a experiência dentro do hospital seja a necessária, sem ficar rodando de um ponto a outro. É fazer mais, usando o que você já tem, ou até menos do que o disponível.”


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