Bodas de brilhante na terra do ouro. O Museu da Inconfidência completa 75 anos no próximo domingo, com programação especial (ver quadro) que começa na sexta-feira e tem um presente especial, nesse dia, para os milhares de visitantes do equipamento cultural vinculado ao Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) – só em julho, foram 32 mil pessoas. Em cerimônia no imponente prédio da Praça Tiradentes, em Ouro Preto, na Região Central de Minas, será inaugurada a nova instalação da tela Leitura da sentença de Tiradentes, de Leopoldino de Faria (1836-1911), pintor oficial da Academia Imperial do Rio de Janeiro. O quadro com 3,25 metros de largura e 2,45m de altura, foi cedido pelo Legislativo municipal ao museu em sistema de comodato por 60 meses (cessão não onerosa de bem cultural), com renovação em 2024, informa a diretora interina do Inconfidência, Margareth Monteiro. A festividade celebra também os 230 anos da Inconfidência Mineira.
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“A atual intervenção foi feita dentro das normas e princípios da conservação e restauração restabelecendo a unidade estética do quadro e garantindo, para as futuras gerações, a permanência de uma obra imponente e importante para todos os brasileiros”, explicou Margareth, lembrando que, antes de ir para a Câmara, o quadro pertencia à Assembleia Provincial de Minas, quando Ouro Preto era capital. Segundo museu do Ibram mais visitado no país – o primeiro é o Imperial de Petrópolis (RJ) – o Inconfidência recebe cerca de 210 mil pessoas por ano, entre brasileiros e estrangeiros. Ela chama a atenção para a moldura de pinho de Riga talhada com finalização em gesso e simbolizando o café, tendo ainda um coroamento ladeado por dois anjos em estilo barraco e a frase: Homenagem aos Mártires da Independência – 1792. “A frase faz referência à independência do Brasil”, diz a historiadora.
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Caminhos da história
A história do Brasil passa, necessariamente, pela Praça Tiradentes, no Centro da antiga Vila Rica. No edifício erguido em 1785 pelo governador da Capitania de Minas, Luís da Cunha Meneses, para ser Casa de Câmara de Cadeia, está o Museu da Inconfidência de portas e janelas coloniais abertas para contar a trajetória de Tiradentes e conjurados que lutaram pela liberdade; os caminhos do Ciclo do Ouro nas Gerais; e maravilhas do barroco, incluindo peças de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814) e partituras musicais. Com esse patrimônio, o Museu da Inconfidência completa 75 anos de conhecimento, memória e arte.
Logo em frente do Inconfidência, pode-se admirar um dos cartões-postais mais conhecidos do país: o Monumento a Tiradentes, escultura em bronze feita em 1894 por Virgílio Cestari e localizada de costas para o antigo Palácio do Governador, atual Escola de Minas. Depois desse primeiro impacto visual, é hora de subir a escadaria de pedra, visitar salas e colar os olhos nas vitrines do museu para um exercício fascinante: aguçar os sentidos e mergulhar numa longa história. A diretora interina Margareth Monteiro adianta que está em fase final, conforme determinação do Ministério Público de Minas Gerais, o plano de gerenciamento de risco, de forma a garantir segurança para funcionários, visitantes e acervo com aproximadamente 60 mil itens.
No acervo estão documentos dos tempos da Conjuração Mineira (1788/89), como o sétimo volume dos Autos da Devassa e a edição clandestina de 1778 da Constituição dos Estados Unidos – em francês, Recueil des loix Constitutives des États-Unis; peças da forca usadas no suplício de Tiradentes, no Campo da Lampadosa, no Rio de Janeiro; relógio do alferes e depois mártir do movimento, de fabricação inglesa, adquirido pelo ex-presidente Juscelino Kubitschek das mãos de particulares, em 1953; mobiliário dos séculos 18 e 19; peças sacras; biblioteca; livros de cartório, entre uma série de preciosidades. Merecem destaque os manuscritos musicais reunidos pelo pesquisador alemão Francisco Curt Lange (1903-1997), que salvou da destruição centenas de partituras da música colonial mineira.
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O museu foi criado no governo de Getúlio Vargas para receber os despojos dos conjurados mineiros mortos no exílio na África e repatriados em 1936 – a iniciativa coincidiu com a passagem dos 150 anos da sentença proferida em 1792 contra os réus da Inconfidência. Em 1942, havia apenas o Panteão com as lápides dos heróis e dois anos depois o museu ganhou forma sob a direção do historiador Raymundo Trindade. Nesse caso, a data comemorava o bicentenário de nascimento do poeta inconfidente Tomás Antônio Gonzaga.
O primeiro acervo foi doado pela Cúria Metropolitana de Mariana. Na sequência foram compradas peças do antigo Instituto Histórico e Geográfico de Ouro Preto e depois acrescentados os autos da devassa (processos) referentes aos réus eclesiásticos envolvidos na Conjuração Mineira. Outra grande aquisição foi o acervo musical de Lange.
Em 2011, a Inconfidência Mineira ganhou finalmente um rosto – na verdade o único conhecido até hoje de um integrante do movimento. É do conjurado José Resende Costa (1728-1798), que viveu na Região dos Campos das Vertentes e morreu no degredo na Guiné-Bissau, África. A identificação dele, de Domingos Vidal de Barbosa Laje, morto aos 32 anos, e João Dias da Motta, aos 59, igualmente no degredo, se arrastava havia décadas. A pedido da direção do museu, pesquisas e reconstituição facial foram feitos na Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) pela equipe do professor Eduardo Daruge. No Panteão, no primeiro andar, os três têm sua lápide ao lado das de Alvarenga Peixoto, Tomás Antônio Gonzaga, João da Costa Rodrigues, Francisco Antônio de Oliveira Lopes, Salvador Carvalho do Amaral Gurgel, Vitoriano Gonçalves Veloso, Álvares Maciel, Francisco de Paula Freire de Andrada, Domingos de Abreu Vieira, Luiz Vaz de Toledo Piza, José Aires Gomes, Antônio de Oliveira Lopes e Vicente Oliveira da Mota. O Museu da Inconfidência foi o primeiro do país instalado fora da faixa litorânea, rompendo tradição que vinha dos tempos do reinado brasileiro de dom João VI.
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Câmara vira ateliê
Em 12 de agosto de 2010, o Estado de Minas publicou uma reportagem sobre a tela Leitura da Sentença de Tiradentes, que, na época, estava sendo restaurada pelo especialista Sílvio Luiz Rocha Vianna de Oliveira (foto). A fim de evitar que o quadro fosse retirado da sede do Legislativo, foi montado um ateliê no gabinete do então presidente da Câmara e hoje prefeito, Júlio Pimenta. Para delimitar os espaços, foi pendurada uma cortina de voal branco, tecido leve e fino, e, dessa forma, moradores e visitantes tiveram a oportunidade de presenciar o restauro. “Trata-se de uma obra de grandes proporções e muito delicada, então decidimos recuperá-la aqui mesmo, e não transportá-la para um ateliê”, disse o prefeito sobre o óleo sobre tela, datado do fim do império e de autoria de Leopoldino de Faria (1836-1911), pintor oficial da Academia Imperial do Rio de Janeiro (RJ).
Inconfidência em festa
Sexta-feira
» 10h – Inauguração da nova instalação da tela Leitura da Sentença de Tiradentes, de Leopoldino de Faria (1836-1911), no interior do Museu da Inconfidência
» Lançamento do selo comemorativo
» Apresentação da Orquestra da Escola de Música Padre Simões
» Também no interior do museu, haverá a oficina de bordados antigos, Descobrindo as volutas barrocas, a cargo da Associação das Senhoras Artesãs de Ouro Preto (Asa) e Movimento Renovador de Mariana
De sexta a domingo
» 18h – Auditório, anexo 1 – Cinema com pipocas – Mostra de filmes sobre Ouro Preto e a Inconfidência Mineira
» Sexta-feira – Joaquim (2018), direção de Marcelo Gomes
» Sábado – Tiradentes (1999), direção de Oswaldo Caldeira
» Domingo – Os Inconfidentes (1972), direção de Joaquim Pedro de Andrade
Sábado
» 14h – Na frente do Museu da Inconfidência – Apresentação de corporações musicais
Cronologia
» 1785 – Em 1º de junho, o governador da Capitania de Minas, Luís da Cunha Meneses, começa a construção da Casa de Câmara e Cadeia de Vila Rica, atual Ouro Preto
» 1862 –A Casa de Câmara e Cadeia deixa definitivamente o prédio, que passa a funcionar apenas como prisão
» 1907 –Prédio sofre adaptações para se transformar em penitenciária estadual
» 1938 – Doação do edifício à União, ato formalizado pelo Decreto-Lei 144, de 212/1938. Em 20 de dezembro, é criado o Museu da Inconfidência pelo Decreto-Lei 965 do presidente Getúlio Vargas
» 1942 – Em 21 de abril, é inaugurado o Panteão, para o qual são transferidos os despojos dos inconfidentes mortos no exílio na África e repatriados em dezembro de 1936
» 1944 – Em 11 de agosto, Museu da Inconfidência abre as portas sob a direção do cônego Raymundo Trindade. Data lembra o bicentenário de nascimento do poeta inconfidente Tomás Antônio Gonzaga
» 2006 – Museu é reaberto com novos projetos museológico, feito pelo ex-diretor Rui Mourão, que ficou 43 anos no cargo, e museográfico, a cargo do francês Pierre Catel
» 2009 – Museu da Inconfidência, até então vinculado ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), passa a ser ligado ao recém-criado Instituto Brasileiro de Museus (Ibram)
» 2017 – Na gestão da arquiteta Deise Lustosa, o museu ganha bilheteria e recepção com atendimento bilíngue
» 2019 – Em maio, na gestão da diretora interina Margareth Monteiro, o quadro Leitura da Sentença de Tiradentes chega ao Museu da Inconfidência para exposição celebrativa dos 230 anos da Inconfidência Mineira, com a curadoria de Margareth e Janine Ojeda