Radares que controlam velocidade nas rodovias federais que cortam o país – e flagram um motorista desrespeitando os limites a cada 2,5 minutos em Minas – voltaram ao alvo do presidente Jair Bolsonaro (PSL), que promete acabar com esse tipo de monitoramento, em nome do combate à “indústria de multas”. Depois de questionar a instalação de aparelhos fixos nas BRs, Bolsonaro voltou à carga ontem contra equipamentos móveis, que já haviam sido objeto de crítica em junho. Porém, desta vez o chefe do Executivo federal falou em prazos para acabar com a fiscalização itinerante nas estradas – embora nem ele próprio nem outros órgãos do governo tenham esclarecido como. Segundo Bolsonaro, os brasileiros não conviverão com o controle móvel “a partir de semana que vem”. “Estou com uma briga na Justiça, junto com o ministro Tarcísio Gomes de Freitas, da Infraestrutura, para acabar com os radares móveis do Brasil”, disse o chefe do Executivo em discurso na cidade de Pelotas (RS), onde inaugurava a duplicação de trecho de 47 quilômetros da BR-116.
A medida está longe de ser consenso e vai na contramão do que é adotado pelas legislações de muitos países, além de ser criticada por especialistas. Porém, perguntado se consultou estudiosos sobre o tema, Bolsonaro disse que havia ouvido “muita gente” para tomar a decisão, mas criticou os profissionais da área que defendem os equipamentos de controle de velocidade. “Está suspenso até segunda ordem isso aí. Chega de estudiosos e especialistas que só fazem assaltar o contribuinte. Estou tentando acabar com os radares fixos também, mas estou com problema na Justiça. Quero é dar liberdade para o povo”, disse. “Isso é coisa de uma máfia de multas, é um dinheiro que vai para o bolso de poucos aqui no Brasil”, comentou, para acrescentar: “A partir da semana que vem, não teremos mais essa covardia de radares móveis”.
Segundo dados de junho da superintendência mineira da Polícia Rodoviária Federal, aos quais o Estado de Minas teve acesso, a corporação opera em Minas Gerais – estado de maior malha viária da Federação – 23 radares móveis, os mesmos que, segundo o presidente, podem acabar a partir de semana que vem. Apenas nos primeiros 120 dias do ano, os equipamentos flagraram 71.885 motoristas acima da velocidade em rodovias monitoradas por agentes federais, média de 599 por dia, ou um aproximadamente a cada 2,5 minutos. Os dados dão uma ideia da quantidade de abusos, embora não indiquem registros que efetivamente tenham se tornado multas. Isso porque os dados capturados pelos dispositivos móveis precisam cumprir uma série de requisitos técnicos para que a punição seja, de fato, efetivada.
A declaração mais recente de Bolsonaro no Rio Grande do Sul contra o monitoramento de velocidade por radares ocorre em um contexto no qual acidentes por excesso de velocidade ocupam o segundo posto no ranking dos motivos que levaram a colisões nas rodoviais federais em Minas no ano passado. Foram 1.844 ocorrências por esse motivo, ou 21% do total, causa que perde apenas para a falta de atenção, que gerou 2.722 dos 8.741 desastres automobilísticos em 2018 (veja arte).
Consultado por telefone sobre as afirmações do presidente da República, o Ministério da Infraestrutura, citado por Bolsonaro no discurso, disse que o posicionamento sobre o tema caberia à Polícia Rodoviária Federal, responsável pela operação dos radares móveis. O Estado de Minas tentou contato com a PRF por telefone e por e-mail, porém, a corporação não se manifestou sobre o assunto até o fechamento desta edição.
Outras polêmicas
Além dos radares, outras medidas do governo Bolsonaro relacionadas ao trânsito provocam polêmica. No início de junho, o presidente encaminhou à Câmara dos Deputados projeto de lei que altera vários pontos do Código de Trânsito Brasileiro (CTB). Um deles envolve o transporte de crianças de até 7 anos e meio em cadeirinhas, que devem ser carregadas no banco traseiro e com equipamento adequado ao tamanho e peso. O texto, porém, prevê o fim da multa de R$ 293,47 (infração gravíssima) pelo descumprimento da norma. A punição, segundo a proposta, seria trocada por uma advertência por escrito.
Outra alteração previsa diz respeito à Carteira Nacional de Habilitação (CNH). Hoje, cada motorista pode perder o documento se ultrapassar a marca de 20 pontos. A proposta do governo é dobrar o teto. Com isso, um motorista só perderia a carteira se somasse 40 pontos em infrações cometidas. Bolsonaro também propõe estender a validade do documento de cinco para 10 anos. "Quando um motorista profissional perde sua carteira de motorista, na verdade ele está perdendo sua carteira de trabalho", afirmou ontem o presidente. A renovação da CNH também seria mudada: hoje, apenas clínicas credenciadas pelo Departamento de Trânsito (Detran) oferecem o serviço. O governo federal quer abrir a possibilidade para qualquer clínica especializada.
Em outra vertente, recentemente, o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) anunciou novas regras para aquisição ou adição de categoria na carteira, por meio da Resolução 778. As principais mudanças são a diminuição da carga horária das aulas, a suspensão por 12 meses das aulas teóricas e práticas para obter a Autorização para Conduzir Ciclomotor (ACC) e o fim da obrigatoriedade do simulador de direção na categoria B (carros), que passa a ser facultativo.
As mudanças estabelecidas pelo Contran começam a valer, de fato, em 16 de setembro.