Um passo importante para a celebração dos 300 anos de Minas Gerais, que nasceu com a elevação destas terras centrais a Capitania de Minas em 1720, foi dado na capital. O novo presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais (IHGMG), Luiz Carlos Abritta, instituiu a comissão especial que vai cuidar da programação durante o próximo ano, estando previstos seminários, exposições, mesas-redondas, painéis e outras atividades para envolver a comunidade.
Durante a cerimônia dos 112 anos do IHGMG, na quinta-feira, com posse da nova diretoria da instituição, Abritta delegou a presidência da comissão dos 300 anos à professora e geógrafa Márcia Maria Duarte dos Santos, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A subcoordenação ficou a cargo do também integrante do instituto Adalberto Andrade Mateus, técnico do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha). “Com a separação da Capitania de São Paulo, que vigorava desde o fim da Guerra dos Emboabas (1707-1709), teve início a organização territorial, administrativa, política e sociocultural de Minas”, afirma Mateus.
Em Caeté, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a festa já começou. Em plenas comemorações dos 310 anos do fim do episódio dos Emboabas, que começou ali, a cidade se candidatou, junto ao governo de Minas, para ser a sede dos três séculos de história do estado. “Em Caeté, houve a primeira eleição para governador das Américas”, ressalta o secretário municipal de Cultura, Turismo e Patrimônio, Fúlvio Brandão, sobre a escolha, em 1707, de um emboaba para governador, o português Manuel Nunes Viana, à revelia da Coroa portuguesa.
Antiga Vila Nova da Rainha, Caeté tem planos arrojados, sendo o mais importante a construção do Museu dos Emboabas, no Centro Histórico, perto da Matriz de Nossa Senhora do Bom Sucesso, datada de 1757 e tombada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em 1938. Brandão explicou que a prefeitura já tem garantida a aprovação pela Lei Rouanet e dispõe do valor de R$ 300 mil para elaboração do projeto arquitetônico. No próximo mês, será lançado o edital para licitação e escolha da empresa que vai construir o museu, espaço para guardar objetos, documentos e memória do episódio que transformou Caeté na “terra dos emboabas”.
Em nota, o governo de Minas, via Secretaria de Estado de Cultura e Turismo, informa que vai desenvolver algumas ações para celebrar os 300 anos da Capitania de Minas. Até o momento, as iniciativas estão no âmbito do planejamento. “A Biblioteca Pública Estadual de Minas Gerais trabalha com a ideia de promover palestras sobre o tema e uma exposição. A Diretoria de Museus também pretende explorar a data com uma mostra e realizar um seminário com especialistas da área. As iniciativas vão ser desenvolvidas pelo Museu Mineiro e Arquivo Público Mineiro.”
VILA RICA Ao mesmo tempo, em Ouro Preto, ex-capital de Minas e antiga Vila Rica, as atenções estão voltadas para o tricentenário da Sedição de Vila Rica, cujo protagonista Filipe dos Santos (1680-1720) se revoltou contra a cobrança de impostos pela Coroa portuguesa e foi condenado à morte. E será uma tripla comemoração, pois, em 2020, Ouro Preto vai festejar os 40 anos do reconhecimento como patrimônio da humanidade, o primeiro concedido no país pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), informa o secretário municipal de Cultura e Patrimônio, Zaqueu Astoni Moreira.
Desde o início do ano, a prefeitura local vem se preparando para reverenciar a memória do minerador português e expoente do movimento que teve em Cachoeira do Campo um dos palcos mais importantes. O objetivo das autoridades é buscar parceria com os governos federal e estadual, envolvendo a população em projetos de educação patrimonial, a fim de homenagear a memória e jogar mais luz sobre essa página do início do século 18 que representa o “nascimento” de Minas.
Entre as ações para marcar as datas, em Ouro Preto, está a restauração do Solar dos Pedrosa, vizinho da Matriz de Nossa Senhora de Nazaré, que foi cenário de outros momentos épicos, como a Guerra dos Emboabas. A obra tem recursos de um financiamento da prefeitura no Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), no valor de R$ 1 milhão, e contrapartida do município de R$ 200 mil. Outra obra está na requalificação do trevo de entrada da cidade, que vai ganhar um triângulo, remetendo à bandeira de Minas, pelos 300 anos, e plantio de flores entremeando um bloco de pedra com a inscrição Patrimônio da Humanidade.
HISTÓRIAS A Guerra dos Emboabas levou, em 1709, à criação, pela Coroa portuguesa, da Capitania de São Paulo e Minas do Ouro, onde, após a Sedição de Vila Rica, nasceu a Capitania de Minas. Lendas e fatos históricos povoam a história de Filipe dos Santos e em seu livro Ouro Preto – um novo olhar, o professor do Instituto Federal de Minas Gerais Alex Bohrer explica os acontecimentos. “Em 1720, o governo português propôs a instalação de casas de fundição em Minas. Isso gerou descontentamento geral entre os mineradores. Logo começaram manifestações pelos arraiais da região. O ponto alto da revolta aconteceu na Praça da Matriz de Cachoeira do Campo, onde Filipe dos Santos, um dos líderes sediciosos, apregoava forte discurso contra o governo português. No adro da igreja foi preso e levado para Vila Rica, onde foi enforcado e esquartejado na presença do governador, o conde de Assumar.”
O autor explica que “ao contrário do que diz a história oficial, a tradição local conta que Filipe foi arrastado por cavalos pela Ladeira (atual Rua Padre Afonso de Lemos), onde foi esquartejado sem julgamento prévio. De qualquer forma, a praça principal de Cachoeira hoje leva o nome de Filipe dos Santos”.
E mais: “O Conde de Assumar, após esse episódio, sugeriu ao rei de Portugal a separação das Minas de São Paulo (que até então formavam uma só capitania). Era o nascimento de Minas Gerais. Assumar ainda propôs que se construíssem em Cachoeira um quartel e um palácio para os governadores de Minas, tendo em vista o ponto estratégico que o local era por excelência, aqui convergindo os principais caminhos da capitania, lugar ideal, como argumentou, para uma capital. O quartel seria construído já em 1720 e reconstruído em 1779, quando se tornaria célebre. Porém, achou-se melhor conservar Vila Rica como capital oficial, enquanto Cachoeira possuiria um palácio de campo para os governadores, onde, longe da turbulência de Vila Rica, seria mais seguro residir. As ruínas deste luxuoso palácio de campo continuam como testemunhas mudas de um dos movimentos históricos que mais despertaram interesse dos pesquisadores: a Inconfidência Mineira.”
A história dos emboabas começa bem antes. No início do século 18, os paulistas, descobridores das minas, estavam estabelecidos nos arraiais que iam de Caeté a São João del-Rei. Atraídos pelas riquezas, os emboabas, grupo formado por portugueses, baianos e pernambucanos, chegaram em massa, invadindo a área e revoltando os pioneiros. A disputa pelo ouro e pelo poder – a guerra foi, acima de tudo, uma disputa política, em torno dos principais cargos e postos da administração – levou a conflitos armados e à escolha, em 1707, de um emboaba para governador, o português Manuel Nunes Viana, à revelia da Coroa portuguesa.
Organização do território
>> Século 17 – Primeiros colonizadores chegam às minas em busca de ouro e pedras preciosas. Até o início do século 18, a região fazia parte da Capitania do Rio de Janeiro
>> 1709 – Neste ano, é criada a Capitania de São Paulo e Minas do Ouro, em decorrência da Guerra dos Emboabas
>> 1711 – Surgem as primeiras vilas do ouro: Mariana, em 8 de abril; Ouro Preto, ex-Vila Rica, em 8 de julho; e Sabará, antiga Vila Real de Nossa Senhora da Conceição de Sabará, em 17 de julho
>> 1714 – Em 6 de abril, são instituídas as comarcas de Rio das Mortes, Vila Rica e Rio das Velhas, em Minas
>> 1720 – Instituída a Comarca do Serro Frio, com sede na Vila do Príncipe, atual Serro. Dessa forma, o território mineiro, a grosso modo, fica dividido em quatro partes
>> 1720 – Região de exploração do ouro se torna Capitania de Minas
>> 1820 –Minas se torna província. Ao longo do império, as primeiras comarcas vão sendo desmembradas