Em 1988, um caminhão a serviço de uma obra desceu desgovernado a Rua Professor Aníbal de Mattos, uma das muitas ladeiras do Bairro Santo Antônio, um dos mais íngremes da Região Centro-Sul de Belo Horizonte, que por sua vez concentra algumas das topografias mais acidentadas da capital. Só parou depois de derrubar um muro e entrar em um terreno, então vago, mas onde hoje existe um prédio. Trinta e um anos depois, o aviso daquela época se transformou em tragédia na mesma via, onde atualmente é proibida a circulação de veículos de carga. Um caminhão de transporte de caçambas arrastou dois carros e esmagou um deles contra uma árvore. A motorista, a psicóloga Ivanilda José Basílio Felisberto, de 58 anos, morreu.
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Vizinho dele, Carlos Gustavo Veloso, de 39, reclama da falta de fiscalização e informa que, devido ao fluxo de caminhões, nem mesmo sabia que era proibido o tráfego de veículos pesados na rua. “Até carro pequeno tem dificuldade de subir, o asfalto já não é de boa qualidade. Aqui desce caminhão direto: carregados com gás, betoneiras, veículos de mudança... Eu não sabia dessa proibição”, afirmou.
- Foto: Arquivo pessoal
A vítima
A psicóloga Ivanilda José Basílio Felisberto, de 58 anos, morta no acidente que chocou Belo Horizonte ontem, estampava sorrisos em sua rede social. Testemunhas contaram que ela tinha acabado de prestar um atendimento domiciliar quando foi atingida em seu carro, um HRV vermelho, por um caminhão de transporte de caçambas. Ivanilda era divorciada e deixa um filho, Breno Nascimento, de 30. Ele foi ao local do acidente e acompanhou a retirada do veículo da mãe. Segundo Breno, seu irmão também morreu há alguns anos. Ele e a mãe tinham diversas fotos juntos publicadas nas redes sociais. Em 1998, a psicóloga se formou no Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, em BH. Natural do Recife, Ivanilda morava e exercia a profissão na capital mineira. Em 15 de novembro ela completaria 59 anos.
E o risco permanece, já que na via várias caçambas foram encontradas pelo Estado de Minas. Foi exatamente quando um desses reservatórios de entulho seria retirado que o acidente aconteceu, no fim da manhã de ontem. O caminhão parou na Rua Professor Aníbal Mattos, em frente ao número 183, em um dos trechos mais íngremes da via. No local havia duas caçambas. O veículo de carga parou em frente a uma delas e tentou erguê-la. Mas, com o peso, a parte da frente do cavalo mecânico se levantou e ele começou a descer, desgovernado.
Pelo caminho, atravessou para o outro lado da via, bateu em uma escada na calçada e atingiu um Palio. O motorista só escapou porque pulou do carro antes de ser atingido. Logo depois, ainda em alta velocidade, o caminhão voltou para o lado direito, e, próximo ao número 125, atingiu o HRV onde estava a psicóloga Ivanilda Felisberto. Moradores afirmam que ela havia acabado de sair de um prédio, onde atendera um paciente. O Palio e o HRV foram arrastados por aproximadamente 70 metros. O veículo de carga só parou ao bater em uma árvore em frente ao número 80. O carro de Ivanilda foi esmagado pelo caminhão. O Palio foi arremessado na descida.
Por causa dos riscos depois do acidente e para retirar a vítima das ferragens, uma grande operação foi montada na rua. Reboques de alta capacidade foram usadas em uma operação que levou aproximadamente quatro horas.
Por causa dos riscos depois do acidente e para retirar a vítima das ferragens, uma grande operação foi montada na rua. Reboques de alta capacidade foram usadas em uma operação que levou aproximadamente quatro horas.
Sem autorização
O motorista do caminhão, de 57 anos, foi detido e encaminhado ao Departamento de Trânsito (Detran/MG), onde até a noite de ontem ainda era ouvido por um delegado. Com a documentação em dia, o condutor não tinha consumido bebidas alcoólicas, segundo a Polícia Civil. Segundo o tenente Sílvio Roncone Breygil, da Polícia Militar, o caminhoneiro vai responder pelas infrações. “Será autuado nas leis de trânsito por transitar em local proibido, além de responder pela morte da condutora”, afirmou o tenente Sílvio Roncone Breygil, um dos militares presentes na ocorrência, que mobilizou também bombeiros.
Uma vida salva por frações de segundo
A tragédia que tirou a vida da psicóloga Ivanilda José Basílio Felisberto, de 58 anos, no Bairro Santo Antônio, Região Centro-Sul de Belo Horizonte, poderia ter sido ainda mais grave. O mecânico de ar-condicionado Marcos Aurélio Braga, de 44 anos, se salvou por pouco. Instantes antes de ser atingido, ele pulou do carro em que estava, um Palio, que foi arrastado por mais de 70 metros pelo caminhão de transporte de caçambas. Com o terço nas mãos ainda no local do acidente ele agradeceu por estar vivo. “Nasci de novo. Só pensei nos meus dois filhos. Eles dependem muito de mim”, afirmou, horas depois do acidente.
Depois de se salvar, Marcos se sentou na calçada e chorou. Recebeu ajuda de moradores da região. Ainda trêmulo, mesmo horas depois do acidente, o mecânico ainda se emocionava ao relembrar dos momentos de terror. “Parei o carro em frente o prédio de número 120 e estava esperando meu colega para subir e trabalhar. Foi quando vi o caminhão perdendo o freio e o barulho. Abri a porta e corri para o outro lado”, contou.
O homem afirma que ajudou o caminhoneiro a tentar salvar a psicóloga que estava no veículo esmagado. “Ajudei o motorista na hora que parou para ver se dava para socorrer a mulher. Ele estava desesperado”, disse. “Tentamos tirar ela, mas não tinha mais o que fazer”, acrescentou. “Fui amparado por moradores, que me deram água. Tenho 44 anos, mas considero que nasci de novo”, disse, segurando um terço e uma cruz que ganhou de familiares.
O colega de Marcos estava aliviado. “Atrasei alguns minutos. Passei em um posto de combustível para calibrar os pneus e abastecer, mas estava muito cheio”, disse Wander Lúcio. “Era para eu estar aqui junto com ele. Normalmente chego antes”, completou. Depois do acidente, ele foi até o local para ajudar o colega na retirada do carro.
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