O medo do sarampo extrapolou as unidades de atendimento médico e entrou nas salas de aula, diante de um quadro que ameaça fazer a saúde pública em Minas retroceder duas décadas no enfrentamento do vírus. Depois de interdições que vêm se tornando rotina no Sistema Único de Saúde (SUS), diante da entrada de casos suspeitos da doença, agora os fechamentos começam a alterar o cotidiano de crianças, pais e funcionários de escolas. Ontem, a Escola Municipal de Educação Infantil (Emei) do Bairro Mantiqueira, na Região de Venda Nova, em Belo Horizonte, teve as atividades suspensas, assim como o Hospital do Ipsemg, duas unidades de pronto-atendimento (UPAs) e quatro postos de saúde. Em 14 dias, o protocolo para bloqueio da virose – com fechamento temporário e desinfecção de locais pelos quais transitem pacientes com sintomas – foi adotado 33 vezes na capital mineira. A vacinação continua disponível, gratuitamente, para a população.
Agora, diante da cobertura vacinal insuficiente, a doença volta a se alastrar. Em Minas, neste ano já foram confirmados quatro casos e cinco pacientes tiveram exame preliminar positivo para a moléstia. Com isso, o estado pode estar prestes a confirmar o mesmo número de contaminações registrado em 1999, último ano com casos autóctones – de transmissão ocorrida dentro do próprio território. A situação pode ser ainda pior, já que ainda estão sendo investigadas 73 notificações suspeitas.
O medo de a doença se espalhar vem provocando transtornos em locais públicos, como a Emei Mantiqueira, que fechou as portas ontem, surpreendendo pais que levavam seus filhos à aula. A situação já havia acontecido no dia anterior na Emei Solimões, na Região Norte da capital. No caso de ontem, o motivo para o cancelamento das aulas foi a suspeita de sarampo em criança que chegou à unidade com febre e outros sintomas compatíveis.
O medo de a doença se espalhar vem provocando transtornos em locais públicos, como a Emei Mantiqueira, que fechou as portas ontem, surpreendendo pais que levavam seus filhos à aula. A situação já havia acontecido no dia anterior na Emei Solimões, na Região Norte da capital. No caso de ontem, o motivo para o cancelamento das aulas foi a suspeita de sarampo em criança que chegou à unidade com febre e outros sintomas compatíveis.
Ela foi levada, às pressas, para o Centro de Saúde Jardim Comerciário, que fica no mesmo bairro. Na porta da unidade de saúde, dois cartazes informavam o motivo de as portas estarem fechadas: “Hoje 3/9/19, a unidade se encontra fechada devido a suspeita de sarampo”. Funcionários usavam máscaras e luvas e não puderam dar entrevista, mas confirmaram que a criança estava sendo atendida.
O clima na vizinhança era de muita apreensão. “Todo mundo do bairro quer, e precisa, se vacinar”, disse Marcos Antônio Dias dos Santos, de 45 anos. Morador do bairro há quatro décadas, ele revelou ter ido até a unidade de saúde para se imunizar, mas disse não ter conseguido atendimento. A atendente Tatiane Patrícia Moreira de Souza, de 18, foi outra que afirmou não ter tido acesso à dose. “O posto de saúde está fechado. As pessoas vão até lá para se vacinar, mas não conseguem”, disse. Para ela, os pais de crianças da Emei deveriam ter recebido da direção orientações sobre como proceder. “É um absurdo não terem enviado uma notificação às famílias esclarecendo o que ocorreu. Os pais chegaram e a escola estava fechada por suspeita de uma criança estar com sarampo”, disse. Ninguém da unidade de educação se pronunciou .
Porta fechada
O soldador Carlos Barbosa, de 58 anos, foi até o centro de saúde para buscar medicamento para os netos, mas quando chegou as portas da unidade estavam fechadas. Sem ter certeza se tomou a vacina contra o sarampo, ele afirmou que a população fica receosa com avanço da doença. Também suspenderam o atendimento ontem as UPAs Norte e Pampulha, mesmo protocolo usado nos centros de saúde Havaí, no Bairro Estrela Dalva, e Waldomiro Lobo, no Bairro Madre Gertrudes, ambos na Região Oeste da cidade, e no Conjunto Paulo VI (Nordeste). Na madrugada, o hospital do Ipsemg, no Centro de Belo Horizonte, fechou após receber um paciente com sintomas. Tratava-se de um alarme falso e, pela manhã, os atendimentos foram retomados.
Morte
O nível de alerta contra a doença aumentou ainda mais depois que um morador de São Paulo, que vivia em Itaquera, na Região Leste da capital paulista, morreu com a doença. Foi o primeiro óbito no estado desde 1997 e o primeiro neste ano no país. A proximidade com São Paulo, que enfrenta surto, e a baixa cobertura vacinal em Minas elevam a preocupação. A estimativa é de que aproximadamente 8,9 milhões de pessoas em território mineiro não estejam protegidas com as duas doses necessárias da vacina.
A cada novo boletim epidemiológico do sarampo divulgado pela Secretaria de Estado de Saúde o temor fica mais real. Últimos dados divulgados pela pasta mostram que são quatro casos confirmados e outros cinco pacientes com exames preliminares positivos. No levantamento anterior, de 22 de agosto, eram três pessoas com diagnóstico inicial para sarampo. Esses pacientes apresentaram sintomas compatíveis com a suspeita, tiveram contato com pessoas ou são moradores de São Paulo e já tinham exames iniciais reagentes. “Após coleta e liberação de resultado da segunda coleta de amostra de soro e análise minuciosa das investigações, os mesmos serão classificados. Vale ressaltar que em ambos os casos o bloqueio vacinal foi realizado, contribuindo para a interrupção da cadeia de transmissão e não aparecimento de casos secundários”, informou a pasta.
Desde o início deste ano foram notificados 249 casos suspeitos em 92 municípios do estado. Dos quatro confirmados, o primeiro foi de um italiano que esteve na Europa entre dezembro do ano passado e janeiro. Ele mora em Betim, na Grande BH. Os outros pacientes são um gesseiro de 25 anos, sem comprovante vacinal, que veio de Trindade (PE) no fim de janeiro e mora em Contagem; um bebê de 1 ano, de Belo Horizonte, que foi vacinado em novembro do ano passado e começou a apresentar sintomas do sarampo em fevereiro; e uma adolescente de 13 anos, também de Belo Horizonte, que sofre de lúpus e viajou para Almenara e Porto Seguro (BA) em janeiro.
Histórico
Os brasileiros sofreram com o sarampo especialmente entre as décadas de 1960 e 1990. Foram ao menos nove epidemias registradas, com média de uma a cada dois anos. “A última grande epidemia aconteceu em 1986, com 129.942 casos. Já em 1997 ocorreu uma importante epidemia da doença, que se estendeu a quase todos os estados brasileiros, com mais de 53 mil casos confirmados em todo o país. A maioria dos diagnósticos ocorreu na capital de São Paulo. Já em 2018 o Brasil enfrentou a reintrodução do vírus do sarampo, com a ocorrência de surtos em diferentes estados”, ressaltou a SES/MG.
Minas Gerais também retoma o alerta depois de vários anos. O último caso autóctone registrado no estado foi em 1999, quando houve nove confirmações. Em 2011, foi registrado um caso importado da França. Dois anos depois, novamente houve diagnósticos. Os pacientes, dois irmãos, contraíram sarampo em viagem à Flórida, nos Estados Unidos.
Verba para conservação
A segurança das vacinas é essencial para garantir a imunização da população contra várias doenças. Para dar mais segurança ao armazenamento das doses e de substâncias imunobiológicas, o Ministério da Saúde vai liberar, nos próximos meses, R$ 44,2 milhões para os municípios com até 100 mil habitantes. O recurso será destinado à compra de câmaras frias, para conservar os produtos. Somente para Minas Gerais, a previsão é do repasse de aproximadamente R$ 4 milhões. Para receber a quantia as cidades devem ter implantado o sistema de informação nominal do Programa Nacional de Imunizações. Outro requisito é que a cidade ainda não esteja equipada com câmara refrigerada.