A
primavera começa nesta segunda-feira, mas quem domina a paisagem é o pior inimigo de
árvores e flores e dos animais – e que, especialmente na Grande BH, tem se tornado um assustador e cada vez mais presente vizinho: o
fogo. Os últimos dias têm sido de sufoco para moradores de áreas urbanas próximas a
matas e vegetação densa, que, diante das
labaredas, têm como último escudo o telefone para clamar por ajuda.
“O socorro é teclar 193”, observou um morador do Buritis, na Região Oeste da capital, ainda se lembrando das labaredas que, na sexta-feira, avançaram pela
mata da Copasa. “Parecia que o fogo estava sobre nós”, lembrou, aflita, uma mulher, levantando o braço e abrindo a mão sobre a cabeça.
A preocupação com o fogo próximo de moradias, empresas e prédios públicos e com a nuvem acinzentada que envolveu Belo Horizonte durante a semana é tamanha que até mesmo a Guarda Municipal decidiu se unir aos esforços de combate. A partir de amanhã, agentes em todas as viaturas devem estar atentos a possíveis focos.
“Ao constatar um princípio de incêndio, a corporação informará o Centro Integrado de Operações (COP-BH), que irá acompanhar a ocorrência, e poderá, também, acionar de imediato o Corpo de Bombeiros, a Defesa Civil ou a fiscalização municipal, mediante análise de cada caso”, informou a corporação. “O momento é de unir esforços visando à proteção de nossa população”, disse o diretor geral de Operações, Júlio César Freitas.
Um reforço para o trabalho dos bombeiros, que enfrentaram uma semana tumultuada, com focos espalhados por diversas regiões, com destaque para incêndios nos bairros Belvedere (Região Centro-Sul), Buritis e Estoril (Oeste) e Jardim Felicidade (Norte), todos próximos a moradias. Conforme a corporação, na manhã de ontem a capital estava livre de incêndios.
O combate, porém, seguia acelerado em Nova Lima, Caeté e Matozinhos, na região metropolitana, Conceição do Mato Dentro, na Região Central, em Campina Verde, no Triângulo Mineiro, e às margens das rodovias MG-030, BR-262 e BR-381.
Quando algum desses incêndios ocorre em área urbana, aos momentos de pânico com a aproximação das chamas se segue um dia de faxina, para apagar os vestígios de cinza, fuligem e fumaça. Foi o que aconteceu ontem no Bairro Buritis, depois da noite de sexta-feira de extrema apreensão para moradores, seguida de preocupação com a possibilidade de novas ocorrências.
Limpeza foi a palavra de ordem na casa do professor Walisson Ferreira, morador da Rua Sebastião Stockler, a cerca de 100 metros da mata da Copasa, que teve parte de sua vegetação consumida pelas chamas.
“Logo que o fogo aumentou, levei minha mulher e meus filhos de 4 e 9 anos para a casa da minha sogra, em outro bairro. Agora estou aqui limpando a casa, pois ficou muito suja.”
Vizinhos do perigo, os moradores lembram que os incêndios no local são recorrentes, o que traz o pânico de volta a cada estação seca. O empresário Marco Túlio Teixeira Dias pede às autoridades que protejam a mata da forma que for possível. “Temos que cuidar do que é nosso. O governo estadual precisa tomar conta direito dessa mata, pois é sempre atingida pelo fogo”, afirmou.
Na casa ao lado, pelo interfone, a funcionária encarregada da limpeza também se ocupava, pela manhã, da faxina geral. “Os patrões ficaram desesperados. Saíram de casa bem cedo neste sábado.
Os cômodos estão imundos, estou há horas fazendo o serviço”, contou.
Certa de que o telefone pode ajudar, Edna Maria Rodrigues Lana tem acompanhado, pelo grupo de WhatsApp dos moradores da sua rua, as informações sobre os incêndios. “Veja o fogo de ontem: foi horrível”, mostrou, pela gravação no celular.
“Os bombeiros estão com muitas ocorrências, a gente entende que não possam chegar rapidamente nos locais em chamas”, afirmou. Devido à forte fumaça que tomou conta do ar na região, ela contou que, ontem, foi obrigada a cancelar a caminhada matinal com vizinhos e amigos. “Não dava para respirar essa poluição”, lamentou.
Um olho no fogo, outro nas casas
Em outro extremo da cidade, na Região Norte, o medo também continuava presente na memória da comuidade. Moradores da Rua Balbina Fernandes da Cruz, no Bairro Jardim Felicidade, passaram por momentos de tensão e medo quando, no fim da tarde de quinta-feira, uma área verde nos fundos da Escola Municipal Rui da Costa Val pegou fogo. Foram atingidas árvores e vegetação rasteira de uma área íngreme. Na parte superior do barranco ficam dezenas de casas, de onde ontem as pessoas ainda observavam as cinzas no terreno devastado.
Os bombeiros foram chamados e o foco de incêndio esteve temporariamente controlado. No entanto, por volta das 19h as labaredas voltaram, ainda mais fortes.
Por muito pouco não ocorreu uma tragédia com a família de Ângela Maria Vieira, de 42. “Fiquei observando e com medo de o fogo chegar aqui. Os bombeiros vieram. Mas, à noite, quando meus filhos estavam dormindo, tivemos que sair às pressas”, conta.
A casa fica em terreno mais alto em relação à mata, mas as chamas chegaram ao corredor entre a moradia e a área pública. “A casa da minha irmã quase pegou fogo, pois caíram faíscas na roupa de cama. Ela perdeu uma bolsa com documentos. Por muito pouco, pouco mesmo, a casa não se incendiou”, conta Ângela. O filho dela, Elias Alves, de 22, e o amigo, o músico e instalador de piscina Alexandre Xavier, de 26, se uniram para ajudar a controlar as labaredas. “Fiquei até 22h combatendo o incêndio”, disse.
Para Alexandre, o incêndio é resulta de descaso: “A mata fica no quintal da escola. É um descaso com os mais humildes”.
A dona de casa Maria Aparecida Mendes, de 45, tem a mesma opinião. Para ela, o poder público deveria manter limpa e capinada a área nos fundos dos equipamentos públicos – a Escola Municipal Rui da Costa Val, a Emei Curumim e o Centro de Referência de Assistência Social.
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