O cenário de destruição onde bombeiros desciam de helicópteros e se arrastavam com cães farejadores pela lama, com construções industriais da Mina Córrego do Feijão soterradas, florestas destocadas por uma avalanche, córregos e ribeirões engolidos por rejeitos se transformou num canteiro de obras. No 10º mês do rompimento da Barragem B1 da Mina Córrego do Feijão, operada pela Vale, em Brumadinho, na Grande BH, a paisagem arrasada ganhou outra aparência.
Uma cena, porém, não mudou nesse período: a dor dos familiares dos 256 mortos identificados e 14 desaparecidos. Nesta segunda (25), para marcar a data e honrar as vítimas, parentes e amigos fizeram um culto ecumênico na entrada da cidade, cobrando uma reparação mais justa e punição para os responsáveis pelos crimes ambiental e social.
Uma cena, porém, não mudou nesse período: a dor dos familiares dos 256 mortos identificados e 14 desaparecidos. Nesta segunda (25), para marcar a data e honrar as vítimas, parentes e amigos fizeram um culto ecumênico na entrada da cidade, cobrando uma reparação mais justa e punição para os responsáveis pelos crimes ambiental e social.
Totalmente encoberta pela lama dos 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos que se desprenderam da barragem, a estrada para o Bairro Córrego do Feijão, em Brumadinho, está sendo asfaltada. As obras ainda bloqueiam o trajeto em dois trechos, no sistema de pare e siga. Parte do terreno onde ficava a Pousada Nova Estância serve agora como área de manobras das máquinas que prestam serviço para a Vale. Os remansos ali próximos, do Ribeirão Ferro Carvão, ainda na área de buscas onde cerca de 150 bombeiros por dia procuram os 14 desaparecidos com pelo menos sete escavadeiras, a do vale do manancial foi completamente bloqueada por um muro de concreto.
A área de buscas mais extensa, entre o complexo minerário onde ocorreu o rompimento, quase em Casa Branca, e a comunidade do Córrego do Feijão, mudou muito nesses 10 meses. De um completo lamaçal, se tornou uma área repleta de sulcos abertos pelas máquinas na procura por vítimas. Iluminações remotas de campo se espalham por locais específicos para auxiliar nos trabalhos sob pouca luz ou mesmo os noturnos. O córrego do Feijão, que flui da vila e sumia na lama após seu encontro com o Córrego Ferro Carvão, agora voltou a ter um leito mais definido. Trilhas nas matas e pastos que serviam de acesso precário aos bombeiros e resgatistas, agora se tornaram estradas repletas de caminhões e escavadeiras revolvendo o rejeito e abrindo patamares para a operação das equipes.
A igrejinha de Nossa Senhora das Dores, que serviu de necrotério e de base operacional avançada das equipes de resgate da Operação Brumadinho, foi restaurada e pintada de amarelo creme, azul e vermelho. No Centro de Brumadinho, a ponte sobre o Rio Paraopeba para Mário Campos ainda tem as fitas brancas amarradas a suas grades com o nome dos 270 mortos e desaparecidos. As letras estão desbotadas, algumas tiras se partiram outras se desprenderam, mas o balanço das fitas de tecido ao vento chama a atenção de quem passa todos os dias para as vítimas do desastre.
Ações na Justiça e indenizações
Parte das mudanças na rotina da cidade tem uma explicação: o dinheiro injetado em Brumadinho por ocasião dos acordos e indenizações firmados entre a Justiça, a Vale e familiares de vítimas e moradores. Dez meses depois da tragédia, as cifras chegam a bilhões, distribuídos como forma de reparação a quem perdeu os entes queridos em ações de cunho civil ou trabalhista. Na Justiça, houve duas decisões que somaram R$ 20 milhões favoráveis a parentes de hóspedes da Pousada Nova Estância, arrasada pela lama.
Um dos primeiros pagamentos, os emergenciais, no valor de um salário mínimo por adulto, a metade dessa quantia por adolescente e um quarto para cada criança, chegaram a 108 mil pessoas, de acordo com a Vale. Ele é destinado a moradores de Brumadinho e residentes de até 1 quilômetro na calha do Rio Paraopeba. Inicialmente previsto para ser pago durante um ano, está sendo analisada na 6ª Vara da Fazenda Pública proposta de prorrogação.
O acordo trabalhista firmado entre o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a empresa estabeleceu as obrigações que a empresa deverá assumir para reparar os danos morais e materiais decorrentes do rompimento da barragem B1 da Mina de Córrego do Feijão e garantiu também milhões às famílias. O MPT não informou quantas pessoas já foram beneficiadas. Cônjuge ou companheiro, filho, mãe e pai vão receber individualmente R$ 700 mil, sendo R$ 500 mil para reparar o dano moral e R$ 200 mil a título de seguro adicional por acidente de trabalho. Irmãos de trabalhadores falecidos receberão individualmente R$ 150 mil por dano moral.
Já pelo dano material – restaurar a renda mensal das famílias de trabalhadores mortos –, o dependente da vítima receberá pensão mensal vitalícia até a idade de 75 anos. A idade levou em conta a expectativa de vida de um brasileiro, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O acordo fixa indenização mínima de R$ 800 mil, ainda que a renda mensal acumulada do trabalhador falecido não alcance tal projeção. Para o pagamento antecipado da indenização, em única parcela, será aplicado deságio de 6% ao ano, conforme previsão legal. O dano moral coletivo foi de R$ 400 milhões.
Os empregados sobreviventes, sejam funcionários próprios ou terceirizados, lotados na Mina de Córrego do Feijão, têm estabilidade no emprego assegurada por três anos. Também receberão auxílio-creche de R$ 920 por mês, para filhos com até 3 anos de idade, e auxílio-educação, de R$ 998 mensais, para filhos com até 25 anos de idade. Além desses pagamentos, a Vale ficou obrigada a pagar as verbas rescisórias ao dependente financeiro do empregado morto na tragédia e o salário dos trabalhadores ainda desaparecidos, até a data do reconhecimento do óbito.