Dois acidentes envolvendo ônibus do transporte público urbano em Belo Horizonte, em menos de 48 horas, reacendem a discussão sobre como a ausência de agentes de bordo pode aumentar o risco de acidentes. Na manhã de domingo, Guilherme Marlon Lisboa Muniza, de 1 ano e 11 meses, morreu atropelado depois de cair do colo da mãe, que ficou com a perna presa em uma das portas do coletivo 608 (Estação Venda Nova/Pampulha). Já na manhã de ontem, apurações preliminares de outro acidente, no Bairro Novo São Lucas, Região Leste de Belo Horizonte, indicam que o ônibus da linha 9501 (São Lucas/Jaraguá) não contava com agente de bordo quando atingiu o portão de um prédio na Rua Nísio Batista de Oliveira. Não houve vítimas, porém, com o impacto, parte da estrutura atingiu o banco do motorista, que saiu consciente, mas se queixando de dor em uma das pernas.
Em outubro, depois do ultimato do prefeito Alexandre Kalil às empresas de transporte público, a BHTrans informou que intensificaria o processo de fiscalização para garantir o cumprimento do acordo para contratação de 500 agentes de bordo. No entanto, nada mudou. Os usuários seguem relatando a ausência de cobradores. O sistema de transporte da capital conta com 2,9 mil ônibus coletivos, o que exige cerca de 5 mil cobradores. De acordo com a legislação vigente, as empresas podem operar com presença facultativa de cobradores em algumas situações: nas linhas BRT/Move, em horários noturnos, aos domingos e feriados e nas linhas executivas.
Padrinho do pequeno Guilherme, Marcelo Matos defende a responsabilização criminal do motorista, da empresa de ônibus e da PBH. “Minha sobrinha está arrasada. O prefeito Kalil tem que olhar para isso. Cadê a fiscalização que não está fiscalizando? A família deles não pega ônibus. É um descaso da prefeitura. Vamos entrar na Justiça como forma de pressão para que se fiscalize e também para que voltem cobradores em todas as linhas e em todos os horários. Essas ações não vão trazer nosso menino de volta, mas impedirão que outras famílias sofram o que estamos sofrendo”, desabafa.
Assassinato
Ele acredita que as multas são insuficientes para punir as empresas e fazer com que elas cumpram a legislação: “Queremos julgamento e condenação penal. Não foi acidente, foi um assassinato. Se a prefeitura abriu brecha na lei para que as empresas tirem os cobradores, ela tem que assumir a responsabilidade”.
Marcelo pontua ainda que a falta de cobrador dificulta o acesso de deficientes aos ônibus – há 10 anos, ele se locomove com o auxílio de cadeira de rodas. “Os cobradores fazem falta. Com eles, era mais rápido. O cobrador descia e fazia processo. Agora, o motorista tem que estacionar o ônibus, cobrar a passagem dos passageiros e descer para acionar o elevador. Muitos motoristas são impacientes” conta.
O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH) informou que, no momento do acidente, o motorista conduzia o ônibus sozinho para recolhimento à garagem. A entidade ressalta que o veículo está com todas as manutenções em dia.
Com a palavra, a BHTrans e o Setra-BH
Segundo a BHTrans, de janeiro a outubro foram emitidas 13.334 multas no valor de R$ 688,51 cada, totalizando quase R$ 9,2 milhões em punições pela falta dos agentes de bordo. A orientação do órgão é de que o motorista finalize a cobrança da passagem e só depois dê prosseguimento à viagem. A BHTrans informa que são realizadas, diariamente, ações de fiscalização nas linhas do transporte coletivo municipal de BH. “A fiscalização de agentes de bordo (cobrador) é realizada nos pontos finais e nas estações, quando os agentes verificam a partida ou a chegada da viagem”.
Também é feita a fiscalização durante o itinerário da linha com agentes da BHTrans não caracterizados. “Esse procedimento é utilizado para verificar questões como superlotação, comportamento inadequado do motorista e ausência de agente de bordo”, completa. A população pode denunciar por meio do telefone 156 e no Fale Conosco no portal da PBH.
Contratações
O Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH) informou que, no momento do acidente, o motorista conduzia o ônibus sozinho para recolhimento à garagem. A entidade ressalta que o veículo está com todas as manutenções em dia.
O Setra-BH diz ainda ter realizado as 500 contratações de agentes de bordo seguindo determinação da Prefeitura de Belo Horizonte e que a lista de contratados foi entregue e validada pela BHTrans em 30 de setembro. Acrescenta que a destinação dos novos agentes de bordo levou em consideração horários e rotas onde é maior o número de passageiros que pagam a passagem em dinheiro.