Ruas interditadas, problemas na rede elétrica, moradores presos em casa por risco de eletrocussão e ameaças a imóveis e pedestres. Com os temporais mais recentes que castigaram Belo Horizonte, com rajadas de vento de até 70km/h, os belo-horizontinos conviveram com uma série de riscos causados pela queda de árvores. No dia 23, o mais crítico de novembro, a Cemig contabilizou 83 ocorrências envolvendo conflito entre a arborização e o sistema de eletricidade, afetando 65 mil pessoas. Diante do tamanho do desafio, o orçamento da Prefeitura de BH com ações de poda e supressão subiu 36% neste ano em relação a 2018, saltando de R$ 11 milhões para R$ 15 milhões. Embora os recursos disponíveis tenham aumentado, intervenções não seguiram no mesmo ritmo e moradores relatam esperar mais de um ano por providência em relação a árvores condenadas que ameaçam cair. Além disso, o ritmo de replantio nem de longe acompanha o de supressões.
Com a substituição dos espécimes suprimidos deixando a desejar, a capital, que já foi conhecida como “Cidade Jardim”, já contabiliza um déficit de 5 mil árvores, de janeiro a outubro deste ano, conforme dados da Superintendência de Desenvolvimento da Capital (Sudecap) e da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA). Se considerado o período desde 2017, são cerca de 8,6 mil árvores a menos em BH.
Segundo a Sudecap, de janeiro a outubro deste ano houve poda de 33,4 mil árvores e remoção de outras 9 mil. No orçamento do órgão público, R$ 15 milhões estão destinados para esses gastos até o fim do ano, incluindo também operações de retirada de tocos e raízes após os cortes e manutenção de canteiros e jardins em praças. O recurso é usado mediante a prestação do serviço, feita por empresa terceirizada. Mas o orçamento é 36% maior em relação ao ano passado, quando foram gastos R$ 11 milhões, para realizar 47,8 mil podas e 10,1 mil supressões.
Sem informar quanto da verba foi gasto até agora, a administração municipal reconhece o risco. Em nota, a Sudecap informa que “o aumento do investimento no manejo de árvores (podas e supressões) justifica-se pelo fato de a arborização do município ser constituída por espécimes condenadas de idades avançadas e, em muitos casos, plantadas em locais indevidos, podendo representar riscos para os cidadãos e acarretar prejuízos materiais em caso de queda”.
Apesar do aumento do orçamento, o ritmo das intervenções diminuiu. Enquanto no ano passado houve, em média, 4.832 ações por mês, entre podas e supressões, neste ano essa taxa passou para 3.451 na média mensal, considerando os trabalhos de janeiro a outubro. Mas nem por isso a população deixou de estar livre do perigo.
PERIGO Na Rua Maranhão, quase esquina com Avenida Francisco Sales, no Bairro Santa Efigênia, Região Centro-Sul, uma árvore da espécie munguba, de cerca de 8 metros, tira o sono de que vive e transita por perto ao avançar sobre o telhado da casa, como se “abraçasse” o imóvel, que abriga uma cafeteria, o setor de urgência de uma clínica oftalmológica e uma residência. “Desde o início do ano passado estamos ligando e nada”, reclama o coordenador de manutenção da clínica, Djalma Tobias Pereira. O endereço fica a dois quarteirões do ponto onde uma árvore de grande porte veio abaixo, durante chuva na última segunda-feira, quase em frente à Santa Casa, causando estragos e interditando o trânsito.
Quem mora na casa é a família da jornalista Viviane Moreno, de 41 anos, que perdeu as contas de quantas vezes ligou pedindo que a prefeitura podasse a árvore. “O meu medo é de ela cair nos fios e pegar fogo. Como vamos fazer para sair? A entrada é única”, afirma. Quando chove, ela leva as filhas, uma de 4 e outra de 11 anos, para o fundo da casa, com receio de o telhado vir abaixo com a queda da mungubeira.
Em uma das vezes, a moradora foi informada de que a equipe técnica já havia emitido laudo para a supressão do espécime, mas que aguardava posição da Cemig, já que a árvore estava em contato com a rede elétrica. A Sudecap confirmou que o laudo técnico recomenda a supressão da árvore, porque suas raízes foram seccionadas. “A execução do serviço está programada para a primeira quinzena de dezembro”, informa a nota.
Na mesma rua, mas na esquina com Gonçalves Dias, no Bairro Funcionários, um galho de uma árvore caiu sobre a faixa de pedestres e ocupou mais da metade da via. A poda e retirada do material vegetal ocorreu mais de 24 horas depois. Outra árvore se partiu ao meio no Bairro Sion, também na Regional Centro-Sul, e ficou dependurada sobre a rede elétrica. O Corpo de Bombeiros alertou para o risco de eletrocussão.
PODA ou MUTILAÇÃO O professor João Renato Stehmann, do Departamento de Botânica do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), alerta para a falta de critério no corte das árvores. “A poda em 'V' desestabiliza a árvore. Você não precisa cortar tanto a ponto de mutilá-la. As árvores ficam mais suscetíveis a doenças, pois esse corte expõe a planta”, afirma.
O biólogo alerta que a supressão deve ocorrer apenas em último caso. “Também temos visto a poda completa de várias árvores, em que se deixa somente o tronco. O serviço é terceirizado, mas não há uma fiscalização. É necessário seguir um protocolo, porém minimizando os danos à árvore”, diz. “A percepção é de uma cidade mais seca. Qual Belo Horizonte a gente quer? Sem árvores e com áreas abertas ou que tenha uma arborização sadia? É uma escolha”, completa.
Segundo a Sudecap, as solicitações de podas e supressões de árvores são criteriosamente avaliadas pelas Gerências Regionais de Manutenção para que o atendimento possa ser realizado de forma adequada, mantendo os padrões de qualidade. A Deliberação Normativa 92, de 2018, determina os critérios para cada serviço, feito por empresa terceirizada.
“Têm prioridade as podas e supressões de árvores condenadas ou que possam representar riscos de causar danos humanos ou materiais e que já possuam laudos indicando a supressão, com iminente risco de queda.
Nos casos de interferência com as redes de eletricidade, a Cemig precisa ser acionada e o trabalho tem que ser feito em conjunto”, diz a nota.
BH menos verde Enquanto foram suprimidas de janeiro a outubro deste ano 9 mil árvores em Belo Horizonte, a prefeitura plantou, no mesmo período, 4 mil mudas, de acordo com a Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMMA). São 5 mil unidades a menos em toda a cidade. Nos últimos três anos, foram suprimidos 22.226 espécimes, conforme dados da Sudecap, contra 13.580 plantados, um déficit de 8.648 árvores na cidade.
A Secretaria Municipal de Meio Ambiente informa, por nota, que a capital mineira é um dos municípios líderes na adoção de políticas e ações para o enfrentamento do aquecimento global. A pasta acrescenta que têm sido plantadas mudas de várias espécies, incluindo nativas de mata atlântica e cerrado.
As mudas são destinadas a projetos de revegetação e recuperação de áreas degradadas, projetos de agroflorestas urbanas e de arborização do entorno de 20 escolas municipais. “Termos de compromisso, no âmbito de compensações ambientais, garantem o plantio imediato de mais de 1,3 mil mudas em áreas urbanas”, informou a secretaria.
Como pedir
Para solicitar supressão de árvores ou poda dos galhos, o interessado tem à disposição três canais oficiais de atendimento
1) Pela internet, acessando o Sacweb (portal6.pbh.gov.br), selecionando no campo “grupo de serviços” o tema Meio Ambiente. Na sequência, selecionar o serviço desejado e preencher o formulário
2) Pelo telefone 156
3) Pelo aplicativo PBH APP
4) E ainda presencialmente no BH Resolve, que fica na Avenida Santos Dumont, 636, ou pela entrada da Rua Caetés, 342, no Centro da capital
Como funciona
» Feito o pedido, técnicos da Secretaria Municipal de Obras e Infraestrutura (Smobi/PBH) irão ao local para fazer a avaliação
» Deferida a intervenção, ela é executada sob responsabilidade da Sudecap, por empresa terceirizada
» Caso a árvore esteja interferindo com a rede elétrica, é necessária avaliação da Cemig e o trabalho deve ser conjunto
Quanto custa
Ano Orçamento* Podas / Supressões
2019 R$ 15 milhões 33.437 / 9.063 42.500** 3.541
2018 R$ 11 milhões 47.870 / 10.122 57.992 4.832
2017 R$ 4 milhões 16.445 / 3.041 19.486 1.623
2016 R$ 2,8 milhões 14.133 / 1.415 15.548 1.295
*O valor previsto em orçamento só é desembolsado quando o serviço é efetivamente prestado. A PBH não informou quanto já foi gasto este ano do total orçado
** Número de intervenções em 2019 é parcial, de janeiro a outubro