O corte dos ficus da Avenida Bernardo Monteiro, no Bairro Santa Efigênia, na Região Centro-sul, abalou os sentimentos do ilustrador e escritor Nelson Cruz, acostumado desde a infância à arborização de Belo Horizonte, ao ver parte importante do patrimônio ambiental ser suprimida. A sociedade civil se mobilizou, mas não teve jeito. As árvores centenárias foram cortadas e Nelson resolveu eternizá-las nas páginas de livro. A obra escrita e ilustrada por ele, Benjamina (Miguilim) será lançada hoje na Livraria da Rua, na Savassi, Região Centro-Sul da capital. “Sou cidadão de BH e sempre admirei o conjunto de árvores ali. Quando houve o problema das árvores e os cortes, surtei artisticamente e como cidadão também”, revela.
Na apresentação do livro, a escritora Fabíola Farias destaca que os troncos retorcidos dos Ficus benjamina são reinventados nas pinturas de Nelson. As imagens são o ponto de partida do artista, que as representa em papelão. “Quando observei as formas escultóricas em que as árvores se transformam mortas, fiz imediatamente transposição, mostrando a plasticidade”, diz.
Escolheu para ser suporte das pinturas as caixas de papelão, material que costuma ser relegado ao lixo. “Minha ideia foi utilizar material que iria para o lixo, mas que é valorizado pelo trabalho da Asmare”, afirma. Ele se refere ao trabalho de reciclagem realizado pelos catadores de papel da Associação dos Catadores de Papel, Papelão e Materiais Reaproveitáveis (Asmare). O artista usou tinta acrílica e caneta nanquim para pintar as árvores sobre elementos gráficos impressos.
Nelson propõe uma reflexão: as árvores são patrimônios importantes para as cidades tais como os imóveis tombados, mas não têm o mesmo status nem o mesmo empenho para preservá-las. “Os ficus eram do período da fundação da cidade. As árvores deveriam ter tido acompanhamento de órgãos públicos para que nada acontecesse com elas. Protegemos os casarões e as árvores precisam também de cuidado”, diz. A poda também revela que a cidade-jardim, que completou 122 anos no dia 12, já não é tão verde como quando foi fundada. “A natureza da minha infância foi reduzida.”
Ao mostrar as ilustrações, Nelson apresenta um grito contra a especulação imobiliária. Barrar o avanço do concreto é uma forma de preservar a natureza, uma questão de sobrevivência para toda a sociedade. “Não são somente os casarões. Se conseguimos preservar Ouro Preto e Mariana, por que não fazemos o mesmo com nossas árvores? Por que o meio ambiente sempre perde espaço? Belo Horizonte é uma cidade cada vez mais quente e não temos mais saída”, completa.
Além da beleza, as árvores contribuem para equilibrar a temperatura nas cidades. “Era simplesmente passar debaixo delas e sentir outro clima. Cada estação reservava uma ambientação embaixo daquelas árvores: janeiro era um clima; em junho, outro, primavera, outro diferente”, diz. Para o autor, a convivência com meio ambiente equilibrado pode ser simples. “Enquanto existir floresta e preservação estaremos preservados”, diz.
Benjamina
• Nelson Cruz
• Editora Miguilim
• Lançamento: hoje, das 12h às 14h, na Livraria da Rua, que fica na Rua Tomé de Souza, 913, Savassi