Nazaré e Belém – Neste dia de Natal, os caminhos da fé, guiados pelos olhos do coração, conduzem a duas cidades bíblicas da Terra Santa que, a cada passo, evocam histórias milenares, despertam emoção e valorizam culturas: a primeira, Nazaré, onde o “anjo do Senhor anunciou a Maria e ela concebeu do Espírito Santo”, e a segunda, Belém, berço do Menino Jesus, nascido numa manjedoura e, para os cristãos, filho de Deus e Salvador do mundo. Quem entra nos santuários da Anunciação e da Natividade, na Terra Santa, onde idiomas diferentes se cruzam no ar, tem a certeza de que, muito mais do que turística, trata-se de uma viagem espiritual. Diante da estrela de prata, marco de onde Jesus veio ao mundo, a força da devoção se une ao mistério da vida e resulta em comunhão divina.
“A Terra é Santa e de todos”, resume o arcebispo metropolitano de Belo Horizonte e presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), dom Walmor Oliveira de Azevedo. Embora haja questões políticas, conflitos e muitas discussões, dom Walmor ressalta que “a Terra Santa faz parte do reino de Deus e todos nós fazemos parte dele”. O número de brasileiros tem crescido, de acordo com o Ministério do Turismo de Israel: entre janeiro e novembro deste ano, houve aumento de 32% no comparativo com 2018, e de 50% em relação a 2017. O número (77 mil brasileiros, até novembro) é o maior dos quatro últimos anos. Os brasileiros representam mais de 43% de todos os visitantes latino-americanos.
Distante 102 quilômetros da capital Telavive, Nazaré, no Norte do país, será a primeira a ser visitada nesta reportagem, pois foi ali, conforme a tradição cristã – e onde hoje se encontra a basílica, que tem como reitor e guardião o frei franciscano Bruno Varriano, brasileiro –, que Nossa Senhora recebeu a visita do Anjo Gabriel para anunciar que Deus a escolhera para ser mãe de Jesus.
A narrativa da anunciação está no evangelho de Lucas, capítulo 26, destacam os estudiosos de teologia. Vale lembrar que os franciscanos estão presentes na Terra Santa há mais de 800 anos e administram 95% dos santuários católicos, desenvolvendo obras sociais em áreas de conflito e guerra civil. A atuação desses religiosos se estende à Síria, ao Líbano, à Jordânia e a algumas ilhas gregas. No interior da Basílica da Anunciação, há uma gruta de pedras brancas, e logo na frente está escrito em latim, com letras pretas no fundo de mármore branco: Verbum caro hic Factum est – em português, o Verbo se fez carne.
Famílias
Silêncio absoluto no ambiente sagrado, e nem se torna preciso lembrar que, em todos os templos da Terra Santa, homens não podem entrar de bermuda e mulheres devem cobrir joelhos e ombros. Para uma família católica, conhecer a Terra Santa é realizar o sonho de ver os caminhos percorridos por Jesus e os cenários citados na Bíblia. Em junho, ele se tornou real para parte da família Viana, de Itabira, na Região Central do estado. Casados há 57 anos, João Viana Filho, de 84, e Geralda Maria da Silva Viana, de 76, fizeram a primeira peregrinação pela Terra Santa acompanhados de três dos seus sete filhos, um genro e duas netas.
A ideia surgiu da filha Marineia Viana Furst Guerra, de 51, residente nos Estados Unidos: “Em 2018, eu e uma das minhas irmãs, que também mora em Boston, decidimos fazer a peregrinação por Israel e Jordânia, pois ela tinha passado pelo tratamento de um câncer e vencido. Foi uma viagem maravilhosa e, desde então, comecei a pensar que todos da minha família deveriam viver aquela experiência, principalmente meus pais, que sempre foram muito católicos, são ministros da Eucaristia na paróquia deles e têm muita fé”.
O desejo de Marineia começou a se concretizar quando a irmã mais velha dela, Maria Aparecida Viana Morais, de 57, aceitou embarcar nessa viagem. O encontro entre a parte da família que mora no Brasil e aqueles que vivem nos Estados Unidos ocorreu em Roma, Itália, de onde todos partiram para Israel. A visita, claro, incluiu Nazaré e Belém. “Nesta época de Natal, é muito gratificante lembrar que estivemos lá no local em que Jesus nasceu e foi colocado na manjedoura. Mesmo com meus 84 anos, enfrentei uma longa fila e ainda fiz questão de me ajoelhar na estrela de prata, que marca o local exato do nascimento”, relembra o patriarca da família.
Dona Geralda, que preparou a casa para o Natal, não se esquece um minuto das emoções da viagem: “Sou muito agradecida por ter vivido esses momentos de fé com parte da minha família”. O presépio, que para ela é a principal representação da data, é feito todos os anos respeitando uma tradição “dos mais antigos”, como ela mesma define: a imagem do Menino Jesus só é colocada na manjedoura passada a meia-noite do dia 24.
No primeiro andar do templo, erguido em 1969, fica a Gruta da Anunciação, onde, segundo a tradição, o arcanjo São Gabriel apareceu a Maria. A construção atual é um edifício de dois andares sobre o local onde, anteriormente, estava uma igreja da era das cruzadas, erguida sobre as ruínas de uma antiga construção bizantina. Edificada num ponto de importância histórica, e considerada sagrada, a igreja recebe muitos peregrinos de inúmeras igrejas cristãs, católicos, anglicanos, ortodoxos e outros.
A Igreja da Anunciação foi fundada mais ou menos na mesma época em que a Igreja da Natividade (no local do nascimento de Jesus) e da Igreja do Santo Sepulcro (onde Ele foi sepultado). Não muito longe fica a Igreja de São José ou da Nutrição. O nome, conforme o folheto da Custódia da Terra Santa, se deve ao fato de que foi ali que Jesus cresceu e aprendeu o ofício do pai. Um belo quadro, no lado esquerdo da entrada, mostra a cena de Jesus, Maria e o jovem aprendiz.
Pastores
O destino agora é Belém, na Judeia, na Cisjordânia, em território sob responsabilidade da Autoridade Palestina, e, certamente, para muita gente, o ponto alto da viagem à Terra Santa. Belém, nesse tempo de Natal, deixa uma imagem inesquecível, ainda mais para quem é mineiro, pois há cenas que parecem de presépio: numa delas surge o pastor adolescente descendo uma encosta no deserto da Judeia, à beira da estrada, com seu rebanho de ovelhas. A paisagem vai preparando o espírito do viajante para a chegada à Basílica da Natividade.
À frente de um grupo de 20 pessoas de Barbacena, na Região Central do estado, o dono da agência Millenium, Nei Armstrong do Nascimento, comunga da ideia de que a viagem é realmente espiritual. “Já viajei por muitos países, mas nada se compara aos lugares onde Jesus viveu. Impossível não se emocionar, fortalecer a fé e rezar”. Um fato que impressionou Nei foi ver, nessa e noutras igrejas do país, gente de todas as religiões e várias nações compartilhando o mesmo espaço.
Também de Barbacena, Maria Ângela Sachett foi conhecer a Terra Santa com o marido, Jacinto Antônio Sachett, gaúcho de Caxias do Sul e morador da cidade mineira há 25 anos. Antes de viajar, o casal, como sempre faz até pegar o avião, lê e pesquisa sobre os lugares, o comportamento das pessoas, os costumes. “Confesso que nunca havia passado por experiência tão grande e maravilhosa. Creio que até quem não tem religião se rende a tantas evidências da existência de um ser maior”, disse Jacinto Antônio ao lado da mulher e da amiga de viagem Flávia Nascimento.
O único conselho que se pode dar a quem visita a Basílica da Natividade é: “Abra seu coração”, independentemente de crer, ser ateu ou indiferente a religiões. Logo na chegada à basílica, fica a Porta da Humildade, que, muito pequena, leva homens e mulheres a abaixar a cabeça. Depois, no interior do templo, são os momentos intensos de contemplar as quatro fileiras de 12 pilares de pedra marrom, os fragmentos do piso, os mosaicos da parede e os painéis de madeira. Enfim, chega o momento esperado: descendo por uma escada, o visitante espera sua vez de estar diante do local do nascimento de Jesus. O coração bate mais acelerado, os olhos se abrem e, como todo mundo, o celular fica a postos. Depois, é continuar em silêncio e guardar, na memória, este dia tão especial.
O único conselho que se pode dar a quem visita a Basílica da Natividade é: “Abra seu coração”, independentemente de crer, ser ateu ou indiferente a religiões. Logo na chegada à basílica, fica a Porta da Humildade, que, muito pequena, leva homens e mulheres a abaixar a cabeça. Depois, no interior do templo, são os momentos intensos de contemplar as quatro fileiras de 12 pilares de pedra marrom, os fragmentos do piso, os mosaicos da parede e os painéis de madeira. Enfim, chega o momento esperado: descendo por uma escada, o visitante espera sua vez de estar diante do local do nascimento de Jesus. O coração bate mais acelerado, os olhos se abrem e, como todo mundo, o celular fica a postos. Depois, é continuar em silêncio e guardar, na memória, este dia tão especial.
José e Maria foram de Nazaré a Belém para o recenseamento ordenado pelas autoridades romanas, pois José era da linhagem de Davi, e Belém era a “cidade de Davi”. A primeira igreja foi construída sobre a gruta na primeira metade do século 4, sob iniciativa do imperador romano Constantino e sua mãe, a imperatriz Helena. O templo, no entanto, foi parcialmente destruído na revolta samaritana do século 6. A atual igreja foi construída por Justiniano, em 530.