Largada para a coleta da Belorizontina comprada na capital mineira. A Secretaria Municipal de Saúde começa a recolher hoje as cervejas do rótulo que estão nas casas dos moradores de Belo Horizonte, o que será feito por meio da Vigilância Sanitária. O consumidor poderá se deslocar a qualquer um dos nove pontos listados pelas autoridades e entregar garrafas de quaisquer lotes da Belorizontina, produzida pela Backer.
Os pontos ficarão abertos das 8h às 17h, de segunda a sexta-feira, e os produtos recolhidos permanecerão sob custódia da prefeitura para eventuais exames. Testes em amostras de bebida e do sangue de pacientes indicaram presença da substância química dietilenoglicol, relacionada ao quadro clínico de pacientes internados com insuficiência renal e complicações neurológicas que levou à criação de uma força-tarefa investigativa formada por autoridades da saúde, vigilância sanitária, Polícia Civil e até do governo federal.
A ordem é entregar a cerveja somente nos postos listados. Na quinta-feira, a cervejaria artesanal chegou a se colocar à disposição para pegar os produtos na casa do consumidor, mas a PBH reforçou que o caminho correto é a entrega às autoridades. Enquanto isso, a Polícia Civil se debruça sobre a investigação e informa que peritos da corporação passaram o sábado analisando bebidas e outros materiais apreendidos na sede o fabricante, na Região Oeste de BH e em outras partes da cidade.
Conheça os postos de coleta da vigilância sanitária:
- Barreiro: Avenida Olinto Meireles, 327 – Barreiro
- Centro-Sul: Avenida Augusto de Lima, 30, 14ª andar – Centro
- Leste: Rua Salinas, 1.447 – Santa Tereza
- Nordeste: Rua Queluzita, 45 – Bairro São Paulo
- Noroeste: Rua Peçanha, 144, 5º andar – Carlos Prates
- Norte: Rua Pastor Murilo Cassete, 85 – São Bernardo
- Oeste: Avenida Silva Lobo, 1.280, 5º andar – Nova Granada
- Pampulha: Avenida Antônio Carlos, 7.596 – São Luiz
- Venda Nova: Avenida Vilarinho, 1.300, 2º Piso – Parque São Pedro
Até o momento, há 10 notificações de pacientes que desenvolveram a síndrome nefroneural. Todos eles tomaram a cerveja e têm ligação com o Bairro Buritis e suas redondezas. Nove estão internados em hospitais da Grande BH e um morreu.
Ontem, a Polícia Civil emitiu nota sobre as investigações. A corporação informou que peritos do Instituto de Criminalística realizaram análises de amostras de cerveja produzida pela Backer durante todo o sábado. Quanto aos 600 litros de bebidas apreendidos na quinta-feira, durante operação na fábrica, a polícia informa que também passam por exames e que os laudos devem ficar prontos “nos próximos dias”. A apuração não se resume apenas ao rótulo Belorizontina.
“Nada é descartado”: esse é o posicionamento dos investigadores, que trabalham com variadas hipóteses para a contaminação associada à intoxicação dos pacientes, incluindo toda a cadeia de produção, distribuição e venda da cervejaria Backer ou até mesmo sabotagem. Essa última alternativa veio à tona depois que a polícia informou que um boletim de ocorrência foi registrado contra um ex-funcionário demitido pela empresa de bebidas artesanais.
Um trabalhador da companhia procurou a Polícia Civil depois de se sentir ameaçado pelo ex-colega. Contudo, o denunciante não foi à delegacia representar pela continuidade de ação penal. Por isso, não foi instaurado o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO).
Consumidores têm procurado as autoridades para registrar boletins de ocorrência contra a Backer afirmando ter passado mal ao consumir a Belorizontina. Nas redes sociais, consumidores fazem relatos divergentes sobre o consumo da cerveja. Algumas afirmam ter tomado cervejas das linhas de produção L1 e L2 do lote 1348 – no qual se inserem as garrafas em que a Polícia Civil encontrou o dietilenoglico – sem sentir qualquer incômodo, enquanto outros dizem ter passado mal com a bebida do rótulo desse e de outros lotes.
Em entrevista ao Estado de Minas publicada na edição de sábado, o professor Claudio Donnici, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), disse que a explicação para as reações diferentes pode estar na quantidade da substância ingerida. Segundo ele, a dose tóxica mínima é estimada em 0,14 miligrama da substância por quilo de peso corporal.
Um empresário e professor, de 31 anos, morador do Bairro Buritis, afirma ter ingerido cervejas do lote suspeito e passado “muito mal” dois dias depois. “Bebi a cerveja no dia 3 de janeiro. Nos dois seguintes, passei muito mal, com ânsia de vômito, barriga inchada, mas achei que era pelo fato de eu não beber muito. Naquele dia, eu e uns amigos tomamos uma caixa e meia de Eisenbahn e tomamos só duas Belorizontinas. Só eu passei mal, meus amigos não”, contou o homem.
Em Viçosa, uma mulher foi internada com sintomas da síndrome depois de ter tomado a cerveja da Backer. Ela chegou ao hospital com duas garrafas de lotes diferentes entre si e daqueles em que a polícia detectou o dietilenoglicol. O caso foi comunicado às autoridades mas ainda não está incluído na lista da SES. “A paciente se internou na quinta-feira com sintomas semelhantes aos dos casos sob investigação. Ela relatou o consumo da cerveja Belorizontina, adquirida em Viçosa, de dois lotes diferentes. A situação ainda é apenas uma suspeita. A paciente está clinicamente estável, mas ainda está internada em observação”, contou ao Estado de Minas o diretor administrativo do Hospital São João Batista, Sérgio Pinheiro, no sábado.
Desde que foi ligada às investigações, a Backer tem informado que não usa o dietilenoglicol em seu processo de produção, mas o monoetilenoglicol. Notas fiscais apreendidas pela polícia confirmam compra de monoetilenoglicol. A empresa também diz que realiza uma vistoria interna na fábrica interditada e afirma querer uma contraprova dos testes da polícia.
O CASO
As informações sobre a doença começaram a circular no primeiro fim de semana de 2020 por meio das redes sociais. Desde então, os casos suspeitos chegaram a 10, com uma coincidência entre eles: o consumo da cerveja Belorizontina. Os pacientes são de Belo Horizonte, um de Nova Lima, um de São Lourenço (Sul de Minas) e outro de Ubá (Zona da Mata). O dessa última cidade é Paschoal Demartini Filho, de 55 anos, que morreu na terça-feira em hospital de Juiz de Fora depois de consumir a cerveja em festa de família na capital mineira. O genro dele, Luiz Felippe Teles Ribeiro, de 37, também foi internado com o mesmo quadro do sogro.
Uma força-tarefa foi criada para lidar com o caso, incluindo órgão estaduais e federais. A Polícia Civil detectou a presença do composto orgânico dietilenoglicol em duas amostras da Belorizontina, o que forçou o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) a interditar instalações da fábrica mineira, localizada no Bairro Olhos D'Água, Oeste de Belo Horizonte.
Dos 10 pacientes internados, três já testaram positivo para a presença do dietilenoglicol em suas correntes sanguíneas. O fato fez com que a Saúde estadual criasse um protocolo clínico para intoxicação pelo composto orgânico. O passo a passo, descrito em nota técnica disparada aos profissionais de saúde no sábado, inclui exames laboratoriais, avaliações oftalmológica e neurológica e o uso do etanol como remédio para frear os efeitos da doença.
O mesmo documento da saúde pública estabelece o que é caso suspeito: todos que apresentarem os sinais da doença desde novembro e tenham consumido qualquer cerveja da Backer. Foi a primeira vez que a empresa foi citada nominalmente em um documento da Saúde estadual. Os sintomas da sídrome são dificuldades gastrointestinais (náuseas e/ou vômitos e/ou dor abdominal) e insuficiência renal aguda, seguidos ou não de uma ou mais alterações neurológicas, como paralisias facial e descendente, borramento visual, amaurose (perda da visão), mudanças sensitivas e crise convulsiva.