Jornal Estado de Minas

Entenda por que Victor Chaves foi condenado a 18 dias em regime aberto por agredir a ex-mulher


O divórcio entre o cantor Victor Chaves, que fazia dupla com Léo, e a empresária Poliana Batagini rendeu mais um polêmico capítulo nessa segunda-feira (13), com a divulgação das imagens da briga que separou o casal, em fevereiro de 2017.  Filmadas pelas câmeras do elevador do prédio em que os dois moravam em Belo Horizonte, as cenas impressionam. Então grávida de quatro meses do segundo filho, Poliana tenta sair de casa às pressas, pedindo socorro ao porteiro. Em dado momento, é empurrada pelo ex-marido, cai no chão e continua sendo agredida com pequenos chutes. 



O episódio rendeu ao sertanejo uma condenação pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais por vias de fato, fixada em 18 dias em regime aberto, além do pagamento de indenização de R$ 20 mil reais à ex-mulher - punição que gerou revolta sobretudo nas redes sociais, onde o assunto é dos mais comentados. 

Afinal, a sentença fixada pela juíza do TJMG Roberta Chaves é justa? A pedido do Estado de Minas, advogadas e integrantes de movimentos de defesa dos direitos das mulheres analisam a questão. 

O processo

O primeiro ponto ressaltado pela assessora jurídica e mestranda em Direito pela Universidade Federal de Sergipe Clara Adolli é que Victor Chaves foi denunciado pelo Ministério Público de Minas Gerais por vias de fato, uma contravenção penal - termo jurídico que define comportamentos ilícitos de menor potencial ofensivo. 





Para a contravenção de vias de fato - as chamadas agressões físicas que não deixam marcas - não há pena privativa de liberdade. Nesse caso, a punição ao contraventor é estipulada entre 15 dias a três meses em regime aberto ou semiaberto, frequentemente convertida em prestação de serviços à comunidade. 

“Eu não diria que a decisão judicial, em si, foi injusta ou seletiva. O erro começou lá no início do processo, quando o Ministério Público considerou que a conduta do Victor não era grave o suficiente para ser considerada como crime, apenas porque não deixou marcas aparentes no corpo da Poliana", avalia a profissional. Se o processo todo não foi instruído de forma justa, como a sentença poderia ser?" questiona

Coordenadora de Políticas de Prevenção à Violência contra a Mulher da OAB, a advogada Isabel Araújo Rodrigues pondera o fato de que a maioria das denúncias de violência doméstica que chegam às promotorias de Justiça não incluem lesões corporais graves. Empurrões, tapas e puxões de cabelos, afirma a especialista, estão entre os atos mais comumente praticados. “Nem por isso, são casos a serem tratados como isolados, ou como uma briga qualquer. A Poliana, por exemplo, estava grávida. A situação de violência física e psicológica daquele momento poderia ter prejudicado o bebê”, argumenta a especialista. 

Isabel observa ainda que desfecho do caso Victor Chaves reforça a sensação de impunidade para os agressores, uma vez que trata-se de pessoa pública, que inspira e motiva outros homens. “Claro que o fato de um homem - principalmente uma celebridade - ser julgada e condenada por agredir à esposa é, por si só, um fato positivo. Eu não desconsidero isso", diz.





"Ocorre que a sentença leve aplicada ao caso passa ao público masculino a mensagem de que a violência contra mulher é aceitável. Algo que a Justiça, no fim das contas, vai tratar como uma briga de bar corriqueira, quando estamos falando de um problema de grande impacto social. Haja vista o fato de que os filhos do casal que convivem num ambiente violento, por exemplo, podem aprender a reproduzir condutas e comportamentos machistas. O menino aprende que pode bater. A menina, que é normal apanhar ”, defende

Pesquisa

Um estudo realizado da Universidade Federal do Ceará, publicado em agosto de 2017,  mede os efeitos da violência doméstica para além âmbito conjugal. Intitulado Violência Doméstica e seu Impacto no Mercado de Trabalho e na Produtividade das Mulheres, a pesquisa estima que o custo da agressão às mulheres no mercado de trabalho brasileiro chegue a R$ 1 bilhão por ano

O cálculo é baseado no índice de absenteísmo, ou seja: o número de faltas femininas ao emprego por agressões sofridas em casa. As ausências se dão tanto em decorrência de licenças médicas, quanto tratamentos psicológicos pós-traumáticos. "Se considerarmos também o impacto dessa violência no sistema de saúde, o prejuízo é ainda maior. Diante disso, fica a freflexão: como podemos continuar tratando casos como o do Victor como mero desentendimento de casal?", analisa Isabel Araújo. 

Números preocupantes

Dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019 revelam preocupante escalada da violência contra a mulher em Minas Gerais. Divulgado em setembro do ano passado, o relatório mostra que o estado liderou o ranking nacional de feminicídios em 2018, com 156 ocorrências registradas naquele ano - seis a mais que em 2017. O número de vítimas dessas agressões em território mineiro bateu a casa dos 145 mil no mesmo período, segundo informações da Secretaria de Segurança Pública.