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Estado de Minas

Risco de dengue se multiplica com as chuvas em Minas Gerais

Casos prováveis em Minas saltam de 4.671 para 6.988 em uma semana, com cinco mortes, aponta boletim da Secretaria de Saúde. Poças e entulho viram criadouros e elevam o perigo


postado em 05/02/2020 06:00 / atualizado em 05/02/2020 08:20

Na Avenida Tereza Cristina, um verdadeiro espelho d'água se formou em trecho ainda em reparação depois da chuva: área propícia para a proliferação do Aedes(foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)
Na Avenida Tereza Cristina, um verdadeiro espelho d'água se formou em trecho ainda em reparação depois da chuva: área propícia para a proliferação do Aedes (foto: Paulo Filgueiras/EM/D.A Press)
Moradores da capital e cidades do interior de Minas obrigados a deixar suas casas devido às fortes chuvas que atingiram a cidade nos últimos dias e tendem a se repetir precisam de acompanhamento médico. Desde a semana passada, os profissionais de saúde estão em alerta e orientando a população sobre os riscos de doenças decorrentes de alagamentos e enchentes, como hepatite, tétano e leptospirose.

Mas o perigo não para por aí. O vaivém de chuvas alternadas com dias de sol fornece ainda o ambiente perfeito para a proliferação do Aedes aegypti, o mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika: água acumulada nas ruas, em montes de entulho, jardins, quintais ou até em pequenos vasos de planta se transformam em criadouros. A tendência é de que a escalada dessas doenças se torne ainda mais forte.

A dengue já lidera as estatísticas dessas arboviroses e cresce aos saltos, aponta boletim da Secretaria de Estado de Saúde (SES) divulgado ontem. Os casos prováveis da enfermidade passaram dos 4.671 registrados até a terça-feira da semana passada para 6.988 no levantamento de ontem (veja quadro) – o que dá uma média de 200 diagnósticos suspeitos e/ou confirmados por dia em Minas. As regiões Nordeste, Leste, Sul e Sudeste de Minas estão em alerta.

O perigo se mostra por toda parte. Duramente atingida há uma semana, quando a chuva torrencial desabou sobre Belo Horizonte, o Bairro de Lourdes, na Região Centro-Sul, ainda exibe pontos vulneráveis como na Rua Marília de Dirceu. Na tarde de ontem, passando pelo local com a mulher, a professora Roselea Gomes Garcia e Silva, o médico e morador próximo da Praça Marília de Dirceu, Agnaldo Silva, alertou para os riscos de doença presentes na água empoçada e na poeira que sobe da lama seca.

“Essa poeira faz muito mal, principalmente para quem sofre com doenças respiratórios, a exemplo de bronquite, asma e outras. Em relação à água empoçada, é visível o perigo para dengue”, afirmou o médico, que está nessa profissão há 46 anos, dos quais 37 no Hospital de Pronto-Socorro João XXIII. Com tanta experiência, Agnaldo receita “conscientização” para que as epidemias de dengue e os efeitos decorrentes da chuva não atrapalhem a vida dos belo-horizontinos. “Neste momento, a gente fica muito preocupada com os menos favorecidos”, acrescentou Roselea.

(foto: Arte EM)
(foto: Arte EM)


Quem passa na esquina das ruas Marília de Dirceu e Antônio Aleixo dá de cara com água empoçada e um buraco resultante das últimas chuvas. “A Prefeitura de Belo Horizonte está fazendo um ótimo trabalho, ninguém, pode negar. Mas poeira e água parada sempre preocupam”, afirmou a aposentada Doralice Pinto Coelho, que parou para dar uma espiada, ao lado da irmã e também aposentada, Maria Regina Pinto Coelho.

Depois da destruição causada pelas fortes chuvas que castigaram a Grande BH e cidades do Leste de Minas no fim de janeiro, móveis, eletrodomésticos e pneus aumentam a pilha de entulhos nas ruas – e os criadouros do Aedes. Só para se ter uma ideia, em Belo Horizonte, por exemplo, a Superintendência de Limpeza Urbana (SLU) informou que recolhe, diariamente, os resíduos trazidos pela chuva ou descartados pelos moradores devido aos alagamentos. Somente de 27 de janeiro até o dia 2, a SLU recolheu 5.066 toneladas destes resíduos. Omédico infectologista e professor adjunto do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG Mateus Rodrigues Westin alerta: “As chuvas favorecem acúmulo de água parada e, consequentemente, a maturação dos ovos do Aedes. Ou seja, os últimos temporais aumentaram a quantidade de lixo nas ruas e o risco de transmissão. Nem sempre a limpeza é feita com a rapidez necessária”, explicou.

Agnaldo Silva e Roseleia Gomes flagram o perigo perto de casa: poça de água pronta para virar criadouro do mosquito no Bairro de Lourdes, duramente atingido pelas chuvas(foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)
Agnaldo Silva e Roseleia Gomes flagram o perigo perto de casa: poça de água pronta para virar criadouro do mosquito no Bairro de Lourdes, duramente atingido pelas chuvas (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)


Este ano, de acordo com a SES, Minas Gerais registrou 6.988 casos prováveis de dengue. No primeiro boletim do ano, divulgado em 8 de janeiro, eram apenas 56. Já são cinco mortes sob investigação, distribuídas em Medina (Vale do Jequitinhonha), Além Paraíba (Zona da Mata) e Campo Belo (Centro-Oeste), Iturama (Triângulo Mineiro) e Tapuraba (Zona da Mata). Vale lembrar que nem todos os diagnósticos prováveis e mortes sob suspeição ocorreram no período de sete dias, mas sim que eles passaram a fazer parte do levantamento nesse intervalo de tempo. No ano passado, foram confirmados 178 óbitos e 89 permanecem em investigação.

O boletim da SES registra ainda a notificação de 131 casos prováveis de febre chikungunya, dois deles em gestantes, e 52 de zika, sendo seis em grávidas. Ainda de acordo com o boletim, 13 municípios estão com incidência muito alta (mais de 500 casos por 100 mil habitantes) de casos prováveis de arboviroses, 10 com alta incidência (300 a 499 por 100 mil habitantes), 29 em média incidência (100 a 299 por 100 mil habitantes) e 492 sem casos prováveis. De acordo com a SES, as medidas de controle da dengue, zika e chikungunya em Minas Gerais ocorrem o ano todo e são intensificadas nos meses mais quentes e chuvosos, em que há maior incidência da transmissão das arboviroses.

BH confirma 72 casos e investiga outros 792


A capital mineira concentra os casos de dengue em números absolutos, ou seja, sem considerar o tamanho de sua população. Só nos primeiros dias do ano foram confirmados 72 casos da doença na capital. De acordo com a Secretaria Municipal de Belo Horizonte, há 792 notificações pendentes de resultados. Foram investigados e descartados 111 casos. Este ano também foram notificados 14 casos de chikungunya em residentes de Belo Horizonte, que permanecem em investigação. Em relação à zika, a administração municipal recebeu a notificação de cinco casos. Desse total, um foi descartado e quatro permanecem em investigação.

A aposta da Secretaria Municipal de Saúde no combate à transmissão das doenças ligadas ao Aedes é a total implementação do Projeto Wolchabia, com a liberação com a liberação de mosquitos Aedes com a bactéria que dá nome ao plano, que têm a capacidade reduzida de transmitir os vírus para as pessoas, diminuindo o risco de surtos de dengue, zika, chikungunya. De acordo com o órgão, entretanto, a vigilância e combate continuam como rotina na cidade. Em 2019, de janeiro a dezembro, foram realizadas quase 5 milhões de vistorias. “Além disso, é feito monitoramento quinzenal de pontos estratégicos, com identificação de focos e aplicação de produtos químicos. (…) Estes locais são vistoriados a cada 15 dias”, informou a secretaria.

Contagem, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, também não entrou na lista de cidades com muito alta incidência de casos por arboviroses, mas a doença preocupa as autoridades municipais, principalmente depois dos últimos temporais. A prefeitura afirma que medidas estão sendo realizadas, assim como a contabilidade de áreas atingidas. Na cidade, há 98 casos suspeitos, 14 confirmados e 16 descartados. “Um mutirão de limpeza será executado para eliminação dos criadouros e para efetivação do plano de contingência estabelecido”, informou a prefeitura, por meio da assessoria de imprensa.

A cidade vizinha, Raposos, com dois casos suspeitos e também muito a afetada pelas chuvas, é outra que se prepara para enfrentar os riscos de elevação no número de doentes. “Os agentes da Zoonoses estão realizando manejo ambiental. E agentes da prefeitura já estão fazendo vistorias nas casas à procura de focos do mosquito. De acordo com a administração municipal, 280 visitas foram feitas até agora. “Estamos esperando chegar novos equipamentos pois o setor de Zoonoses também foi atingido pela enchente e perdeu tudo”, informou a assessoria de imprensa da cidade.

Passada a chuvarada, a preocupação da vendedora Janete Celeste Braz é com a dengue: “Já tive e sei muito bem como é. Sofri muito, passei mal demais”, diz a moradora do Bairro Ana Lúcia, em Sabará, bem na divisa com a capital. Na tarde de ontem, na companhia do sobrinho Matheus Marques, de 26 anos, mecânico, que também teve a doença e tem péssimas lembranças, Janete mostrou a esquina da Avenida Cardoso de Menezes, com Rua Raimundo Assunção, onde há lixo acumulado. “A prefeitura manda limpar e no outro dia está sujo de novo. É um problema sério”, afirmou a vendedora. O desrespeito é grande, pois, na parede, está escrito, em letras coloridas e bem grandes: Não jogue lixo. Os repórteres vasculharam os resíduos e encontraram copinhos com a boca virada para cima, o que significa um criadouro fértil para o mosquito da dengue.

Para evitar a proliferação do Aedes, é importante cada um fazer sua parte e manter uma rotina semanal de verificação e eliminação de focos do mosquito dentro dos imóveis, já que cerca de 80% dos focos de mosquito, segundo especialistas, estão nas casas. “É preciso evitar de todas as formas o acúmulo de água parada em todos os objetos e lugares no ambiente privado e de trabalho, sejam vasos de planta, pneus ou caixas. Também é importante acionar o poder público para recolher lixo e entulhos nas proximidades”, recomendou o infectologista Mateus Rodrigues Westin.


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