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Em nível de alerta: Copasa usa bombas para rebaixar represa e evitar inundação

Vargem das Flores, na Grande BH, supera capacidade máxima e empresa adota manobra de emergência, temendo que chuva prevista até o carnaval possa causar alagamentos


postado em 20/02/2020 06:00 / atualizado em 20/02/2020 07:34


O que começou a se desenhar como o lado positivo dos temporais que castigaram a Grande Belo Horizonte neste início de ano se transformou em novo pesadelo: passados cinco anos de uma situação de ameaça de desabastecimento de água, denunciada pelo Estado de Minas, quando o reservatório de Serra Azul, operado pela Copasa, praticamente atingiu seu volume morto, as chuvas dos últimos meses acabaram por afastar um novo risco de escassez hídrica para a população. Mas o volume foi tanto que está obrigando a empresa estadual de abastecimento a manobras desesperadas para que a represa de Vargem das Flores, em Betim, na região metropolitana, não dispense tanta água que chegue a inundar bairros que ficam abaixo, nas baixadas do Ribeirão Betim, onde 51 famílias já foram removidas preventivamente.



O Estado de Minas apurou que, na segunda-feira, a represa já operava com mais de 102% de sua capacidade – ou seja, com mais água do que pode comportar. Com isso, seu único sistema de alívio, por meio de um canal vertedouro, precisa ter sua capacidade de vazão diariamente reforçada por várias bombas. Até os respiros das adutoras de água estão acionados, para tirar o máximo volume possível da represa antes que mais chuvas venham e novas enchentes ocorram, afligindo a população abaixo do lago.

Esforço do lado de cima - Bombas auxiliam no escoamento, pois barragem só conta com um vertedouro para redução do nível. Operadores se preocupam com chuvas (foto: Mateus Parreiras/Em/D.a press)
Esforço do lado de cima - Bombas auxiliam no escoamento, pois barragem só conta com um vertedouro para redução do nível. Operadores se preocupam com chuvas (foto: Mateus Parreiras/Em/D.a press)


Para se ter uma ideia do esforço que vem sendo feito antes da chegada de chuvas mais fortes, previstas para superar 40 milímetros até sábado, o vertedouro, as bombas e todos os respiros juntos estão removendo 6 mil litros por segundo do reservatório, 24 horas por dia. Isso equivale a uma captação igual à de Rio Manso, a maior em termos de reservatórios da Grande BH e equivalente a quatro vezes a captação da própria Vargem das Flores (1.500 litros por segundo). Como resultado, o Ribeirão Betim, que é o receptor natural da represa, aumentou em 50 vezes o seu volume, ameaçando casas que foram construídas em suas várzeas nos últimos sete anos, quando o curso d'água esteve seco e dentro da calha mínima.

Temor do lado de baixo - Moradores que vivem perto do Ribeirão Betim têm difícil, por pinguelas que foram engolidas. Copasa diz que área não podia ser ocupada(foto: Leandro Couri/Em/D.a press)
Temor do lado de baixo - Moradores que vivem perto do Ribeirão Betim têm difícil, por pinguelas que foram engolidas. Copasa diz que área não podia ser ocupada (foto: Leandro Couri/Em/D.a press)


O diretor de Operação da Copasa, Guilherme Frasson Neto, afirma que a represa não corre qualquer risco de rompimento e que, na verdade, sua operação impediu que a população abaixo fosse atingida por várias enchentes provenientes das fortes chuvas, e só nos últimos dias permitiu que volumes maiores fossem escoados. “Se não fosse a represa, o ribeirão que corre abaixo teria recebido toda essa água e teriam ocorrido várias enchentes”, disse.

RISCO Porém, o dirigente esclarece que, mesmo com as medidas que estão sendo tomadas, ainda é possível que a represa venha a verter água suficiente para causar estragos. “Desta vez, fomos atingidos por chuvas atípicas e achamos por bem averiguar com as populações que construíram suas casas dentro da área de vargem, onde ocorrem as cheias naturais do ribeirão. Mas, mesmo com tudo o que está sendo feito, ainda é possível que ocorram alagamentos de casas e de vias também, porque todas essas estruturas ocuparam irregularmente áreas de inundações naturais”, afirma.
Moradores de áreas afetadas criticam o fato de a barragem não ter dispositivos de alívio mais eficazes, como comportas, que poderiam ter sido acionadas antes de a represa atingir um nível superior à sua capacidade e chegar a verter. Questionam também por que as ações atuais, como o acionamento de bombas e respiros, não foram adotadas antes.
 
Contudo, o diretor de Operação da Copasa afirma que tudo foi feito com antecipação. “A Barragem de Vargem das Flores não foi construída para regularizar as águas do Ribeirão Betim, mas para ser um reservatório de abastecimento da Grande BH. As pessoas que posteriormente ocuparam as áreas alagáveis é que se colocaram em situação de risco. A Copasa desde o início vem adotando as medidas necessárias para não inundar as casas, com o acionamento no tempo devido de todas as medidas necessárias”, afirma Neto.

ALÍVIO As chuvas acumuladas até aliviaram a pressão sobre os reservatórios que abastecem a Grande BH, após a ameaça representada pelo rompimento da Barragem B1, da Mina Córrego do Feijão, operada pela Vale em Brumadinho. O desastre atingiu o Rio Paraopeba, inutilizando a captação que era feita no manancial e contribuía com 5 mil litros por segundo para o abastecimento da Grande BH. O impacto chegou a levar a secretária-adjunta de estado de Panejamento e Gestão, Luíza Barreto, a declarar que a Grande BH corria risco de escassez hídrica a partir de março deste ano, se os reservatórios não se recuperassem. Para se ter uma ideia, a média de precipitações do mês de fevereiro, de 132,7 milímetros na bacia de Vargem das Flores, já foi superada em 35% nos 19 primeiros dias do mês, atingindo 179,5 milímetros. O acumulado desde janeiro é de 699,1 milímetros, segundo a Copasa.
 
A Copasa descarta o risco de escassez, mas afirma que ainda é preciso modular as vazões das barragens que sustentam quase metade da Grande BH. “Estamos procurando preservar os reservatórios para atravessar a estiagem com todos eles próximos da capacidade total. A perda da captação do Rio Paraopeba foi dura. Estamos agora com Vargem das Flores e Rio Manso em 100% e Serra Azul sendo preservada (atualmente, o reservatório está com 74% do nível total)”, afirma o diretor da Copasa.

Volume preocupa quem ficou em casa


O córrego que sempre correu manso, praticamente uma calha de esgoto a céu aberto atravessando a Vila das Flores, em Betim, se avolumou, tomando porte de um rio de águas verdes que engoliu pontes e pinguelas. Com as passagens obstruída pela água que excede a capacidade da Represa de Vargem das Flores e inunda o Ribeirão Betim, restou a moradores, como o desempregado Hiago Duarte, de 22 anos, tomar medidas perigosas para levar sua família até serviços públicos, como atendimento médico. O homem colocou o filho de um ano no pescoço e carregou o carrinho do bebê de um mês durante a travessia que ele e a mulher, a doméstica Natiele Martins de Souza, de 20, precisaram fazer sobre uma ponte submersa para chegar ao posto de saúde.
 
Enfrentaram águas velozes, correnteza forte quase até os joelhos, se arriscando a cair e a derrubar os filhos pequenos. “Não tem outro jeito. Para passar para o outro lado, tinha de ter um viaduto ou uma ponte mais alta. A gente mesmo que mora aqui é que montou essas pontes, que o rio carregou para longe ou passou por cima”, lamenta o desempregado.
 
O excesso de água escoada pelo Ribeirão Betim obrigou a Copasa e a Defesa Civil de Betim a removerem preventivamente 51 famílias de áreas de alagamento, caso as chuvas previstas para os próximos dias forcem o aumento da vazão da represa, que já opera acima da capacidade máxima. “Adotamos essa ação como medida preventiva, para que as pessoas não fiquem expostas às cheias do ribeirão, no caso de mais chuvas de volumes atípicos. A Copasa providenciou hotéis no Centro da cidade e até aluguel de propriedades de forma emergencial”, disse o diretor de Operação da companhia de abastecimento e esgoto, Guilherme Frasson Neto.
 
Mas os alagamentos continuam a infernizar a vida de quem ficou para trás, como a doméstica Cirleide da Anunciação Lopes de Jesus, de 49, e o marido dela, o operador de máquinas João de Jesus, de 54. Os dois moram em uma casa mofada, com umidade excessiva depois da última cheia que alagou o imóvel. “A gente nem compra mais nada para dentro de casa, porque senão a água vai levar embora. O que temos já é a conta de colocar em cima de outros móveis, para não ficar debaixo d'água”, reclama a doméstica.
 
O marido dela já tentou de tudo para domar a água que desce da rua e das cheias do Ribeirão Betim. “Cortei uma vala em volta da casa para desviar a água, levantei o terreno na entrada, mas nada resolveu. Além do ribeirão, aqui na Rua 20 tem um esgoto ou drenagem de água de chuva que ficou aberto e que inunda tudo. Queria que a prefeitura ou a Copasa resolvessem essa situação, que não está dando mais para aguentar”, desabafou.


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