"Meu esporte agora é dar um passo". Esse se tornou o lema do professor de psicologia da UFMG, Cristiano Mauro Assis Gomes, de 47 anos, uma das vítimas da cervejaria Backer. Ele retornou para casa nesta sexta-feira (6), depois de permanecer 74 dias internado no Hospital Biocor, Nova Lima, na Grande BH.
Quando esteve internado, Cristiano participou de episódio dO Caso Backer, o podcast exclusivo do Estado de Minas sobre essa história.
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"Ele não tem expressão facial, mas está muito feliz por dentro", garantiu Isabella, de 18, filha de Cristiano. Os dois e a esposa do homem, Flávia Schayer, concederam entrevista à imprensa cercado de cartazes com mensagens de apoio à vítima.
As frases riscadas sobre cartolina têm como autores a equipe médica do Biocor e os familiares de Cristiano – verdadeiros soldados do professor da UFMG durante a batalha contra a doença. Praticamente sem movimento no rosto, ele chegou a pesar 120 quilos no hospital por conta das dificuldades dos rins de filtrar o sangue, diante dos danos causados pelo dietilenoglicol, a substância química encontrada em dezenas de lotes da Backer.
O rótulo mais contaminado é justamente o que foi mais consumido por Cristiano Mauro Assis Gomes: a Belorizontina. "Vou fazer hemodiálise três vezes por semana. O sentimento ainda é de estranheza. Até 19 de dezembro, eu era professor e tinha uma rotina muito intensa. Por volta do dia 26, o desafio era respirar sem uma dor terrível", lamenta a vítima.
Cobranças à Backer, que também resultaram em ações do Ministério Público acatadas pela Justiça, compõem o discurso da família de Cristiano com protagonismo.
"Não quero humanidade da empresa, apenas justiça", ressalta o professor. "A Paula (Lebbos, uma das sócias da cervejaria) fala muita inverdade. Éramos clientes e nos tornamos vítimas. Nunca houve assistência. O juiz mandou pagar, mas eles entram com recurso e não pagam. Não tem nada a ver com bens bloqueados", crítica Flavia Schayer, esposa da vítima.
Drama
Se o alívio pela alta e desaprovação diante da postura da Backer marcam o discurso da família, o drama vivido por Cristiano permanece vívido na cabeça das pessoas próximas ao professor.
“Pensei que seria melhor morrer. A dor é terrível. É insuportável. Eu não desejo para ninguém da empresa o que eu passei”, afirma a vítima, que também pediu mais rigor com o padrão de qualidade das empresas.
“Quando fiquei sabendo que era a cerveja, pensei: 'isso é o Brasil'. Depois, a segunda sensação foi que precisamos mudar esse país. Empresários insensíveis que só pensam em lucro. Precisamos fazer uma crítica à vida privada. Como estamos agindo no capitalismo? Precisamos de ética. Os exemplos são péssimos”, diz.
O caso
Cristiano tomou cerca de 30 garrafas da Belorizontina ao longo do mês de dezembro. No dia 30 de novembro, ele já havia consumido sete em uma festa num sítio de amigos e passou mal.
Depois disso, ele bebeu cerca de uma por noite no mês seguinte. No dia 21 de dezembro, consumiu aproximadamente cinco garrafas e não se sentiu bem nos dias seguintes. Na antevéspera do Natal, ele foi internado no Hospital Biocor. A hemodiálise começou justamente na data em que se comemora o nascimento de Cristo. Quatro dias depois, o drama da família aumentou quando Cristiano deu entrada no CTI, onde permaneceu por 44 dias. Os sintomas neurológicos iniciaram em 1º de janeiro.
Outro lado
Sobre as cobranças de assistência das vítimas, a Backer tem informado que enfrenta dificuldades para pagar contas básicas, como água, energia e salário dos funcionários. A empresa também disse, em nota na quinta-feira, estar de “pés e mãos amarradas” devido ao bloqueio dos bens. “Pouco ou quase nada podemos fazer nesse momento”, sustentou a cervejaria.