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Estado de Minas COVID-19

BH desacelera frente ao coronavírus

Em pleno meio de semana, cidade tem ruas do Centro vazias, transporte coletivo, restaurantes e estacionamentos com vagas de sobra e comerciantes desnorteados


postado em 19/03/2020 04:00

(foto: Fotos: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)
(foto: Fotos: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)




(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)


Cenas de uma quarta-feira de epidemia: na Savassi, estátua com máscara e um dos cruzamentos mais movimentados da cidade vazio. Centro de atendimento da PBH baixou as portas e restaurante ficou com lugares vagos
Cenas de uma quarta-feira de epidemia: na Savassi, estátua com máscara e um dos cruzamentos mais movimentados da cidade vazio. Centro de atendimento da PBH baixou as portas e restaurante ficou com lugares vagos


Ruas do Centro vazias; transporte coletivo com lugares de sobra; restaurantes com mesas à vontade em pleno horário de almoço; lojas ainda com vendedores, mas sem clientes; vagas de estacionamento para quem quisesse em frente a escolas, mesmo na hora de pico... O primeiro dia de suspensão das aulas, com poder público e empresas se esforçando para colocar funcionários em trabalho remoto, deu a Belo Horizonte um ar de feriado, e aos comerciantes da cidade amostra de dias que podem ser de desespero.

A crise provocada pelo novo coronavírus, que tem 703 casos em investigação no estado e 19 pessoas comprovadamente infectadas, entre elas 10 em Belo Horizonte, mudou a rotina da cidade e já atingiu de forma arrasadora a rotina urbana e o comércio. Nas ruas quase vazias, o movimento de pessoas e automóveis ontem era típico de um fim de semana. Na Praça Sete, onde pulsa o sistema nervoso da capital, ainda houve momentos de movimento intenso, mas bem menor que em um dia de semana “normal”. Mesma situação observada no serviço de ônibus e metrô, embora as concessionárias do setor ainda não dispusessem, ontem, de números.

Não por coincidência, o dia foi de vendedores nas portas de lojas tentando desesperadamente  atrair os poucos pedestres que caminhavam pelo Centro. Situação ainda mais grave para estabelecimentos dentro de galerias, onde o fluxo é menor.

Se os donos de lojas receberam com aflição uma prévia do que a cidade ainda vai enfrentar com o avanço dos contágios pela COVID-19, os comerciários estão desolados diante da possibilidade de serem dispensados. “Mesmo continuando empregados, não estamos vendendo nada, e o salário é complementado pela comissão sobre as vendas”, reclamou Elizabete Mendes, que trabalha em uma loja atacadista no Barro Preto, polo de moda na Região Centro-Sul da capital.

Na principal avenida da Savassi, a Getúlio Vargas, o cenário não variava muito e as lojas estavam às moscas em pleno horário de almoço. Funcionários desolados conversavam nas portas dos estabelecimentos, temendo pelo fu- turo. Eliane Maria da Silva, que trabalha há 10 anos em uma loja das proximidades, disse que os cinco empregados aguardam o que será decidido pelos patrões nos próximos dias.

Grávida, Eliane diz que se preocupa também em se contaminar. “Todos corremos riscos, transitamos no transporte público cheio de gente, cruzamos com diversas pessoas no trajeto de casa. Estou muito assustada”, resumiu. “Nem na greve dos caminhoneiros, quando as cidades ficaram paralisadas, o movimento foi tão afetado”, comparou. A loja onde ela trabalha, com 55 anos de existência, aposta nas vendas virtuais para se manter.

A comerciante Julieta Rosa de Souza, de uma loja de artigos masculinos no Barro Preto, disse que o movimento caiu 100%. Em 21 anos, foi a primeira vez que isso aconteceu, ela conta. “De sábado para cá, vendemos um terno apenas.” Ela pensa em fechar nos próximos dias, por precaução. “Temos que ter consciência de que também a convivência com o público é um grande risco”, disse.

Sandra Eline, proprietária de duas lojas no Barro Preto, disse que fechará uma delas. “Vou conversar com o proprietário, já que ambas são alugadas, e tentar suspender temporariamente o aluguel ou negociar alguma outra forma”, contou. Dos oito funcionários, apenas três têm trabalhado, e uma foi demitida anteontem, ao voltar de férias. “Não tenho como pagá-los”, resumiu. “Não vejo motivos para manter as portas aberas, porque não tem cliente e ninguém vai sair de casa para comprar roupas. Todos os eventos sociais estão suspensos, ninguém vai gastar nesse mo- mento.”

À procura
de receitas

Nas cozinhas de restaurantes da capital, diante da queda vertiginosa de clientes, em vez de receitas em série, donos e gerentes preparam planos para enfrentar a entressafra enquanto durar a pandemia do coronavírus. Segundo comerciantes, desde a segunda-feira o movimento começou a cair e ontem alguns estabelecimentos já amargavam movimento até 70% menor que a média durante a semana. Alguns proprietários pensam em férias coletivas, antecipação de folgas e até demissões.

Visivelmente preocupado, Marcos Afonso de Araújo, proprietário de um restaurante na Avenida Getúlio Vargas, disse que ontem contabilizou apenas 40% do volume de clientes no horário de almoço, o que forçou a redução do volume de alimentos à disposição. Após 26 anos à frente do negócio, ele disse que nunca enfrentou crise tão intensa, e que ainda não sabe o que fará com os 13 funcionários. “Talvez antecipar férias”, considerou. “Quem vai pagar minhas contas? Acho que está havendo um pouco de exagero, já tomamos todas as medidas de precaução recomendadas pelos serviços de saúde”, disse ele, elencando providências como a distribuição por todas as dependências de álcool em gel.

A queda de clientes também foi sentida em restaurantes da Savassi. De acordo com o gerente de um deles, Gustavo Dahas, na segunda-feira caiu em 30% a média de clientes. “Na terça, a queda foi de 50% e hoje (quarta-feira), se acentuou, com número de clientes 70% menor”, contou, prenunciando crise jamais vista no estabelecimento. Tanto que a partir de hoje cinco funcionários já entram em férias antecipadas.

“A situação é imprevisível. Os colégios próximos suspenderam as aulas e muitos escritórios estão fechados, o que nos tem afetado em cheio.” Caso a situação se agrave, e se houver determinação de fechamento de bares e restaurantes, a ideia é partir para atendimento em sistema de entregas.

BH Resolve para; metrô continua


A Prefeitura de Belo Horizonte suspendeu ontem o atendimento presencial da central BH Resolve, no Centro da capital, como parte das medidas para conter o avanço da COVID-19 na cidade. A unidade recebia mais de 10 mil pessoas diariamente, entre usuários que solicitam serviços e cidadãos em geral que transitam pelo espaço.

Os atendimentos mais demandados podem ser solicitados on-line, segundo a prefeitura. Dos 778 serviços disponíveis, 300 podem ser solicitados pela internet e 40 pelo PBH APP, aplicativo da prefeitura.

No transporte coletivo, a Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) informou ontem que o metrô de Belo Horizonte segue funcionando normalmente, afastando rumores de que o sistema seria paralisado. Em nota, a concessionária afirmou que “segue cumprindo a grade habitual de viagens, enquanto acompanha de perto a situação da doença em Belo Horizonte e região metropolitana”.

A companhia ressaltou que foi criada a Comissão de Higiene e Prevenção, que acompanha de perto as situações nos trens e estações, seguindo orientações dos órgãos de saúde. Quanto à lotação nas composições, informou que monitora o fluxo de passageiros nas estações e que posicionou trens em locais estratégicos para serem lançados no sistema em casos de aumento de demanda, visando diminuir a lotação no interior dos vagões. A redução de viagens, conforme a CBTU, se dará apenas se for registrada queda no número de passageiros ou para preservar os próprios funcionários do sistema.

Consultada, a BHTrans também informou que ainda não há previsão para alteração dos quadros de horários dos ônibus na capital.

Depoimento


Alexandre Guzanshe
Repórter Fotográfico

Faço o trajeto de casa para a redação geralmente usando o serviço público de transporte. Hoje, cheguei ao ponto e já notei que algo estava estranho, diferente. Em alguns minutos, passa o Circular 02 todo fechado, ônibus com ar-condicionado. Geralmente, nesse horário, começo da tarde, o coletivo sempre tem os assentos todos ocupados. Subo e vejo cadeiras vazias. Dois desceram. Ficamos eu e o motorista.  Passamos por duas paradas, ninguém subiu. Já no ponto principal, na Praça da Savassi, embarcaram apenas dois passageiros. Silêncio total... sem estudantes, sem trabalhadores. Foi assim até meu ponto de descida. Desembarquei sentindo que a cidade está se recolhendo.


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