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Estado de Minas

Coronavírus: mineiros contam como isolamento afetou suas vidas

Moradores de BH e região metropolitana falam sobre o que estão fazendo para se adaptar ao isolamento social e evitar a propagação do coronavírus. Impacto econômico é o maior temor


postado em 22/03/2020 06:00 / atualizado em 23/03/2020 11:40

O aumento dos casos de COVID-19 no Brasil caiu como uma bomba em diversas partes do país ao longo da semana passada. Minas Gerais é um dos estados do Sudeste com mais diagnósticos em investigação e confirmados, a maioria concentrada na capital mineira. A população assistiu, dia após dia, à diminuição do movimento nas ruas, ao fechamento de portas e à separação das famílias. Mas, em algumas áreas, muita gente ainda resiste à recomendação de ficar dentro de casa, lotando supermercados para fazer estoques. Às vezes, entre um aperto de mão e outro, trocando piadas, teorias conspiratórias ou comentando como as pessoas exageram.

Alguns nunca chegaram tão rápido ao local de trabalho. É só ligar o computador, um privilégio. Muitos nem sequer têm essa opção: respeitar ou não o isolamento social, até o momento a medida mais importante para conter o avanço da doença, é decidir se terão ou não comida na mesa ou o salário no fim do mês. No transporte público, nas filas dos bancos, hospitais ou andando apressadamente pelas calçadas, não é difícil achar rostos assustados ou olhares apreensivos atrás de máscaras.

Na TV, programas de entretenimento e variedades deram lugar a um extenso noticiário. Os que ainda resistem, mostram apresentadores falando diante de plateias vazias. Na internet, o coronavírus aparece até nas páginas de humor ou comportamento, aquelas que costumavam ser seguidas por quem queria se distrair. Pelo WhatsApp, aplicativo presente em 11 de cada 10 celulares, relatos de medo, mensagens de esperança, orientações, mas, infelizmente, muitas mentiras que só pioram a situação. 

A sensação é de estar parado no tempo. Projetos, estudo, uma consulta médica, compras, festas, aniversários, casamentos, visitas, viagens, shows, passeios, uma ida ao cinema, um abraço que seja foram adiados por tempo indeterminado. Insistir neles envolve uma série de “e se”: e se eu encontrar alguém infectado? E se eu pegar? E se eu passar para alguém? E se... Nenhuma geração que vive hoje havia presenciado tal situação e nessa escala.

Nos últimos dias, o Estado de Minas perguntou para algumas pessoas como a pandemia do coronavírus afetou suas rotinas, seus trabalhos, seus planos. As respostas você confere a seguir.

(foto: Arquivo pessoal)
(foto: Arquivo pessoal)
Marina Carvalho, 
de 24 anos, advogada, Bairro Esplanada, Santa Luzia

 “Moro com meus pais, que estão com quase 70 anos. Meu pai, especialmente, está duplamente no grupo de risco, não apenas pela idade, mas também por ser hipertenso. Assim, combinei fazer home office para o escritório onde trabalho. Aqui em casa tem álcool em gel agora, em todos os cômodos. E cada um tem sua garrafinha de água, sem compartilhar uma jarra, como antes. Estamos evitando sair de casa. Meu pai gosta de ir à padaria, de manhã, mas nem isso está fazendo mais.”

(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Luciana Guimarães de Morais, 
de 48 anos, administradora de empresas e professora, Bairro Ouro Preto, Região da Pampulha 

 "Eu já estava em greve (da rede estadual de ensino) e em casa, só que com liberdade de ir e vir. Mas aqui eu tenho dois idosos – meu pai, de 79 anos, e minha mãe, de 71, além de uma filha de 12 anos, que é estudante e também está em casa. Tenho mais do que a obrigação de sair de casa para eles. Quem vai ao supermercado sou eu, farmácia, ou qualquer coisa que eles precisam. Estamos realmente em isolamento, dentro do que é possível, e prestando muita atenção em tudo que é falado em relação à higiene pessoal. A gente tem procurado desmarcar o que é possível e ficar dentro de casa. Marquei um esqueminha de estudos para minha filha. Como a escola falou, eles não estão de férias, estão afastados porque o momento exige. Aí estamos com um home schooling aqui, com tempo para estudar, ler e ver alguma série juntos."

(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
(foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
Daniel William Araújo Coelho,
de 34 anos, professor de história da rede privada de ensino, Bairro Vila Clóris, Região Norte de BH

"Em fevereiro, o assunto na sala de aula já era o coronavírus. Até nosso planejamento teve que contemplar esse tema. Foram promovidos aulões com professores de biologia, química, matemática e história também, essa avaliação das grandes pandemias mundiais, como peste bubônica e gripe espanhola. Desde o dia 18, as escolas da rede privada estão sob efeito de uma liminar do TRT, porque estamos na linha de frente, somos vetores de transmissão. Estou em casa, ainda trabalhando, porque algumas escolas solicitaram roteiros de estudos para os alunos. A convivência com esse risco tem nos permitido algum salto para pensar nossa sociedade, nossa política sanitária, de saúde, enfim, esse abismo social que nos separa entre as pessoas que podem parar daquelas que precisam sair de casa para sobreviver."

(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press )
(foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press )
Nataly Sgoviah, 
de 29 anos, cabeleireira e proprietária de um salão de beleza no Centro de BH, onde mora

 “Tivemos um impacto muito grande. Terça-feira, da nossa agenda de 20 pessoas só restaram seis, todo mundo cancelou. Estou no grupo de risco, tenho problema cardiovascular e bronquite. Então, estava trabalhando de máscara. Entre as minhas funcionárias, quem tinha sintomas não vinha trabalhar. Estamos desesperados, pois o salão está em obras, temos cinco famílias que dependem diretamente do salão e muitos boletos com fornecedores que não querem negociar. Fora o valor alto do aluguel que teremos que pagar sem estar funcionando. Isso leva a gente a pensar que podemos correr o risco de quebrar. Mas vamos respeitar o decreto e fechar, pois sabemos que é um caso de saúde pública. A falta de convívio social é o que mais está incomodando. A gente não tem mais como sair, encontrar os amigos. É um isolamento que pode afetar até a saúde mental de muitas pessoas.”

(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
(foto: Jair Amaral/EM/D.A Press)
Eli Felipe Martins Gonçalves, 
de 24 anos, atendente, Bairro São João Batista

 “Trabalho na assistência 24 horas de uma associação de proteção veicular. Vamos fazer uma coisa inédita para a equipe aqui da assistência, que é o home office. Está sendo feita toda a logística para trabalharmos em casa. Na minha vida pessoal, tenho mudado alguns hábitos. Não sou muito de sair, até mesmo pelo meu horário de trabalho, durante o dia fico muito dentro de casa mesmo. Mas tenho me preocupado um pouco mais. Moro com uma idosa, minha avó, então acaba que fico medo de pegar algo e transmitir para ela. Fico bastante apreensivo porque não sabemos até que ponto essa reclusão vai se estender. E depois? Como vamos saber que já está seguro? São perguntas sem respostas.” 

(foto: Arquivo pessoal)
(foto: Arquivo pessoal)
Denise Ramos Guimarães, 
de 38 anos, oficial do Ministério Público de Minas Gerais, Centro de BH

 "Paramos de trabalhar repentinamente na quarta-feira. Ainda estamos sem escala e nos falamos por WhatsApp para resolver as pendências, porque os processos são físicos, precisamos ir ao local de trabalho. Os gabinetes não têm janelas. Um servidor amanheceu gripado após ter trabalhado no dia anterior, e havia retornado das férias. Isso causou certo pânico. Ele está bem. Moro sozinha, num apartamento bem pequeno e parei todas as minhas atividades externas. Estou com muito medo sim, optei por deixar de ver meus pais, que são idosos, por tempo indeterminado. Tento passar o dia vendo filmes ou falando com amigos. Há pessoas em situação muito pior. Mas, por solidariedade e anseio de ajudar o máximo possível, é preciso este sacrifício. Meu temor é que se espalhe e assole o Brasil, assim como aconteceu na Itália.

(foto: Beto Eterovick/Divulgação)
(foto: Beto Eterovick/Divulgação)
Wiver Adair Machado Filho,
de 30 anos, cinigrafista, Região de BH  

"Nosso mercado está sendo muito impactado pela pandemia. Pelo menos 90% do tempo estamos em contato com o público, seja na cobertura de eventos, em uma gravação em estúdio, ou numa produção publicitária. Mas principalmente nos eventos é onde temos perdido muito. Tive vários contratos cancelados ou remarcados, basicamente toda a agenda de abril e maio. Sem execução, você fica sem a renda que já estava tranquilo que entraria naquele mês. E a gente nem pode culpar o cliente, aplicar multa de contrato ou qualquer coisa assim, todo mundo está flexibilizando. É o mínimo que todos podem fazer em sensibilidade à situação. A alternativa que muitos estão fazendo é aproveitar a quarentena para focar no trabalho de pós-produção (edição).Com as gravações canceladas ou remarcadas, saímos de casa somente para o básico ou indispensável mesmo e fizemos compras de abastecimento para tentar manter pelo menos a rotina de trabalho home office." (Colaborou Gustavo Werneck)


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