Coronavírus muda rotina nos asilos e isola ainda mais os internos, agora para o bem deles
Acostumados a apelar por visitas aos idosos, instituições de longa permanência invertem o pedido: ordem é evitar idas às instituições, que abrigam cerca de 100 mil brasileiros
Por Luiz Ribeiro
23/03/2020 06:00 - Atualizado em 23/03/2020 09:39
Dona Augusta (nome fictício), de 80 anos, passa a maior parte do tempo em um banco de um asilo em Montes Claros. Sem receber visitas de parentes há cinco anos, é com a atenção de grupos de jovens voluntários e religiosos que ela tem contado por todo esse tempo para quebrar a rotina e se alegrar um pouco. Agora, o isolamento social – o mesmo de milhares de idosos que vivem em asilos e abrigos ou até nas próprias em casas – se aprofunda. Se antes as campanhas das entidades assistenciais eram para que as pessoas visitassem os acolhidos pelas instituições de longa permanência para idosos (ILPIs), agora, o esforço é justamente o contrário: as idas aos asilos são desaconselhadas, na tentativa de manter o vírus afastado de quem passou – a maioria há muito tempo – dos 60 anos, grupo mais susceptível à COVID-19.
A medida, que visa à proteção da saúde, atinge um contingente expressivo de pessoas que vivem nessas instituições. De acordo com os últimos números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), divulgados em 2018, em torno de 100 mil idosos moram em asilos e abrigos no Brasil, dos quais 60 mil em instituições públicas e filantrópicas. O isolamento se aprofunda agora. Não receber visitas ou reduzi-las ao mínimo necessário, entretanto, é essencial nesse momento.
“É um sacrifício, mas pelo bem comum e exercício da cidadania”, observa a geriatra Luciana Colares. A Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) fez uma série de recomendações para a prevenção do coronavírus entre os indivíduos acolhidos em asilos e outras instituições de longa permanência, considerando que eles representam “grupo de alto risco para complicações pelo vírus, uma vez que tendem a ser mais frágeis”, informa a médica.
Entre essas recomendações estão: deve-se evitar visitas, saídas da instituição e atividades em grupo, além de redobrar os cuidados com a higiene. Nesse último ponto, a atenção precisa ser redobrada também para cuidadores, enfermeiros e outros funcionários que lidam com os idosos. “Os profissionais de saúde que atendem a esse público devem ter cuidado extra nas medidas de higiene”, destaca Luciana.
Na instituição onde dona Augusta mora, o Asilo São Vicente de Paulo/Betânia Lar dos Velhinhos, em Montes Claros, no Norte de Minas, as medidas preventivas já foram adotadas e mudaram completamente a rotina da casa. Desde a última segunda-feira, todas as visitas coletivas à instituição foram suspensas. Cada interno só pode receber uma pessoa por semana – e o visitante precisa estar assintomático e não ter viajado para localidades onde há casos confirmados da COVID-19. A restrição das visitas a asilos e casas terapêuticas está entre as medidas preventivas adotadas por meio de decreto pelo prefeito da cidade, Humberto Souto (Cidadania), para evitar a propagação do coronavírus.
Só no Asilo São Vicente de Paulo, são 121 internos – 77 homens e 44 mulheres. Nos cálculos do coordenador de Cuidados em Saúde da instituição, Marco Túlio Miranda Araújo, 80% deles foram “esquecidos” há anos por seus parentes e vinham recebendo apenas as visitas de religiosos e voluntários, agora suspensas. A esse grupo, se juntavam profissionais de saúde e estudantes de cursos da área – como medicina, enfermagem, nutrição e psicologia –, atuando como estagiários ou participando de ações ligadas à terceira idade.
Em média, eram 150 pessoas circulando por dia na instituição, além dos idosos. “Agora, os próprios internos estão observando que está tudo parado”, afirma Túlio Miranda. Os idosos só podem sair agora para atendimento médico, em caso de emergência, explica. Apesar das medidas, as preocupações persistem. Administrar o estoque de álcool em gel e máscaras cirúrgicas e o temor de que esses suprimentos faltem é uma delas. “Precisamos do apoio da sociedade. Estamos assustados”, afirma.
Baixa imunidade, alto risco
Os idosos são mais susceptíveis às complicações da COVID-19. Mas por quê? Quem responde é a infectologista Cláudia Rocha Biscotto, professora da Faculdade de Medicina da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes): “Na faixa etária acima dos 60 anos, a imunidade cai. Por isso, pessoas desse grupo estão mais sujeitas à maioria das infecções respiratórias, principalmente virais”.
Na pandemia de COVID-19, provocada pelo novo coronavírus, os números de óbitos entre os idosos são alarmantes. “Nesta pandemia vemos, em todas as estatísticas e noticiários, que a maioria absoluta dos óbitos é de idosos, pela baixa imunidade e pelas comorbidades, as doenças simultâneas, que geralmente acometem esses indivíduos”, observa a especialista. Pressão alta, diabetes, cardiopatias, câncer, doenças autoimunes. Tudo isso aumenta o risco.
Ela comenta a situação dos idosos que estão sendo forçados a se isolar ainda mais, especialmente aqueles que vivem em asilos e, muitas vezes, já não recebem muitas visitas. “Esse isolamento social é bastante preocupante. Mas, infelizmente, é a forma mais eficaz de impedir que o vírus se espalhe em instituições de longa permanência de idosos”, avalia Cláudia Biscotto.
Etiqueta
A infectologista destaca que, nesse grupo, devem ser reforçadas as medidas de prevenção, como a lavagem mais frequente das mãos, o uso do álcool em gel e a “etiqueta respiratória”, ou seja, cobrir a boca e nariz, de preferência com o cotovelo, ao espirrar ou tossir. Enfatiza ainda que deve ser evitado o compartilhamento de utensílios como copos, pratos e talheres, sendo preferencial o uso de materiais descartáveis.
Números
100 mil
idosos vivem em asilos e abrigos no Brasil, segundo dados do IBGE
60 mil
moram em instituições públicas ou filantrópicas
O que é o Coronavírus?
Coronavírus são uma grande família de vírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do coronavírus (Covid-19) foi descoberto em dezembro de 2019, na China. A doença pode causar infecções com sintomas semelhantes aos resfriados ou gripes leves.
Como o Covid-19 é transmitido?
A transmissão dos coronavírus costuma ocorrer pelo ar ou por contato pessoal com secreções contaminadas, como gotículas de saliva, espirro, tosse, catarro, contato pessoal próximo, como toque ou aperto de mão, contato com objetos ou superfícies contaminadas, seguido de contato com a boca, nariz ou olhos.
Como se prevenir?
A recomendação é evitar aglomerações, ficar longe de quem apresenta sintomas de infecção respiratória, lavar as mãos com frequência, tossir com o antebraço em frente à boca e frequentemente fazer o uso de álcool em gel após ter contato com superfícies e pessoas. Em casa, tome cuidados extras contra o Covid-19.
Quais os sintomas do Coronavírus?
Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pelo Covid-19:
Febre
Tosse
Falta de ar e dificuldade para respirar
Problemas gástricos
Diarréia
Em casos graves, as vítimas apresentam:
Pneumonia
Síndrome respiratória aguda severa
Insuficiência renal
Mitos e verdades sobre o vírus
Nas redes sociais, a propagação do Covid-19 espalhou também boatos sobre como o coronavírus é transmitido. E outras dúvidas foram surgindo: