O protocolo elaborado pelo governo de Minas para retomada gradual das atividades econômicas dos municípios - o Programa Minas Consciente - precisa rever lacunas, como o planejamento da testagem da população e o intervalo de reavaliação das decisões tomadas ao longo da execução do projeto, fixado em 14 dias. A conclusão é de um relatório produzido Comitê Permanente de Acompanhamento das Ações de Prevenção e Enfrentamento do Novo Coronavírus da UFMG.
Apresentado na manhã desta quarta-feira (29) na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) pela presidente do comitê, Cristina Alvim, o documento avalia que os principais indicadores utilizados pelo estado para acompanhar a evolução da pandemia de coronavírus - incidência da Síndrome Respiratória Aguda Grave (SARS) e volume de hospitalizações - são insuficientes para garantir a segurança das medidas de flexibilização do isolamento social.
Durante a reunião remota, que contou com a participação do Secretário de Estado de Saúde de Minas Gerais, Carlos Eduardo Amaral, a professora da Faculdade de Medicina da UFMG comparou os dados com a "ponta de um iceberg", que precisa ser analisado com metodologias adequadas de testes, capazes de localizar a direção da surto em Minas.
Do contrário, estudos matemáticos feitos pela universidade apontam que eventuais mudanças na taxa de transmissão do vírus provocadas pelo relaxamento podem multiplicar por dez o número de infecções pela COVID-19, sem que haja aumento da demanda por leitos. Quando as autoridades notarem os efeitos dessa propagação em ocupação de vagas de UTI, alerta Cristina, pode não haver mais tempo para evitar o colapso do sistema de saúde.
Do contrário, estudos matemáticos feitos pela universidade apontam que eventuais mudanças na taxa de transmissão do vírus provocadas pelo relaxamento podem multiplicar por dez o número de infecções pela COVID-19, sem que haja aumento da demanda por leitos. Quando as autoridades notarem os efeitos dessa propagação em ocupação de vagas de UTI, alerta Cristina, pode não haver mais tempo para evitar o colapso do sistema de saúde.
“A doença tem transmissão rápida, mas a evolução é lenta. Nós temos 14 dias de incubação, dois dias de transmissão ainda assintomática, uma semana de síndrome gripal e, em média, até duas semanas de internação hospitalar. Isso faz com que a doença seja lenta. E se nós não detectamos precocemente a transmissão, quando notarmos o efeito da doença na ocupação de leitos hospitalares, já haverá um enorme número de pessoas infectadas”, explica a médica.
Com base na análise de dados divulgados pela SES-MG, a representante da UFMG afirmou que o estado testa, efetivamente, menos de 10% das notificações de possíveis casos de coronavírus. A amostra, portanto, não seria representativa da real expansão da pandemia, logo, pouco segura para sustentar a reativação da economia.
“Não é necessário testar 100% das pessoas, mas, sim, ter um planejamento para que a amostragem das pessoas testadas seja representativa do todo. Para isso, existem recursos de modelagem matemática muito avançados - que é o que está sendo utilizado em muitos países, inclusive na Alemanha”, ponderou.
Outra preocupação demonstrada por Cristina Alvim diz respeito ao intervalo de 14 dias proposto pelo Programa Minas Consciente para avaliar a necessidade de recuo ou avanço de cada uma das etapas do projeto.
“O curto período de 15 dias é suficiente para esgotar o sistema de saúde. A tomada de decisão há 14 dias pode ser problemática. O intervalo mais recomendado seria da ordem de 7 ou 8 dias, justamente por causa da velocidade de transmissão da doença”, destacou.
"Volto a insistir que nós não temos testes suficientes para garantir a segurança de medidas de abertura e flexibilização. Nós somos o país da América Latina com menor número de testes por milhão de habitante. Temos, sim, uma capacidade de ampliar a realização desses testes. Isso tem um custo de efetividade muito superior a de leitos de UTI. Temos de pensar um planejamento da testagem", reforçou.
Retomada do controle
O secretário de Saúde, Carlos Eduardo Amaral, defendeu que o programa Minas Consciente não “flexibiliza” o isolamento social, mas orienta, de forma segura, um movimento que já ocorre no estado - metade das 853 cidades mineiras já teria reaberto seus comércios de forma total ou parcial.
“Nós não temos que 'flexibilizar', eu não gosto dessa palavra. Nós temos é que coordenar e orientar. Porque o 'flexibilizar' já foi feito em muitos municípios. O estado está querendo trazer, novamente, algum controle, alguma orientação. Porque nós precisamos de mais dados, mais ciência, mais tempo mesmo para vir tomando as decisões. Em algumas cidades, nós vimos que já houve uma flexibilização muito grande, e isso pode ter, num futuro breve, um impacto no sistema de saúde”, argumentou.
Quanto à necessidade de ampliação da testagem da população, Amaral admitiu que, nesse momento, Minas tem pouco acesso ao testes e ponderou a baixa precisão dos que, hoje, são fornecidos pelo Ministério da Saúde. Segundo Amaral, os métodos disponibilizados atualmente são do tipo IgG e IgM, que detectam a presença dos anticorpos que o paciente supostamente infectado desenvolveu para combater o vírus da COVID-19.
"A eficiência desses testes, nós temos até 60% de positividade, ou seja 40% de negatividade. Isso é complexo, porque, imaginem: se eu tenho dez cachorros vindo me morder e eu prendo seis, ainda deixo quatro soltos. Eu ainda vou tomar mordida. De qualquer forma, testar mais ainda é melhor que testar menos. Mas nós temos que tomar um pouco de cuidado com o que nós vamos valorizar nesses testes", disse.
Ainda de acordo com Amaral, esse exames terão relevância fundamental na retomada da força de trabalho sobretudo da área de saúde, pois mostram quem já está imune ao vírus. “E nesse momento, nós temos que pensar em força de recomposição de trabalho de profissionais da saúde. São eles que estão sendo mais expostos, por conta da natureza do trabalho", afirmou.