Os casos de COVID-19 em Minas Gerais estão mais concentrados em áreas mais ricas do estado, a Região Metropolitana de Belo Horizonte, Triângulo, Zona da Mata e o Sul/Sudeste. Na outra ponta, está o Vale do Jequitinhonha, a área mineira mais pobre. O mapeamento da doença é revelado em estudo desenvolvido por um grupo de alunos e professores do curso de bacharelado de geografia da Universidade Estadual de Montes Claros (Unimontes), que correlaciona a rapidez de disseminação da doença ao dinamismo econômico e à densidade populacional das regiões afetadas primeiro, mas chama a atenção para o risco desse avanço na direção de áreas onde a população tem capacidade reduzida de se proteger, devido às deficiências do saneamento básico, e de buscar atendimento médico adequado. De acordo com dados da Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais divulgados ontem, a velocidade de disseminação do coronavírus subiu na última semana, saindo de uma taxa de 1,27 na quarta-feira para 1,42. Isso significa que 10 pessoas doentes contaminam outras 14. Até a manhã de ontem, boletim da SES apontava 10.464 casos e 278 mortes pela doença em Minas.
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Nas demais regiões, os números de casos confirmados até 31 de maio são: Norte de Minas, 250 (2,5%), Vale do Mucuri, 249 (2,5%); Central, 230 (2,35), Noroeste, 137 (1,4%) e, por último, o Vale do Jequitinhonha, com 96 casos (1%).
A Região Metropolitana de BH também está no alto do ranking números de mortes pela doença, seguida da Zona da Mata, Triângulo/Alto Paranaíba e Sul/Sudeste. Na outra extremidade, o Vale do Jequitinhonha “divide” posição com o Noroeste do estado.
Segundo o estudo do curso de Geografia da Unimontes, até domingo, o total de mortes nessa região, 90, representava 33,8% dos óbitos do estado pela COVID-10, tendo, na sequência: Zona da Mata, 57 mortes (21,4%); Triângulo/Alto Paranaíba, 36 (13,5%); Sul/Sudeste, 31 (11,7%); Vale do Rio Doce, 14 (4,5%), Norte de Minas, nove (3,4%), Campo das Vertentes, sete (2,6%). No Oeste de Minas havia seis mortes (2,3%), no Noroeste duas (0,75%) e no Vale do Jequitinhonha, duas (0,75%).
O professor Gustavo Cipolini, coordenador do curso de Geografia da Unimontes, acredita que a elevada densidade demográfica seja fator preponderante para que as regiões mais desenvolvidas estejam liderando os casos da COVID-19 em Minas até agora. “A relação entre o dinamismo econômico e a flexibilização do isolamento também vem influenciando no aumento dos registros, sobretudo, na RMBH que passa de 36% dos casos confirmados no estado. Por outro lado, ele lembra que é preciso avaliar também as subnotificações da doença no estado e levar em conta que a testagem para o coronavírus, que “é incipiente”.
Mais de 50% dos casos estão na RMBH e o Triângulo, o que ele considera “muito preocupante”. Para Cipolini, a “chegada” e a transmissão do vírus foi favorecida pela existência de um aeroporto internacional na RMBH, em Confins.
Por outro lado, o professor da Unimontes salienta que a presença da COVID-19 em regiões de baixa renda, como o Norte de Minas e o Vale do Jequitinhonha, é preocupante, uma vez que podem sofrer consequências ainda piores com a pandemia por causa de suas carências e, sobretudo, pela falta de assistência à saúde.
“A geografia mostra problemas dessas regiões como a falta de saneamento e a dificuldade de acesso à água potável. Isso pode levar à falta de higienização e gerar outros fatores de risco (para a transmissão do coronavírus)”, afirma Cipolini, que contribuiu com projeto, coordenado pela professora Iara Maria Costa Silveira, responsável pela Geografia da Saúde.
Um dos líderes do estudo, o estudante Alexon do Carmo Alves, do quarto período de Geografia da Unimontes, salienta que o levantamento revela que, de fato, as regiões mais desenvolvidas de Minas têm mais registros de pacientes com o coronavírus. Porém, é necessário ter uma análise crítica desses números. Será se essas regiões estão com uma maior quantidade de casos porque testam mais?”, questiona Alexon, que desenvolveu o trabalho junto com quatro colegas do curso da universidade estadual.
Ele lembra que as regiões desenvolvidas têm mais acesso aos serviços de saúde e, consequentemente, os registros de casos ocorrem mais rapidamente. Nesse sentido, destaca que é preciso verificar se os moradores das “regiões ricas” estão tendo mais acesso aos testes para o coronavírus do que as populações das áreas mais carentes, como o Norte de Minas e o Jequitinhonha.
Alexon concorda que há uma relação direta entre a COVID-19 e a situação das áreas de maior poder econômico. “A relação da COVID-19 com o dinamismo econômico dessas regiões está pautada na densidade demográfica, ou seja, essas regiões são dinâmicas e concentram vários setores de serviços. Isso atrai a população de várias localidades do estado, na busca por emprego, fazendo com que movimente toda uma cadeia produtiva. Essa concentração maior de população, caso não se use equipamentos de proteção (água e sabão álcool em gel e máscaras), pode também ser um fator de aumento de casos”, observa.
NORTE DE MINAS
No estudo, a partir dos dados divulgados diariamente pela SES, foi mapeada a ocorrência da COVID-19 em 89 municípios do Norte do estado. Os estudantes de Geografia da Unimontes elaboraram mapas e gráficos sobre a evolução da pandemia nos municípios da região, com a utilização de softwares de Sistemas de Informações Geográficas (SIG) com a base cartográfica do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e informações geradas pela missão SRTM (Nasa) – que são disponibilizadas pelo serviço de monitoramento por satélite da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). “Conseguimos identificar e classificar o total de casos e as porcentagens referentes a cada localidade”, explica Alexon Alves.
De acordo com o trabalho, dos 89 municípios do Norte do estado, apenas 13 tinham registros da COVID-19, com o total de 36 casos até 30 de abril. Em 31 de maio, o número de cidades afetadas aumentou para 34 e o total de casos para 250, incluindo nove mortes confirmadas na região.
“A geografia da saúde tem por finalidade o estudo da distribuição e da predominância de doenças, bem como as alterações que podem ocorrer por intervenção dos diversos fatores geográficos e antropológicos verificados nestas manifestações”, explica a professora Iara Maria Costa da Silveira, coordenadora do projeto.
“O mapa permite visualizar a espacialização crescente dos casos dentro do Norte de Minas. Poderíamos ampliar a base de dados além do que dispõe a Secretaria de Estado de Saúde, mas nem todos os municípios oferecem um acesso mais fácil às informações oficiais”, avalia o universitário Alexon Alves.