Primeiro é preciso espantar as vacas. Depois, encontrar um lugar onde tenha menos mato para conseguir improvisar um assento. Ali, no meio do pasto, no alto do morro, é onde o sinal de celular pega. Desde o início das aulas a distância em Minas, em 18 de maio, o local tem sido a nova sala de aula de Istefani Beatriz da Silva, de 16 anos, aluna do 9º ano do ensino fundamental. “É aqui que venho para falar com os professores e tirar dúvidas”, conta a estudante, filmando a pastagem onde ela vai ficar naquela manhã, com a grama ainda molhada de sereno. A adolescente acabou de ser mãe. O bebê de dois meses fica no colo da avó, enquanto ela troca áudios e faz ligações pelo Whatsapp para os professores.
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As dificuldades para continuar os estudos enquanto as aulas presenciais estão suspensas por causa da pandemia do novo coronavírus são compartilhadas por outros estudantes da região. Na escola onde Istefani estuda, apenas dois dos 46 alunos têm acesso à internet fixa. “Só um aluno que, neste período, está na casa de parentes na Bahia, e o outro que é o meu filho têm internet wifi e conseguem acompanhar as aulas on-line”, conta Paulline Alves Coelho, diretora da Escola Estadual Ramiro Sousa e Silva, na zona rural de Guarataia.
A educadora coordenou uma força-tarefa e foi de casa em casa entregar o material impresso aos alunos. “Montamos grupos de Whatsapp das séries, mas a maioria dos alunos não tem internet”.
Alunos e professores quase incomunicáveis
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Drama também na periferia de BH
Os desafios de acesso ao novo sistema de educação a distância em Minas não são só geográficos, passam pela desigualdade social. “A maioria da galera que mora em periferia está passando pela mesma situação. Não tem acesso à internet de qualidade”, diz Naiara Marques Oliveira, viúva e mãe de cinco filhos, quatro deles estudantes. “O meu filho mais velho é o único que tem celular, mas de nada adianta porque não tem internet”, conta a mãe.
A família mora num barracão de madeira, de dois cômodos, na Ocupação Terra Nossa, na Região Leste de Belo Horizonte. Artesã, Naiara está sem trabalhar desde o início da pandemia. Ela está recebendo o auxílio emergencial, porém, os R$ 600 não são suficientes para fazer a compra do mês. “Não sobra dinheiro para ficar colocando créditos em celular”, comenta. Sem contato com os professores, os filhos de Naiara estão sem estudar.
Prioridade é comer, não a internet
A maioria das 300 famílias que moram na Ocupação Terra Nossa vive em barracões de madeira. Algumas nem água encanada têm em casa e é preciso pedir aos vizinhos que têm reservatório. “Internet é o mínimo. As pessoas daqui não têm o básico. Elas lutam é para terem o arroz e o feijão para comer”, diz Danilo Santo de Oliveira, de 25 anos.
Sentado em uma cama, no cômodo que serve de sala e quarto do barracão onde mora com a mãe, ele conta a difícil realidade de quem já se acostumou a viver às margens da sociedade. “O distanciamento social sempre existiu. Não veio com a pandemia. Ela só o escancarou”, desaba o jovem.
Danilo é aluno do terceiro ano do Ensino Médio do Educação de Jovens e Adultos (EJA). Sua situação é um pouco melhor à dos colegas de sala de aula e de vizinhos da ocupação. “Como trabalhava, tenho uma renda para poder ter uma internet e para ter um celular bom. Só que a maioria da minha sala não está conseguindo pegar. Então, eu acabo desanimando também”, conta os estudante. Dos 28 alunos da sua turma, apenas oito participam do grupo que a escola criou no Whatsapp.
Para ele, a população pobre será a mais prejudicada com o sistema de educação remota, e sendo justamente esta parcela a que mais precisa do ensino público para mudar a realidade social. “Esta geração já tem, pelo menos, um ano de atraso. Nós, aqui, vamos continuar aí nessa vida de mão de obra”, desabafa.
Posicionamento do estado
Por meio de nota, a Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) disse que “a principal ferramenta e instrumento estruturante do Regime de Estudo não Presencial é o Plano de Estudo Tutorado (PET)”, que estão sendo entregue a todo os alunos. O objetivo do material é servir de apoio para os alunos utilizar juntamente com os livros didáticos. Disse ainda que as teleaulas “Se Liga na Educação” e o aplicativo são iniciativas para complementar ao processo de aprendizagem.
A SEE-MG disse que os alunos que estão com dificuldade de acessar o conteúdo não serão prejudicados. “No retorno às atividades presenciais, a rede aplicará uma avaliação diagnóstica com base nas apostilas que servirá para traçar o plano de revisão de conteúdo individualizado para cada estudante. Assim, será possível traçar estratégias de reforço escolar, por exemplo”, informou. Leia a nota na íntegra:
A Secretaria de Estado de Educação de Minas Gerais (SEE/MG) informa que a principal ferramenta e instrumento estruturante do Regime de Estudo não Presencial é o Plano de Estudo Tutorado (PET), o material de apoio para ser utilizado juntamente com os livros didáticos, sendo as teleaulas do programa “Se Liga na Educação” e o aplicativo Conexão Escola iniciativas complementares ao processo de aprendizagem.
Os PETs estão sendo entregues de forma impressa para todos os alunos que informaram não ter acesso aos meios virtuais. A logística e organização para viabilizar a entrega para esses alunos foram feitas pelos diretores das escolas, de acordo com a realidade da sua comunidade escolar, seguindo orientações da Secretaria de Saúde (SES). O acompanhamento da entrega está sendo feito nominalmente.
É importante destacar que nenhum aluno será prejudicado por dificuldades de acesso ao conteúdo digital. No retorno às atividades presenciais, a rede aplicará uma avaliação diagnóstica com base nas apostilas que servirá para traçar o plano de revisão de conteúdo individualizado para cada estudante. Assim, será possível traçar estratégias de reforço escolar, por exemplo.
A SEE/MG reforça que o Regime de Estudo não Presencial tem como objetivo apoiar os alunos da rede estadual a manter a continuidade de estudos durante o período de isolamento social, evitando assim os riscos da evasão escolar.