Jornal Estado de Minas

REABERTURA

BH um mês após reabertura: casos, mortes e ocupação de leitos disparam

Há exatamente um mês, Belo Horizonte iniciava a reabertura gradual do comércio após quase 70 dias em que apenas serviços considerados essenciais puderam funcionar. Até aquele 25 de maio, a cidade apresentava alguns dos melhores índices entre as capitais brasileiras no enfrentamento à pandemia do novo coronavírus. Porém, a reativação da economia acelerou a propagação da COVID-19, fez disparar os números de casos e mortes em decorrência da doença e sobrecarregou o sistema público de saúde.


Atualmente, BH está na segunda de quatro fases do processo de reabertura do comércio. De acordo com a prefeitura, aproximadamente 92% dos empregos estão ativos. A volta das pessoas ao trabalho já reflete de forma clara nos indicadores epidemiológicos da cidade, como já era esperado pelos especialistas que compõem o Comitê de Enfrentamento à Epidemia da COVID-19. Nessa terça-feira (23), por exemplo, o índice de isolamento social esteve em 48%, bem abaixo do patamar considerado ideal.

Os números da pandemia mais que dobraram nesse mês de flexibilização das normas de isolamento social. Em 25 de maio, o boletim da Secretaria de Estado de Saúde (SES) mostrava BH com 1.852 casos e 49 mortes. Nesta quinta-feira (25), já são 4.942 infectados (quantidade 2,6 vezes maior) e 106 óbitos (2,1 vezes maior).

Mas há outros dados que mostram com ainda mais precisão o avanço acelerado do vírus pela cidade. Os dois gráficos produzidos pelo Estado de Minas (veja abaixo) com base em dados do governo estadual mostram a média diária de novos casos e novas mortes por COVID-19. No cálculo, foram considerados apenas números dos últimos sete dias. Este método ajuda a entender melhor o momento atual de disseminação da doença e reduz possíveis distorções.


Em média, 36,4 casos novos de coronavírus foram registrados diariamente na semana que antecedeu 25 de maio, data em que o comércio começou a ser reaberto. Atualmente, esse número é de 161,9, o que representa um incremento de 344,7%. Em 8 de junho - quando a segunda fase da flexibilização se iniciou -, o valor estava em 90,3.



A média diária de mortes pós-reabertura do comércio também cresceu, mas em proporções menores. Em 25 de maio, o número estava em 1,57; em 8 de junho, caiu para 1,42; atualmente, está em 2,85 - valor 81% maior que o registrado no dia em que os serviços não essenciais voltaram a funcionar na capital mineira.



De acordo com especialistas, os reflexos epidemiológicos da reabertura do comércio não são sentidos imediatamente. Há um período de até 14 dias para que se possa ter certeza de que uma eventual aceleração propagação do vírus se deu em decorrência da flexibilização. No momento atual, já é possível ter uma segurança ainda maior na análise dos dados.


“Os 14 dias são para que haja certeza total. O período de incubação (do vírus) é de uma semana, mas as pessoas, às vezes, não procuram os hospitais no início dos sintomas. Elas podem ser internadas quando há piora, o que ocorre no começo da segunda semana. Então, considerando o número de internações, estamos falando dos pacientes que têm entre sete e dez dias de doença. As internações de hoje representam o que aconteceu, em termos de transmissão, entre 10 e 14 dias atrás”, explica o diretor da Sociedade Mineira de Infectologia, Antônio Toledo Júnior.

Sistema de saúde


Com o avanço acelerado do vírus, o sistema público de saúde viu a demanda por internações crescer consideravelmente. No dia em que a PBH decidiu iniciar a reabertura, os dados mais recentes até então mostravam que 40% das UTIs e 34% dos leitos clínicos exclusivos para COVID-19 estavam ocupados.

Segundo os critérios pré-estabelecidos pelos especialistas do Comitê de Enfrentamento à Epidemia da COVID-19, os índices da época se enquadraram na gradação verde de atenção. É o nível mais positivo de uma escala que ainda tem as cores amarela (intermediário) e vermelha (alerta máximo).


No entanto, a situação mudou bastante ao longo do mês de reabertura do comércio. Segundo boletim epidemiológico divulgado nesta quinta-feira - que se baseia em dados do dia anterior -, as taxas de ocupação de UTIs e leitos de enfermaria específicos para pacientes com COVID-19 estavam em 85% e 69%, respectivamente.

De acordo com os parâmetros do comitê, o índice das UTIs está no nível vermelho (acima de 70%), enquanto o dos leitos de enfermaria se enquadra no amarelo (entre 50% e 70%).

Nos últimos dias, a prefeitura tem aumentado a capacidade hospitalar, com o objetivo de suprir a demanda crescente. A ação também ajuda a reduzir as taxas de ocupação e, consequentemente, controlar melhor esses indicadores, que são fundamentais para manter o processo de reabertura do comércio. De terça para quarta, por exemplo, foram adicionados 19 leitos de enfermaria e 15 UTIs ao SUS da capital.

Lockdown à vista?


A piora nos indicadores epidemiológicos e estruturais tem preocupado as autoridades públicas, que estudam a possibilidade de endurecer as regras de isolamento social em BH e retroceder no processo de reabertura do comércio. Ao longo da semana, o prefeito Alexandre Kalil (PSD) voltou a cogitar a possibilidade de decretar lockdown (bloqueio total) na cidade.


O chefe do Executivo municipal anunciará nesta sexta-feira (26), em entrevista coletiva marcada para 14h, se a reabertura do comércio dará mais um passo à frente, se ficará estacionada ou regredirá. No processo de decisão, Kalil e o comitê avaliam três parâmetros principais: número médio de transmissão por infectado (Rt), ocupação de UTIs e ocupação de leitos de enfermaria. Há ainda dois indicadores auxiliares: o ‘índice de isolamento social’ e a ‘projeção do número de casos de COVID-19 segundo cenários de contágio’.