Um desabafo do diretor técnico de um hospital em Minas Gerais se alastra pelas redes sociais desde o início da semana, chamando a atenção pelas palavras duras e previsões sombrias dirigidas pelo médico à população do município. Com base no apelo, convocamos o cartunista Quinho e ele desenhou, para quem ainda não entendeu como o coronavírus pode colapsar estrutura de saúde e ameaçar a todos. Veja os quadrinhos e vídeo explicativo #praentender abaixo.
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“A nossa estrutura hospitalar não aguenta a balbúrdia social que está na nossa cidade. Pelo amor de Deus, revejam os conceitos, freiem essa cidade, porque nós não vamos ter condição de atendê-los se assim continuar”, afirma o médico, durante declaração gravada em vídeo.
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O hospital que ele dirige funciona em parceria com a Prefeitura de Manhuaçu, que cedeu os respiradores para que a unidade montasse leitos de UTI. São 10 estruturas do tipo e outras 23 de enfermaria, disponíveis há quase três meses, segundo a administração municipal.
Vídeo: só o lockdown freia a curva de contaminação do coronavírus?
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Até terça-feira, 100% dos leitos para pacientes mais graves estavam ocupados. Na quarta, um paciente recebeu alta e outro faleceu. Com isso, duas unidades de terapia intensiva ficaram liberadas. Pouco, para uma cidade que em 90 dias foi do primeiro infectado pelo coronavírus à beira do colapso no sistema de saúde, inclusive com médicos infectados e um deles já internado em UTI.
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Em entrevista ao Estado de Minas, o diretor detalhou os desafios da unidade de saúde, diante da pandemia e do que considera descontrole na postura de cidadãos e comerciantes locais.
Os alertas parecem começar a surtir efeito: o hospital recebeu, na sexta-feira, respiradores enviados pelo governo de Minas para ampliar a oferta de leitos, mas ainda aguarda monitores multiparâmetros.
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Também trabalha com a possibilidade de colocar em funcionamento mais leitos de enfermaria. Mas mesmo assim, ele suplica pela colaboração da população.
“Fomos à prefeitura na última segunda-feira para fazer um apelo para o conselho gestor de crise tentar dar uma freada na cidade, porque está havendo um abuso da população, que parece que não entendeu a gravidade da situação do estado. Alertei aos gestores e à população que um terço dos óbitos do estado ocorreu nos últimos 10 dias, o que mostra a agressividade da crise. O não uso de máscara e as aglomerações fizeram o número crescer”, contou Luís.
‘BALBÚRDIA’ A resposta da prefeitura veio no dia seguinte, com o fechamento do comércio não essencial na cidade. Com a medida, o diretor do Hospital César Leite acredita que poderá ganhar fôlego para aumentar a oferta de leitos na unidade, evitando o temido colapso.
“Temos notícias de que em sítios, residências e condomínios ocorrem aglomerações, festas, churrascos... Nosso comércio estava funcionando até o último final de semana em condições totalmente normais. O pessoal com dinheiro no bolso sai às compras de forma totalmente inadmissível, sem máscaras nos supermercados, porta de farmácias, casas lotéricas e bancos. Foi o que eu chamei de balbúrdia social. É o que está acontecendo na cidade.”
“Temos notícias de que em sítios, residências e condomínios ocorrem aglomerações, festas, churrascos... Nosso comércio estava funcionando até o último final de semana em condições totalmente normais. O pessoal com dinheiro no bolso sai às compras de forma totalmente inadmissível, sem máscaras nos supermercados, porta de farmácias, casas lotéricas e bancos. Foi o que eu chamei de balbúrdia social. É o que está acontecendo na cidade.”
Até quinta-feira, Manhuaçu registrava 161 casos confirmados, cinco óbitos e investigava 138 ocorrências entre pacientes e óbitos suspeitos. Em 10 dias, entre 29 de maio e 8 de junho, houve uma primeira disparada de casos, com salto de 25 para 51 pessoas com COVID-19. Entre 9 e 18 de junho, o número de ocorrências dobrou para 100, o que acendeu o sinal de alerta no município.
Confira abaixo trechos da entrevista que o diretor concedeu ao Estado de Minas, pedindo, entre outras coisas, que autoridades estaduais reforcem a conscientização entre os cidadãos sobre a gravidade da crise.
Entrevista / Luís Cláudio Mendes do Valle, diretor técnico do Hospital César Leite, referência para COVID-19 em Manhuaçu e região
Quando o Hospital César Leite recebeu o primeiro paciente com COVID-19 e quantos leitos estão ocupados atualmente?
Logo nos primeiros dias já internamos pacientes de enfermaria. Ontem (terça-feira) estávamos com 100% de ocupação. Hoje (quarta) tivemos uma alta e um óbito foi dado ontem, ou seja, estamos com oito de 10 leitos ocupados.
Se o índice de contágio se mantiver, em quanto tempo o senhor acredita que haverá colapso?
Fomos à prefeitura na última segunda-feira para fazer um apelo ao conselho gestor de crise para tentar dar uma freada na cidade, porque está havendo um abuso da população, que parece que não entendeu a gravidade da situação. Agora com o fechamento do comércio que foi instituído na quarta-feira, com apenas atividades essenciais funcionando, acredito que, sim, podemos conter os números e controlar a crise. Com aumento de leitos e evitando um colapso que não queremos que aconteça.
Sobre as aglomerações, o senhor acredita que o discurso do governo federal pode ajudar nesse tipo de situação?
Prefiro me ausentar em qualquer comentário político. Acredito que a politização dessa crise dificulta o trabalho das pessoas que estão em linha de frente. Prefiro encarar a realidade do nosso município e ir à frente e dar a cara a tapa, mostrar como a situação está de verdade. Mas gostaria de usar esse espaço para fazer um apelo aos gestores estaduais, para que coloquem a população a par da crise. Mostrem que estamos diante do olho do furacão. E a crise vai crescer. Somos uma cidade com poderio econômico, movido pelas safras de café, o que faz com que as pessoas venham gastar aqui. Se não entendermos que estamos em meio a uma pandemia, temo que não teremos leitos suficientes para atender a toda a região. Faço um apelo aos gestores: não tapem o Sol com a peneira, falando que está tudo bem, porque não está. Nos bastidores da crise, dentro dos hospitais, está ficando caótico.
O senhor ficou sabendo de algum tipo de aglomeração, além do comércio?
Tem notícias de que na região, em sítios, residências e condomínios, ocorrem aglomerações, festas, churrascos… Nosso comércio estava funcionando até o último final de semana em condições totalmente normais. O pessoal com dinheiro no bolso sai às compras de forma totalmente inadmissível. Sem máscaras nos supermercados, em portas de farmácias, casas lotéricas e bancos. Foi o que eu chamei na prefeitura de balbúrdia social. É o que está acontecendo na nossa cidade.
O senhor citou que alguns médicos já foram contaminados. De quantos aproximadamente se tem conhecimento?
O médico do hospital era assintomático, já está curado e trabalhando. Outro assintomático foi tratado há cerca de 20 dias. Há um colega médico no CTI, da cidade vizinha (Manhumirim). Três técnicos de enfermagem também se contaminaram. Já fizeram a quarentena e voltaram aos trabalhos, mas tem uma gerente do hospital que está afastada. Estamos tomando todos os cuidados possíveis. Na unidade exclusiva de COVID-19, que é isolada, não houve contaminações.
Caso o sistema de saúde de Manhuaçu entre em colapso, qual é o plano B da cidade?
O estado tem uma rede baseada em regionais. Então, temos o suporte da região de Carangola, da região de Ponte Nova e temos apoio de Viçosa. Inclusive, quando ainda precisávamos montar os leitos, a cidade de Carangola foi que nos ajudou. Mas o mais importante é falar sobre a conscientização da população, para que fique em casa. Para termos tempo de ampliar os leitos no Hospital César Leite. Nosso hospital tem a capacidade de operar milagres, porque durante a crise de febre amarela foi um modelo para o estado e para o Brasil. Eu acredito e penso positivamente que vamos vencer essa luta contra a COVID-19, desde que tenhamos a operação dos gestores federais, estaduais e municipais. Principalmente, se nossa população ficar em casa e evitar aglomerações.
O estado tem uma rede baseada em regionais. Então, temos o suporte da região de Carangola, da região de Ponte Nova e temos apoio de Viçosa. Inclusive, quando ainda precisávamos montar os leitos, a cidade de Carangola foi que nos ajudou. Mas o mais importante é falar sobre a conscientização da população, para que fique em casa. Para termos tempo de ampliar os leitos no Hospital César Leite. Nosso hospital tem a capacidade de operar milagres, porque durante a crise de febre amarela foi um modelo para o estado e para o Brasil. Eu acredito e penso positivamente que vamos vencer essa luta contra a COVID-19, desde que tenhamos a operação dos gestores federais, estaduais e municipais. Principalmente, se nossa população ficar em casa e evitar aglomerações.
Infelizmente, uma parcela da população ainda duvida da gravidade da COVID-19. Qual é o recado que quem está na linha de frente dá a essas pessoas?
Pediria para população: nos dê tempo. Só assim conseguiremos fazer a coisa no tempo certo e ajudar a cidade. Se a população de Manhuaçu e dos municípios vizinhos não se cuidar, não ficar em casa, infelizmente entraremos em colapso nas próximas semanas. Peço encarecidamente: fiquem em casa e nos ajudem com orações e preces. Principalmente, cuidem de vocês mesmos. Evite aglomerações e evitem sair de casa para dar tempo da rotatividade de leitos.