As dimensões da tragédia das mortes provocadas pelo novo coronavírus no Brasil assustam quando comparadas a estatísticas mais próximas do cotidiano, de uma realidade bem conhecida da população. Ontem, os óbitos registrados em todo o país alcançaram 61.990, número que seria suficiente para lotar o Estádio Governador Magalhães Pinto, o Mineirão, em Belo Horizonte. O conhecido Gigante da Pampulha comporta 61.927 torcedores assentados.
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Quando a análise é feita com base no boletim epidemiológico do Ministério da Saúde, a triste constatação é também observada: são 61.884 óbitos, que equivalem à quase toda a lotação do Mineirão. Com mais 1.252 mortes registrados ontem, o país teve o terceiro dia da semana acima da casa das mil vítimas diárias – 1.280 na terça-feira, e 1.038 na quarta-feira.
Foram contabilizados mais 48.105 casos confirmados de infecções por COVID-19 nos 26 estados e no Distrito Federal em 24 horas. Esse número só fica atrás das 54.771 confirmações registradas pelo ministério no boletim de 19 de junho. Ao todo, o Brasil tem registros de 1.496.858 de pessoas contaminadas.
O coronavírus fez sua primeira vítima no Brasil em 12 de março e, desde então, a escalada de óbitos só aumenta. Os números podem ser superiores aos balanços oficiais, diante dos indícios de subnotificações, como o aumento do número de registros de óbitos e de internações por síndromes respiratórias, elevação do fluxo de enterros em algumas cidades (como São Paulo e Manaus), entre outros.
Em Minas, os índices mais baixos de doentes e mortos pela COVID-19 estão defasados pelo grande volume de diagnósticos pendentes. Por meio da compilação de bases de dados oficiais, reportagem do Estado de Minas identificou, em maio, que o volume de resultados ‘a confirmar’ no estado era um dos maiores do Brasil.
Segundo Rodrigo Zeidan, autor e professor de economia e finanças da New York University Shanghai e da Fundação Dom Cabral, as trágicas estatísticas da pandemia no Brasil são resultado de ações e omissões equivocadas do Governo Federal na gestão da crise.
“Basicamente, o único governo responsável por isso no ponto de vista geral. Como o governo abdicou da responsabilidade de tomar decisões sobre a COVID-19, passou a ser responsabilidade dos estados e municípios fazer o que pudessem. Em qualquer lugar do mundo, principalmente para país grande, as respostas foram coordenadas pelo governo federal”, afirma. O especialista lembrou que o raciocínio vale para a Alemanha, um país tão descentralizado quanto o nosso, para a China, Estados Unidos e Inglaterra.
“Os países em que os governos federais resolveram sair pela tangente ou não encarar a pandemia estão sofrendo mais. Independentemente do que pode fazer o gestor municipal ou estadual”, disse Zeidan em entrevista ao Estado de Minas no fim de junho (https://bit.ly/2YOwbYY). A comparação do número de mortos com a capacidade do estádio Mineirão dá uma dimensão mais clara sobre a elevaçã das mortes pela COVID-19.
Pergunte a um mineiro o que lhe vem à mente quando se fala do estádio Magalhães Pinto. Uns falarão do improvável chute de pé direito de Elivélton, que de mansinho deu ao Cruzeiro o título da Libertadores de 1997. Outros certamente se lembrarão da bola viajando lentamente após a cabeçada de Léo Silva, para deixar o Atlético mais próximo do título intercontinental de 2013.
Independência
O Estádio Raimundo Sampaio, no bairro do Horto, tem capacidade para 23 mil pessoas. Em 25 de maio, pouco mais de um mês após a primeira morte causada pela COVID-19 no Brasil, o número de óbitos contabilizados – 23.473 – já superava a quantidade de lugares do estádio Independência.
A capacidade do estádio do Horto é semelhante à do anel inferior do Mineirão: 23.192. A triste marca de 38.735 vítimas, quantidade de pessoas possível de serem acomodadas no anel superior do Gigante da Pampulha, foi alcançada no dia 10 de junho.
Por mais que não seja agradável visualizar cada uma das cadeiras dos principais estádios da capital mineira como se fossem vidas perdidas, o desenho impactante ajuda na consciência do tamanho da tragédia causada pelo coronavírus no país.