Cercado de controvérsias desde que foi anunciado, em 24 de março, o hospital de campanha de Belo Horizonte virou caso de polícia e deve ganhar os tribunais. Nesta quinta-feira (9), o governo do estado determinou a retomada de posse do Expominas, onde o equipamento foi montado, e para isso usou forte aparato policial, incluindo membros do Batalhão de Choque da Polícia Militar, surpreendendo a empresa que tem a concessão do local até 2038 e que esperava ser melhor tratada, até por estar colaborando com as autoridades.
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A nota ressalta que o Expominas é propriedade da Codemge, órgão da administração indireta do estado, e foi cedida à empresa vencedora de licitação em 2018. “Foi levado em consideração ainda, entre outros, o fato de que o uso da área para o objetivo contratual previsto já havia sido totalmente paralisado, a partir de 18 de março de 2020, com a edição, pelo Município de Belo Horizonte, de decretos que suspendem as atividades de shows, exposições e outros eventos para os quais era destinada a área do Expominas, inclusive com requerimento da própria empresa cessionária para a suspensão das obrigações contratuais em razão da pandemia.”
A Nutribom Empreendimentos Ltda, no entanto, se sente desrespeitada. Afinal, diz ter atendido todas as demandas do governo desde que o local foi escolhido para reforçar o tratamento de pacientes infectados pelo novo coronavírus.
“Fomos surpreendidos pela pandemia, como todos no mundo, e logo nos dispusemos a ajudar, recebendo o hospital de campanha de braços abertos. Desde 26/3, quando foi feita a vistoria do local, mobilizamos funcionários e também o pessoal terceirizado, pois era uma novidade que precisava ser enfrentada. Tivemos ótimo retorno da Secretaria de Estado do Planejamento e Gestão (Seplag-MG), da Secretaria de Estado da Saúde (SES-MG), da Polícia Militar (PM). Não foi montado nada tão bom no Brasil. Entendemos que, pela urgência, a questão contratual poderia andar em paralelo com a montagem. Mas isso não ocorreu. Tentamos todas as negociações, mas não obtivemos sucesso. Agora, no último minuto antes da abertura, buscamos uma garantia mínima não só para nós, mas para nossos contratados, e fomos surpreendidos com a requisição do equipamento”, argumenta Márcia Ribeiro, diretora de Negócios e Marketing da empresa concessionária.
Conhecedora da legislação, inclusive no que se refere às prerrogativas do estado em caso de guerra ou epidemia, ela questiona o fato de ter havido o que considera uma mudança no comportamento das autoridades estaduais, às quais acusa de intransigência. “Ficamos entristecidos principalmente por ser um governo (de Romeu Zema, do Novo) que se elegeu prometendo um estado leve, democrático e que iria apoiar a iniciativa privada”, diz a diretora, que lamenta que “empresários dispostos a caminhar com este governo sejam tratados desta forma”.
Uma das reclamações foi a presença ostensiva de policiais militares na manhã desta quinta-feira. Márcia Ribeiro alega que funcionários tiveram a circulação cerceada e até para falar com a reportagem do lado de fora do Expominas, ela teve de ter autorização dos comandantes presentes.
Já o governo de Minas diz que, em razão da urgência da pandemia, o estado, por meio da Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão e da Polícia Militar de Minas Gerais, está adotando todas as providências para garantir o funcionamento regular do Hospital de Campanha”.
Segundo a concessionária do Expominas, desde o início da pandemia 21 eventos que ocorreriam no local foram cancelados ou adiados. A empresa diz gastar, no mínimo, R$ 1,1 milhão por mês para manter o equipamento, além de ter pago R$ 92 milhões por ele, “108% de ágio sobre o preço mínimo estabelecido pelo governo”.
O hospital de campanha foi projetado com 768 leitos, quase todos de baixa complexidade. Um dos gargalos é a contratação de profissionais para geri-lo, motivo pelo qual o fgverno de Minas abriu chamamento de organizações sociais de saúde. Parte do investimento foi bancada pela iniciativa privada.
CINCO PERGUNTAS PARA...
Otto Levy, secretário de Planejamento e Gestão do Governo de Minas
Como foi a negociação para a retomada do Expominas?
A constituição diz que, quando houver interesse público, o Estado pode tomar medidas para que esse interesse público prevaleça. No final, quando o hospital for desmontado, o espaço será retornado à Codemge e ela pode discutir o ressarcimento dos custos que a concessionária tenha tido durante esse período. Não estamos despropriando ninguém. Como não chegou a acordo até esse momento e que as vidas valem mais que o interesse peculiar da concessionária, o Estado resolveu tomar atitude para preservar interesse dos mineiros
Por que foi necessária a presença de muitos policiais no local hoje?
É uma operação normal da PM. Acho que tem a ver que está chegando o momento de fazer com o hospital de campanha seja operado. A Polícia Militar colocou as pessoas lá para tomar conta do espaço com a quantidade necessária".
Como será solucionado o caso?
Essa discussão vai continuar, seja de maneira concessual, ou como se resolve na democracia, ou seja na Justiça.
Foi estratégia deixar a concessionária até o último instante?
Não foi estratégia. Ficou um processo negocial. Como não se chegou a acordo, estamos tratando do interesse público. Temos um prazo para concluir essa negociação, pois precisamos colocar o hospital de campanha para funcionar. Certos empresários gostam de ganhar dinheiro, apesar de tudo, às custas de oportunidades. Neste momento, o interesse público deve prevalecer. Para ganhar dinheiro, podem aguardar um pouco mais.
Como foi a negociação com os prestadores de serviços no hospital de campanha?
Estamos mantendo com os prestadores de serviços as mesmas condições contratuais com que eles têm com a Nutribom. Não há nenhum custo a mais. Essa era a base que a Codemge gostaria de negociar. A concessionária gostaria de ganhar em cima disso. A gente queria manter os termos com os prestadores de serviços, mas eles queriam manter um preço mais alto