Jornal Estado de Minas

O negócio que embala na crise: por que a pandemia fez disparar venda de bikes

Para driblar o sedentarismo, o perigo de se deslocar no transporte coletivo e para aliviar a mente em tempos de pandemia e de distanciamento social, consumidores de Belo Horizonte estão esgotando estoques em lojas de bicicletas e acessórios, e lidando com essas três variáveis do momento de uma só maneira: sobre duas rodas. Enquanto a maioria dos setores da economia amarga um período de recessão sem precedentes, profissionais do segmento afirmam não estar dando conta de atender à enorme demanda do período.





 

Ajudam a impulsionar os negócios, além da ansiedade por passar muito tempo em casa, o decreto municipal que fechou o comércio não essencial, incluindo academias de ginástica, e determinou regras no transporte coletivo que acabam tornando o serviço mais difícil em horários de pico. Se pedalar virou para muitos sinônimo de tentar se desviar dessses e outros problemas, bom para lojas como a Ciclovia Bicicletas, no Bairro Caiçara, Região Noroeste, uma das pioneiras na cidade, em atividade desde 1976.

 

Marcos Vargas, que administra o negócio de família e está há 44 anos no mercado, avalia que a alta do segmento não deve ser momentânea. “Vai perdurar por um tempo, pois as pessoas estão receosas com as aglomerações. A gente percebe isso nas falas dos clientes. Por outro lado, as academias vão ficar prejudicadas até que a confiança do cliente volte”, analisa. Ele reforça as situações que dão impulso à alta: pessoas impedidas de malhar como de costume, aquelas que não querem nem ouvir falar em ônibus e metrôs lotados e o tédio de permanecer longos períodos em casa. 

 

(foto: Leandro Couri/EM/D.a press)

 

 

Mas, se o aumento da demanda ajuda a afastar a preocupação de lojistas, por outro lado surgem preocupações e desafios. Com os portos fechados e/ou trabalhando com redução de pessoal, produtos importados não têm chegado às prateleiras, e fornecedores nacionais  estão pedindo até 30 dias para entrega de pedidos.





 

E mesmo o prazo dilatado não tem sido garantia de cumprimento. “Um fornecedor para quem fizemos o pagamento à vista de 300 bikes, com promessa de entregar dia 20, fez contato três dias depois da data para dizer que não conseguiria entregar a mercadoria, quitada um mês antes”, relata. A solução, segundo ele, é ter visão de mercado e aumentar a estrutura. “A procura está muito grande. Nossa demanda triplicou, e acredito que se tivéssemos uma estrutura maior, dava até para quintuplicá-la”, arrisca.

 

A falta de reposição de artigos importados, diante da dificuldade de passar pelo processo alfandegário, seria uma grande oportunidade para fornecedores nacionais, mas empresários destacam o problema que enfrentam com a entrega. Na loja Na Trilha Certa, na Savassi, Centro-Sul da capital, o gerente, Laudner Fonseca Coelho de Oliveira, conta que, além da dificuldade de repor produtos, têm faltado até itens básicos, como capacetes e luvas.

 

Ana Lúcia da Silveira comprou uma bike em maio para pedalar com o namorado. Agora, diz que ela já se incorporou à rotina (foto: Leandro Couri/EM/D.a press)

Outro reflexo da corrida atrás das bikes aparece no setor de manutenção: a oficina, afirma, está “afogada de tanto serviço”. “Hoje, o prazo para entrega de uma revisão geral é de duas semanas, sendo que o normal é de um dia para o outro”, compara. Laudner conta que, por causa da falta de muitos produtos, o cliente acaba “levando o que tem”, mesmo contrariado.





 

VIROU HÁBITO Circulando pelas ruas de BH, não é difícil localizar alguém com uma bicicleta nova adquirida na pandemia. Ana Lúcia da Silveira, de 23 anos, comprou uma mountain bike em maio para pedalar com o namorado, que já pratica há mais tempo. “A gente ia a academias. Depois nos adaptamos para a bike. Para mim, é um esporte que surgiu na pandemia e foi se incorporando à rotina, sem que eu percebesse. Meu namorado me iniciou e agora eu não saio de casa sem ela. À padaria ou ao trabalho, só vou de bicicleta.”

 

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