Os mandados de busca e apreensão cumpridos na manhã desta terça-feira (4) na sede da Backer, no Bairro Olhos D’Água, Região do Barreiro, em Belo Horizonte, foram para confiscar mais de mil fichas de produção das cervejas fabricadas pela empresa. O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) e a Polícia Civil (PC) estiveram no local para recolher os documentos.
De acordo com a promotora de Justiça de Defesa do Consumidor da área criminal, Vanessa Fusco, as fichas já haviam sido enviadas pela Backer ao Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) de forma digital, ou seja, foram escaneadas. No entanto, técnicos da pasta verificaram que houve uma ‘supressão de dados’ no envio dos documentos. O MPMG, então, viu a necessidade de ter acesso físico aos papéis, que podem ser fundamentais na solução do caso.
“O Ministério da Agricultura viu que naquelas fichas tinham algumas observações que mereciam ter análises mais aprofundadas. Em nenhum momento elas apareceram no inquérito policial. Esse foi o motivo da busca e apreensão. As fichas não foram entregues de forma física ao Mapa. Foram escaneadas. Houve uma supressão de algumas anotações. Não sabíamos se a supressão foi voluntária ou não. Se houve ou não a intenção de fazer a supressão. O MPMG precisava ter acesso físico às fichas de produção”, disse a promotora.
A análise dos documentos ficará a cargo da Polícia Civil. Nesta semana, um parecer técnico também deve ser emitido pelo Mapa, de acordo com Vanessa. A princípio, a pasta detectou uma ‘desorganização’ no processo de fabricação da Backer. Mas somente uma apreciação melhor das fichas poderá indicar o que, de fato, aconteceu.
“O Ministério da Agricultura nos mostrou que as fichas mostram uma desorganização no processo fabril. Quando se vai produzir um lote de cerveja, há uma anotação. Há diversos campos em que são colocadas as datas da adição dos ingredientes. Algumas dessas fichas chamaram a atenção do Mapa, que detectou o vazamento de glicol. Se esse vazamento se deu de forma voluntária ou involuntária. Agora vamos verificar em que momento vão influenciar nas cervejas e lotes contaminados, posteriormente ingeridos. Esse é o trabalho que a Polícia Civil vai executar, de posse dessas fichas de produção”, declarou Vanessa.
As fichas de produção ainda não estavam integradas ao inquérito que investiga a contaminação de lotes de cervejas produzidas pela Backer, mesmo depois de vários mandados de busca e apreensão na sede da empresa. Os documentos são assinados por um técnico, ainda não identificado. A possível omissão ou desorientação será analisada pela Polícia Civil, que repassará os resultados ao Ministério Público.
“Chegou a passar pela nossa cabeça a omissão. Mesmo porque a Polícia Civil esteve lá num primeiro momento. Ainda não sabemos se por má fé ou desorientação, ela (empresa) não forneceu tudo o que estava lá, no escritório, de documentos, à Polícia Civil. Não posso afirmar se houve um dolo da empresa em ocultar documentos. Mesmo porque esses documentos estavam com o Ministério da Agricultura, escaneados, de uma forma não muito cuidadosa. Algumas fichas tinham cortes que não possibilitava a leitura de alguns dados. Não sabemos se houve omissão ou manuseio inadequado no scanner. É muito prematuro afirmar se houve má fé ou desorientação por parte da empresa”, explicou Vanessa Fusco.
A promotora disse que há indícios de que a Backer já teria conhecimento do vazamento do material tóxico nas cervejas. Ainda de acordo com Fusco, a análise das fichas poderá mudar os rumos do inquérito policial contra os sócios da empresa e os técnicos responsáveis pela manutenção dos equipamentos, podendo gerar até um novo indiciamento.
"Há indícios por essa apreensão de agora que isso já era do conhecimento da empresa. Que havia vazamento desse glicol que eles colocam lá, não dizendo o tipo de glicol seria. Essa é a grande questão: até que ponto esse conhecimento vai levar a responsabilização penal”, concluiu.
O Estado de Minas procurou a Backer, mas até a publicação desta reportagem a empresa ainda não havia se posicionado.
"Há indícios por essa apreensão de agora que isso já era do conhecimento da empresa. Que havia vazamento desse glicol que eles colocam lá, não dizendo o tipo de glicol seria. Essa é a grande questão: até que ponto esse conhecimento vai levar a responsabilização penal”, concluiu.
O Estado de Minas procurou a Backer, mas até a publicação desta reportagem a empresa ainda não havia se posicionado.
Inquérito
Na conclusão do primeiro inquérito policial, em junho, a Polícia Civil confirmou 29 vítimas e mais 30 casos ainda em análise. O caso segue com o Ministério Público de Minas Gerais.
Na ocasião, Ângela Minghini Cotta, filha de Marco Aurélio Gonçalves Cotta, de 65 anos, última vítima constatada, disse ao Estado de Minas que esperava que o pai tivesse qualidade de vida em seus últimos dias.
"A investigação confirmou que existia um erro, independentemente se foi causado intencionalmente ou não, o erro aconteceu e a empresa tem que se responsabilizar por aquilo, afinal de contas ela é responsável pelo produto que coloca no mercado. O mínimo que espero deles é que o tempo que meu pai ainda estiver vivo, ele tenha qualidade de vida para estar bem", disse.
Quebra de sigilo
O Tribunal de Justiça determinou a quebra de sigilo bancário das empresas que compõem o grupo econômico da Backer em 9 de julho.
O processo investiga os danos sofridos pelas vítimas de contaminação por monoetilenoglicol e dietilenoglicol após consumo das cervejas produzidas pela Backer. A ideia é apurar possíveis manobras para ocultar o patrimônio da cervejaria, cujos donos alegam falta de recursos para arcar com o tratamento médico dos intoxicados.