Um dos assuntos mais polêmicos referentes à pandemia do novo coronavírus diz respeito aos medicamentos hidroxicloroquina e ivermectina. Por falta de evidências científicas, vários órgãos de saúde são contra o uso dessas substâncias no tratamento de COVID-19. O embate também ocorre em Betim, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), onde o prefeito adquiriu um lote de 60 mil doses de ivermectina para distribuir à população, mas encontra resistência entre os próprios servidores da área da saúde.
As cápsulas foram feitas em laboratório de manipulação e adquiridas em junho pela Prefeitura de Betim. Elas seriam distribuídas por servidores, na rede pública, amparadas pelo decreto nº 42.197, de 15 de Julho de 2020, assinado pelo prefeito Vittorio Medioli, que instituía o Programa Antiparasitário. A ivermectina é indicada para tratamento de males causados por vermes ou parasitas, como sarna, lombriga e piolho, por exemplo. Abaixo, uma imagem do decreto publicado pelo veículo oficial do Executivo em Betim (abaixo).
O diretor do Sindicato dos Farmacêuticos de Minas Gerais, Rilke Novato Públio, tomou conhecimento do decreto e se manifestou contra a distribuição. “Não há nenhum estudo que aponte surtos parasitários como estrongibidíase intestinal, lombriga ou sarnas em Betim. Essa ação é apenas um pano de fundo para se distribuir a ivermectina como tratamento da COVID-19 no município”, aponta Rilke.
Médicos e farmacêuticos do Serviço de Prevenção e Assistência a Doenças Infecciosas (Sepadi) em Betim redigiram um documento, encaminhado à prefeitura, no qual manifestaram parecer contrário ao uso da ivermectina no combate ao novo coronavírus. “Diante do exposto, os profissionais que contribuíram na construção deste documento não recomendam a utilização de ivermectina no tratamento ou profilaxia da COVID-19. Não existem evidências científicas sólidas que suportem o uso do fármaco em pacientes com formas leve, moderada ou grave da doença, tampouco com a finalidade de evitar sua instalação (uso profilático)”, diz o parecer técnico.
A médica infectologista Daiana Elias Rodrigues, que atua em Betim, diz que os profissionais foram pegos de surpresa com o decreto. “Não existe relato de epidemia dessas parasitoses no município. As políticas públicas têm que ser baseadas nas evidências científicas senão, dessa maneira, a gente corre o risco de jogar dinheiro público fora. Não justifica o uso desse medicamento neste momento, não se pode basear a medicina em hipótese”, pontua a médica. A prefeitura não quis comentar sobre o assunto. Segundo a secretaria municipal de saúde, a cidade tem 3.035 casos acumulados e, até o momento, 103 óbitos por COVID-19.
Anvisa estabelece regra
No dia 23 de julho, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) publicou uma resolução que autorizava a venda da Ivermectina apenas com o receituário médico de duas vias, com a primeira via sendo retida no estabelecimento. “O objetivo da norma é coibir a compra indiscriminada de medicamentos que têm sido amplamente divulgados como potencialmente benéficos no combate à infecção humana pelo novo coronavírus (Sars-CoV-2), embora ainda não existam estudos conclusivos sobre o uso desses fármacos para o tratamento da COVID-19.”, constava na resolução.
Na época em que a prefeitura de Betim comprou o medicamento, o prefeito Vittorio Medioli chegou a publicar em sua rede social um vídeo dizendo que iria liberar o uso da Ivermectina sob prescrição médica, primeiramente para pessoas da área da saúde, segurança pública e pessoas com mais de 60 anos, que apresentam maiores riscos de contágio do COVID-19.