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Estado de Minas COVID-19

Como as privações no isolamento podem afetar a saúde dos jovens

Falta de contato com amigos, festas, bailes de formatura e a mudança na rotina afetam as emoções e podem ser gatilhos para outros problemas


10/08/2020 06:00 - atualizado 10/08/2020 12:44

Kathleen Mendonça, de 15 anos, conta que se sente ansiosa e procura ocupar o tempo com ioga e aprendendo a tocar instrumentos(foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)
Kathleen Mendonça, de 15 anos, conta que se sente ansiosa e procura ocupar o tempo com ioga e aprendendo a tocar instrumentos (foto: Túlio Santos/EM/D.A Press)


A pandemia traz à tona vulnerabilidades. Questões emocionais são acentuadas. Acostumados ao contato social e vivenciando trocas interpessoais com intensidade, jovens experimentam os efeitos do isolamento, muitas vezes com consequências indesejadas, sob a ótica da saúde mental e também dos sentimentos. Alguns passam grande parte do tempo em casa atingidos pelo ócio, estão distantes do convívio com os amigos, dos dias na escola ao lado de colegas e professores, longe de atividades esportivas ou intelectuais complementares. Em tempo de mudanças drásticas, tantas privações podem ser gatilho para problemas mais sérios.

Entre os desequilíbrios, tem sido observada a adoção de hábitos tóxicos entre os adolescentes, que recorrem a bebida alcoólica, ansiolíticos, antidepressivos, até sem prescrição médica. São transtornos importantes, ainda mais quando se considera a adolescência, fase de formação psicológica, biológica e social.

Especialista em terapia cognitivo-comportamental, a pesquisadora e psicóloga Renata Borja encontra motivos para tais comportamentos na química cerebral. “As privações impostas aos jovens por situações adversas, como as de uma pandemia, geram frustração, tristeza, angústia, insegurança, medo, ansiedade, estresse, irritabilidade. Emoções essas que sinalizam para o cérebro a necessidade de uma ativação positiva, algo que dê prazer. O problema é utilizar estratégias mal adaptativas do sistema de recompensa, como bebida e ansiolíticos sem prescrição médica, na tentativa de ajustar as emoções.”

Kathleen Mendonça tem 15 anos. No começo da pandemia, conta que teve dificuldades em preservar o equilíbrio emocional. "Não esperava que isso fosse durar tanto tempo. Foi ficando cada vez mais sério, e bateu o desespero." A jovem revela que a produtividade para as tarefas costumeiras diminuiu e que tem experimentado sentimentos de ansiedade, tristeza, estresse, irritabilidade, insegurança e medo.

Para ela, tudo parte da preocupação com as outras pessoas e da frustração diante de uma situação que foge ao controle. "Sair do normal me fez sentir falta da rotina. Alguns dias acordo bem mal. Mas, depois de quatro meses, fui me adaptando aos poucos." Kathleen estuda em escola pública e demorou um pouco até que fossem estabelecidas as aulas on-line. Agora, começa a desenvolver outras atividades, como ioga e tocar instrumentos. Está aprendendo por conta própria ukulele, pandeiro, violino e violão.

Ana Luyza de Oliveira Cena, de 16, não se furta em dizer que é nervosa e ansiosa por natureza(foto: Tulio Santos/EM/D.A Press)
Ana Luyza de Oliveira Cena, de 16, não se furta em dizer que é nervosa e ansiosa por natureza (foto: Tulio Santos/EM/D.A Press)
Ana Luyza de Oliveira Cena, de 16, não se furta em dizer que é nervosa e ansiosa por natureza. Muitas vezes se pega em crises de choro. Quando em época normal na escola, diz que é mais fácil se organizar com os estudos. Agora, sente falta dos amigos, dos colegas e professores, para tirar dúvidas e se orientar – não se dá tão bem com as aulas remotas. "Para mim, é muito difícil não ter esse contato próximo. Antes conseguia falar sobre meus sentimentos, e agora tudo isso está reprimido", diz.

Há dois anos, ela vivenciou um quadro de depressão, e tem observado sinais da volta do problema. Tem dias em que se esquece até mesmo de se alimentar. Em muitos momentos, também observa reações exageradas. Em outras circunstâncias, tem uma cobrança exacerbada sobre si mesma quando erra. "Quando tem algo para acontecer, penso em todas as possibilidades do que pode dar errado", conta. Ela busca melhoras. Recorre a séries de TV, começou a desenhar e pintar e a tocar violão.

Boas relações


A psicóloga Renata Borja assinala que o ser humano é sociável por si só. Preservar boas relações e experimentar o amor desde as vivências infantis, explica, é um dos fatores que contribuem para a qualidade de vida, saúde e longevidade. "Estar impedido ou limitado nos relacionamentos com os próprios pares, em uma idade em que os jovens estão começando a se identificar com seus 'bandos', pode acarretar inúmeros problemas futuros que não podemos prever", salienta. Para Renata, é natural, neste momento, um aumento dos distúrbios emocionais, pois ativam com mais intensidade as emoções.

A psicóloga explica que o impacto de tantas privações durante a pandemia varia entre cada pessoa, dependendo da forma como compreende, sente e se comporta diante das situações. "Para as debutantes, por exemplo, essa pandemia pode ser um pesadelo, principalmente para aquelas que tinham festas planejadas e tiveram suas expectativas frustradas. Para outros, que sofriam bullying, pode ser um alívio não ter que encontrar colegas. Alguns podem ter dificuldade em acompanhar as aulas virtuais, enquanto outros estão mais confortáveis com esse modelo. Fato é que houve uma modificação da rotina, que será facilmente superada por uns, enquanto outros estão mais vulneráveis", elucida.

Os principais sinais de que algo não vai bem, acrescenta a especialista, são a labilidade de humor, a expressão exagerada de determinadas emoções e comportamentos disfuncionais, como isolamento, uso abusivo de telas, agressividade, choro, discussões, preocupações excessivas, excesso de questionamentos, hipervigilância das sensações e pensamentos, uso de álcool, drogas, comer excessivo, inquietude, desânimo, apatia, paralisia. "O importante é saber reconhecer quando não estamos sabendo lidar com elas, para procurar ajuda profissional."

Diante desse contexto, pais e familiares precisam auxiliar na construção de uma rotina mais saudável. "Acaba sendo uma oportunidade para vencer novos desafios, o que poderá ser fonte de resiliência no futuro." A psicóloga reforça que, para o bem-estar, é necessário nutrir pensamentos otimistas e realistas, ter uma rotina planejada e organizada, praticar atividades físicas, manter o sono regular, ter momentos de lazer, buscar práticas espirituais e meditativas.

Namoro


Para Leon Nicolas, de 16 anos, a maior privação em tempos de pandemia é a falta da presença da namorada. Eles se comunicam por chamada de vídeo(foto: Túlio Santos/em/DA Press)
Para Leon Nicolas, de 16 anos, a maior privação em tempos de pandemia é a falta da presença da namorada. Eles se comunicam por chamada de vídeo (foto: Túlio Santos/em/DA Press)
Para Leon Nicolas Ribeiro Marques, de 16, a maior privação em tempos de pandemia é a falta da presença da namorada, Maria Luiza. O casal se encontra todos os dias por chamadas de vídeo, mas isso está longe de suprir a saudade. A única oportunidade em que se viram pessoalmente, desde então, foi no Dia dos Namorados. Maria Luiza mora com a avó, grupo de risco para o coronavírus, e por isso a atenção é ainda maior.

A rotina de Leon se resume às atividades escolares, mantidas pela internet, além dos jogos on-line com os amigos, e acaba de concluir um curso de programação. "Estar longe da Maria Luiza, além da saudade, me causa tristeza. Conversar com ela me tranquiliza. Somos muito grudados", diz.

A educadora e diretora da Fundação SM, entidade voltada para a educação, e ex-secretária Nacional de Educação Básica, Pilar Lacerda, fala sobre o papel dos educadores no enfrentamento desses problemas. A escola é uma referência de socialização, de encontros, aprendizados, e muitos professores são o porto seguro para seus alunos. "O importante é manter o vínculo. Esse estudante precisa sentir que tem alguém na escola que se importa com ele. Receber tarefas, se reunir com a turma virtualmente, tudo isso é essencial. Lembrando que estamos falando dos adolescentes que são privilegiados, que têm acesso à internet e equipamentos para a comunicação, o que, por outro lado, muitos não têm", aponta a educadora.

Para ela, tudo o que vem na esteira da pandemia cria novas formas de viver. Jovens reinventam a convivência, os meios de encontrar os amigos e ter outras maneiras de diversão. "Teremos uma geração que convive socialmente de maneira distinta. Ao mesmo tempo, lidar com as privações e frustrações é um processo de amadurecimento", salienta.

Enquanto Zion Mendanha, de 16 anos, consegue lidar bem com o isolamento social, a irmã Aila Mendanha, de 15, diz que a ansiedade piorou(foto: Túlio Santos/em/DA Press)
Enquanto Zion Mendanha, de 16 anos, consegue lidar bem com o isolamento social, a irmã Aila Mendanha, de 15, diz que a ansiedade piorou (foto: Túlio Santos/em/DA Press)
A casa dos irmãos Aila e Zion Mendanha Motta sempre esteve cheia de amigos. De repente, a mudança brusca. Lá se vão quatro meses sem ver ninguém. Aila está prestes a completar 15 anos. Geralmente, essa é uma época de celebrações. A garota cita uma amiga que teve que cancelar sua festa de debutante, com o início do distanciamento social. Ela mesma estava planejando uma viagem com colegas para comemorar o aniversário, o que também foi suspenso. "Está demorando demais para passar. Estava mais tranquila, mas agora estou mais triste. A saudade é muita. Sou ansiosa, e isso piorou.”

Aila e Zion mantêm suas atividades rotineiras agora pelos meios eletrônicos. A convivência com os amigos segue pelos canais virtuais, muitas vezes até com encontros para os aniversários. O garoto, aos 16, é um contraponto. Demonstra serenidade e diz que fica feliz em poder continuar fazendo as coisas de que gosta. "Tenho que ter mais força de vontade, mais iniciativa. Continuo dançando, toco violão e guitarra e também me dá prazer poder aprender outros idiomas", diz.

Pesquisa realizada pela psicóloga Renata Borja em uma escola particular de Belo Horizonte:

- Quadros de ansiedade e depressão em menores de 18 anos são recorrentes, o que é intensificado pela pandemia.

- 75% dos alunos com idade entre 14 e 16 anos revelaram sofrer de ansiedade

- Apenas 22,54% dos alunos mostraram ser pouco ou nada ansiosos

- Para a pergunta "sou ansioso?", 13,56% responderam moderadamente, 23,11% responderam muito e 40,7% totalmente.

- Para a pergunta "a ansiedade me atrapalha e me prejudica?", 9,54% responderam em nada, 15,57% pouco, 19,09% moderadamente, 22,61% muito e 33,16% totalmente.

PALAVRA DE ESPECIALISTA

Patrícia Rezende, pediatra do Grupo Prontobaby


O jovem sente que precisa viver tudo aqui e agora. É uma fase de autodescobrimento, de conhecer mais o mundo, de formar a personalidade. Com o isolamento, perde a vivência com os amigos. A tecnologia veio como um agente facilitador para manter as relações. Por outro lado, os pais precisam estar atentos a qualquer mudança de humor e comportamento. Sentimentos em desarmonia ensinam para os pais a ter paciência e serem compreensivos. É preciso manter o diálogo e estabelecer uma comunicação não violenta para que o adolescente se sinta reconhecido e valorizado. Também é um momento de estreitar laços. A adolescência já é uma época de emoções à flor da pele, e isso pode piorar durante o isolamento. Conversas francas são importantes para que o jovem tenha liberdade de abrir seus sentimentos. O jovem costuma testar limites, não levar a sério as recomendações dos pais, muitas vezes consideram que os pais são ultrapassados, querem proibir tudo, e isso pode facilitar a adesão ao uso de bebidas alcoólicas em grande quantidade, bem como de remédios. Logo acaba passando para a fase do abuso, da dependência. Os pais devem se tornar amigos. O jovem precisa perceber que não está sendo vigiado e privado de liberdade, e sim apoiado.


O que é o coronavírus


Coronavírus são uma grande família de vírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do coronavírus (COVID-19) foi descoberto em dezembro de 2019, na China. A doença pode causar infecções com sintomas inicialmente semelhantes aos resfriados ou gripes leves, mas com risco de se agravarem, podendo resultar em morte.
Vídeo: Por que você não deve espalhar tudo que recebe no Whatsapp

Como a COVID-19 é transmitida? 

A transmissão dos coronavírus costuma ocorrer pelo ar ou por contato pessoal com secreções contaminadas, como gotículas de saliva, espirro, tosse, catarro, contato pessoal próximo, como toque ou aperto de mão, contato com objetos ou superfícies contaminadas, seguido de contato com a boca, nariz ou olhos.

Vídeo: Pessoas sem sintomas transmitem o coronavírus?


Como se prevenir?

A recomendação é evitar aglomerações, ficar longe de quem apresenta sintomas de infecção respiratória, lavar as mãos com frequência, tossir com o antebraço em frente à boca e frequentemente fazer o uso de água e sabão para lavar as mãos ou álcool em gel após ter contato com superfícies e pessoas. Em casa, tome cuidados extras contra a COVID-19.
Vídeo: Flexibilização do isolamento não é 'liberou geral'; saiba por quê

Quais os sintomas do coronavírus?

Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:

  • Febre
  • Tosse
  • Falta de ar e dificuldade para respirar
  • Problemas gástricos
  • Diarreia

Em casos graves, as vítimas apresentam:

  • Pneumonia
  • Síndrome respiratória aguda severa
  • Insuficiência renal
Os tipos de sintomas para COVID-19 aumentam a cada semana conforme os pesquisadores avançam na identificação do comportamento do vírus. 

Vídeo explica por que você deve 'aprender a tossir'


Mitos e verdades sobre o vírus

Nas redes sociais, a propagação da COVID-19 espalhou também boatos sobre como o vírus Sars-CoV-2 é transmitido. E outras dúvidas foram surgindo: O álcool em gel é capaz de matar o vírus? O coronavírus é letal em um nível preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar várias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS não teria condições de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um médico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronavírus.

Coronavírus e atividades ao ar livre: vídeo mostra o que diz a ciência

Para saber mais sobre o coronavírus, leia também:

 



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