Dois tons de azul – o mais escuro nas portas e janelas, e o mais claro, quase celestial, como moldura da madeira sobre as paredes brancas – realçam a arquitetura da Matriz Nossa Senhora da Assunção, cartão-postal do distrito de Ravena, em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Mesmo com a pintura, sinal do zelo da comunidade com o patrimônio, moradores e visitantes não podem entrar na igreja que, neste domingo, completa 300 anos sem todos os presentes que merece.
O motivo do fechamento não se relaciona à pandemia do novo coronavírus, mas à questão de segurança. Interditado há 12 anos para intervenções – que foram interrompidas em 2014 –, o templo barroco necessita de obras urgentes no forro e trabalho de descupinização, alerta o administrador paroquial, padre Eloísio Vieira da Silva, há dois anos e meio na paróquia.
Segurando pedaços de madeira policromada, parte da história tricentenária que despencou do alto, padre Eloísio está em campanha para buscar os recursos fundamentais ao restauro do forro.
“Somente com esse serviço concluído poderemos reabrir a igreja. Será preciso retirar toda a madeira, restaurá-la, para, então, voltar com as tábuas para o lugar. Temos recebido apoio da Arquidiocese de Belo Horizonte, à qual a igreja está vinculada, da Prefeitura de Sabará, responsável pela pintura da fachada, e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha), cujos técnicos acompanham essa luta. Porém, precisamos de muito mais”, afirma.
Fundada em 1720 – como indica inscrição no forro da capela-mor (1720-1750) –, quando Sabará era uma das sete vilas do ouro, e contemporânea do “nascimento” do estado, que celebra neste ano o tricentenário da criação da Capitania de Minas, a Matriz de Nossa Senhora da Assunção comemora a data neste domingo, com missa às 10h, no salão paroquial, presidida por padre Eloísio.
Nos bancos, estarão apenas 20 pessoas, sorteadas entre os dizimistas contribuintes neste mês. Mas, se a maioria dos fiéis não pode ir à igreja, a imagem da padroeira de Ravena dará “um passeio” de carro pelo distrito. A fim de homenageá-la, católicos enfeitarão suas janelas.
COMBATE A INCÊNDIO
No aniversário, há uma boa notícia para os moradores de Ravena. Na tarde ensolarada de quarta-feira, quando as cores da igreja resplandeciam contra o céu de azul intenso, o padre recebeu a informação, na voz da coordenadora do Memorial da Arquidiocese de BH, Goretti Gabrich, de que “foi aprovado pelo Corpo de Bombeiros e pelo Iepha o projeto de combate a incêndio da igreja”.
Satisfeito, ele mostrou oito extintores recém-carregados e prontos para retornar aos seus locais de origem.
Como forma de separar a nave da capela-mor – ocupada por andaimes desde 2010, em especial para dar apoio ao arco-cruzeiro – há uma lona protetora impedindo a visualização do altar da padroeira.
Um dos desejos do padre, após os serviços de urgência, é conseguir uma reprodução gigante dessa estrutura original, para compor a celebração, quando for possível, de missas, casamentos, batizados e festas. “Estamos sempre abrindo a igreja para ventilar bastante e impedir o mofo”, explica o religioso.
Para mostrar avanços, padre Eloísio aponta dois altares colaterais restaurados e, na parte externa, a recuperação do muro e os serviços de drenagem, ambos feitos pela prefeitura local. O templo construído no início do século 18 é tombado há 42 anos pelo Iepha e pelo município.
EXPECTATIVA
A porta principal aberta, na quarta-feira, atraiu a atenção de três ciclistas moradores de Ravena e no início de um passeio ao município vizinho de Taquaraçu de Minas. O comerciante Sidnei Durães e os mecânicos Vinícius Rafael Severino Ferreira Pinto e Augusto Magno Ribeiro pediram licença ao padre, entraram e falaram da sua admiração pelo templo, antiga Matriz Nossa Senhora da Assunção da Lapa.
“Este é nosso cartão-postal”, ressaltou Sidnei, enquanto Vinícius, de 23 anos, lembrou que se trata de “uma inspiração para todos os jovens”. Augusto Magno, de 24, observou sobre a expectativa para reabertura da igreja: “Na última vez em que estive aqui, tinha 14 anos”.
Linha do tempo traz marcas na arquitetura
Conforme pesquisa do Iepha, o conjunto arquitetônico e paisagístico foi tombado em 2 de junho de 1977. A construção do século 18, com elementos da arquitetura colonial mineira, fica no Centro de Ravena, no largo da rua principal, com adro murado que abriga o cemitério.
A inscrição “1750” existente no arco-cruzeiro parece indicar a conclusão de parte importante das obras do templo, que passou por diversas reformas: em 1853, realizada por frei Luís de Ravena; em 1948-1949, a recuperação da torre, que fora atingida por um raio; e em 1953, quando foi restaurado o altar-mor e partes da cantaria foram recobertas com pintura imitando mármore. Outras obras ocorreram entre 1984 e 1987.
Em nota, a direção do instituto informou que, em parceria com a Arquidiocese de Belo Horizonte, a Paróquia Nossa Senhora da Assunção e a Prefeitura de Sabará, iniciou há um ano a execução de serviços considerados prioritários na restauração da igreja para a reabertura aos fiéis.
“Os serviços já realizados incluem a consolidação de fissuras nas alvenarias, revisão da cobertura, reparos em esquadrias, pintura externa da edificação e recomposição do passeio e do gramado.
Leia Mais
Em plena Semana Santa e quarentena, igrejas são arrombadas em BHCOVID-19: sinos de igrejas católicas tocam em todo Brasil para homenagear os 100 mil mortos no paísIgreja São José será a 1ª a retomar missas com fiéis no Centro de BH
Ainda segundo o Iepha, os serviços foram executados pela Prefeitura de Sabará, com acompanhamento e assessoria técnica do instituto do patrimônio e apoio da Arquidiocese de Belo Horizonte e da Paróquia Nossa Senhora da Assunção.
“Informamos ainda que, paralelamente, buscamos captar recursos para viabilizar a continuidade da obra de restauração, principalmente dos altares, forros e demais elementos artísticos.”