"Diga aonde você vai, que eu vou varrendo." O gari Tales Alves, de 30 anos, perdeu a conta de quantas vezes foi alvo da infame cantada, inspirada no pagode Dança da Vassoura, do Grupo Molejo.
O assédio, conta o rapaz, vem de homens e mulheres. Principalmente na internet, onde ele reúne milhares de seguidores: são 208 mil no Tik Tok e 18,7 mil no Instagram. Os perfis foram criados há pouco mais de quatro meses. "Não me incomodo com as cantadas, desde que a pessoa seja respeitosa. E, no caso dos homens, explico que sou heterossexual", diz o galã.
Íntimo das câmeras, Tales não economiza caras, bocas e poses nas fotos e vídeos que publica. A aptidão para os flashes já foi notada pelas agências de modelo e pelos concursos de beleza. O gari é, atualmente, parte do casting Thwa Agency e candidato a Mister BH, competição que premia os homens mais bonitos da capital, categorizados por profissão.
O gosto pelo ofício de gari é o tema mais frequente dos posts do mineiro. "Tenho orgulho da minha profissão, amo o que faço. Nunca esconderia que eu sou gari", comenta o rapaz, que trabalha para uma empresa terceirizada da Prefeitura de Belo Horizonte. Os turnos começam à noite, por volta das 20h30, e terminam às 4h30 da manhã. "Desde o início da pandemia, encerro o expediente mais cedo, pouco depois da meia-noite. Atuo bem no centrão, recolhendo o lixo. Como as lojas ficaram muito tempo fechadas, o volume diminuiu bem, então, a gente tem conseguido terminar o serviço mais rápido. Com a reabertura do comércio, deve voltar tudo ao normal em breve", relata.
'Playboy'
Tales conta que o ingresso na coleta seletiva se deu há dois anos, como realização de um desejo antigo. Antes de ser gari, ele trabalhava como repositor de supermercado. "Era eu quem fazia o descarte de lixo da empresa. A alegria dos garis que passavam para recolher o material sempre me chamou a atenção. Daí pensei: ainda vou mexer com isso. Procurei então um conhecido que trabalhava nessa empresa onde estou hoje e pedi que ele me ajudasse. No início, ele me zoava, falava que eu tinha cara de playboy. Eu respondia assim: 'Já viu playboy que rala em supermercado?'. Esse cara acabou me arrumando uma entrevista com os diretores e eu fui contratado", relembra.
Mesmo com porte atlético, o galã diz que demorou um pouco a se acostumar ao ritmo da coleta seletiva, que exige fôlego e bom condicionamento físico. "No início, eu ficava todo quebrado. A gente corre o tempo todo. Até eu me acostumar, os colegas me ajudavam, davam uma aliviada para mim. O que eu mais gosto nesse trabalho é isso: o companheirismo", elogia.
Para encarar a rotina pesada, o gari diz que passou a se dedicar com mais disciplina à musculação, prática a que ele aderiu há mais de quinze anos. "Comecei lá pelos 13 ou 14 anos. Na época, não podia pagar academia, treinava com barras de concreto. Quando consegui meu primeiro emprego, ainda como menor aprendiz, me matriculei em uma academia e nunca mais saí", relata. Com a pandemia do novo coronavírus, os treinos foram transferidos para o quintal de casa.
Pai aos 17
Morador do bairro Cabana, Região Oeste de BH, Tales tem duas filhas, de 12 e 5 anos. "A mais nova se mudou com a mãe para outra cidade. Então eu a vejo mais em datas especiais e por chamadas de vídeo. Mas a Júlia, que é a mais velha, é muito apegada a mim".
A adolescente, segundo o gari, é a maior incentivadora de sua carreira de modelo e influenciador digital. Júlia é que teria criado para ele o perfil no Tik Tok. Com o sucesso dos vídeos postados na rede, o galã veio para o instagram, acompanhado por milhares de seguidores.
O rapaz chegou a criar um perfil no Tinder (aplicativo de relacionamentos on-line), mas diz que não gostou da experiência. "Prefiro o olho no olho mesmo".