Balada de noite. De dia, passeio nas praças, na orla da Pampulha e almoço com restaurantes cheios. O belo-horizontino retomou rapidamente os hábitos sociais de antes da pandemia do novo coronavírus (Sars-Cov-2). Segundo dados de congestionamentos do aplicativo Waze, desde que os bares puderam voltar a servir seus clientes, na última sexta-feira, o movimento já se aproxima de índices pré-pandêmicos. Na sexta-feira, por exemplo, a lentidão de tráfego foi 84% do normal para esse dia da semana, superando a média das sextas-feiras de agosto, que eram as maiores, com 77,5%. No sábado, o movimento também foi intenso, superior ao de ontem em recantos boêmios do Buritis, da Savassi e da Cidade Nova, podendo estabelecer novo recorde de concentração de carros, um indicador de aglomerações.
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Bares e restaurantes têm sábado de almoço com bom movimento em BHPBH fiscaliza fechamento de bares, mas clientes não vão para casa; veja vídeoCOVID-19: Superlotação na Pampulha contrasta com imagens de abrilCasos de reinfecção pela COVID-19 levam governo de MG a mudar protocolosNos estabelecimentos as pessoas cumpriram a maior parte dos requisitos de segurança exigidos pela Prefeitura de Belo Horizonte para evitar a disseminação da COVID-19, como o distanciamento mínimo de dois metros entre as mesas e um metro entre ocupantes na mesma mesa. Mas o limite de quatro pessoas por mesa foi sumariamente esquecido em quase todos os estabelecimentos. A capacidade máxima dos estabelecimentos não poderia ultrapassar a razão de uma pessoa a cada 5m² da área total, incluindo funcionários. Somente clientes sentados podem ser atendidos. As tvs também transmitiram jogos de futebol ao vivo, atividade que estava vedada. Até no Centro, os 10 bares da Avenida Amazonas, entre ruas Espírito Santo e Bahia voltaram a reviver a época das mesas cheias, música e alegria, mas com regras mais restritivas.
No Buritis, na Região Oeste, tradicionais calçadas de bares voltaram a ser ocupadas por clientes nos arredores da Avenida Mário Werneck. Na Pampulha, os restaurantes e bares da Avenida Fleming receberam bom público, mas sem aglomerações fora do padrão. Muitos estabelecimentos instalaram totens borrifadores de álcool em gel nos acessos. As televisões ligadas também transmitiram jogos de futebol, contrariando o preconizado pela PBH. “Ontem (sábado), foi dia da balada mais pesada. Hoje é só de leve mesmo, aproveitando para divertir e acordar bem tarde amanhã”, disse a publicitária Luciana Lima Garcia, de 27 anos, que saiu com as amigas para aproveitar a noite quente, mas agradável.
Na lagoa
Durante o dia, na Lagoa da Pampulha, um dos principais pontos turísticos da capital, várias pessoas faziam atividades físicas ao ar livre, como corrida, ciclismo e caminhada. Outras apenas usavam o tempo para aproveitar o clima bom com a família. Os equipamentos de musculação estavam interditados, mas os bebedouros estavam disponíveis. O movimento foi tão grande que à noite as lixeiras do atrativo já tinham transbordado de cocos e garrafinhas de água usadas pelos visitantes.
Morador do Bairro Caiçara, Antônio de Jesus Ferreira, de 63 anos, aproveitou para passear com a filha, Rebeca, de 15. “As coisas parecem estar melhorando. O comércio voltou a funcionar, você vê que a maioria das pessoas está tomando os cuidados. E as pessoas, principalmente as crianças, têm essa necessidade de aproveitar um tempo bom como esse aqui na orla da Lagoa”, afirmou. Já na Praça da Liberdade, na Região Centro-Sul de BH, o cenário foi semelhante ao da Pampulha. A praça não estava tão cheia quanto a orla da Pampulha, mas muitas pessoas faziam atividades físicas ou aproveitavam o espaço para lazer.
A grande maioria parecia preocupada com a propagação da COVID-19 e tomava os cuidados necessários, como uso de máscara de proteção e a necessidade de manter o distanciamento. Porém, ainda foi possível perceber algumas pessoas sem máscaras, tanto quando praticavam exercícios quanto nos momentos de lazer e relaxamento. A fiscalização também estava presente. Além de Guarda Municipal, agentes da BHTrans e da prefeitura estavam mobilizados.
BH tem um avanço ininterrupto da retomada das atividades comerciais desde o início de agosto, quando estabelecimentos comerciais considerados não essenciais começaram a abrir as portas, desde que sigam os protocolos estabelecidos. Nessa semana, bares e restaurantes puderam abrir até 22h em certos dias e vender bebidas alcoólicas, outro momento que indica o avanço da flexibilização na capital.
Cautela no cardápio do almoço
A regra é clara. E rígida para o bem de todos. Está lá, no Diário Oficial do Município (DOM), publicado pela prefeitura. Para restaurante funcionar, em tempos de pandemia do novo coronavírus, é preciso respeitar o horário, protocolo de higienização e espaçamento correto entre mesas e cadeiras, seja dentro do salão ou em espaços públicos, como calçadas ou parklets. Foi neste esquema que ontem, na véspera de feriado da Independência, em dia de muito sol e calor, a identidade mineira de confraternizar em bares e restaurantes começou a ser resgatada. Gerentes e garçons estavam animados, muitos com saudades de antigos clientes – que já se tornaram amigos –, mas o consumidor ainda estava um tanto quanto receoso.
No Pizzarella, no Bairro de Lourdes, o casal Rogério Rodrigues de Oliveira, administrador de empresa, e Luciana Rodrigues Amaral, pedagoga, frequentadores do restaurante há anos, estavam felizes em rever rostos tão familiares. "No primeiro dia não saímos, vimos que nem todos estão tendo cautela, usando máscara e muitos lugares com aglomeração. Evitamos, mas hoje queremos relaxar, sair da rotina de casa e num ambiente que temos segurança. É importante a retomada, não só para a economia do país, mas psicologicamente para todos. Este setor sofreu demais. Mas a recuperação precisa vir com cautela", destacou Rogério.
Luciana, que tem filha médica e conta que todos os protocolos são respeitados pela família, destacou o momento de “perceber que tem vida fora de casa, sair, ver movimento. E estamos nos sentido bem seguros aqui”. Eles almoçaram um prato dos mais pedidos da Pizzarella, o arroz sujo com filé.
Na Casa dos Contos, na Savassi, fundado em 1975, o gerente Maciel Rocha, com 29 anos de empresa, conta que de um restaurante até então tradicional e só a la carte, com a pandemia teve que adotar o delivery, que passou a fazer parte do dia a dia para sempre. Agora, os pedidos são aceitos por aplicativo. Foi montada uma equipe para anotar pedidos, que também podem ser retirados no local.
Maciel está animado e diz que tem até lista de espera. Não fazem reserva: “Está uma loucura, estamos reaprendendo, mas vamos nos adaptando”. Seguindo todas as regras, ele conta que perdeu muito espaço, mas está feliz com a reabertura. “Antes da pandemia, atendíamos 150 pessoas. Hoje, temos 10 mesas com no máximo quatro pessoas”.
O casal Laisa Kwok, estudante de administração, e Túlio Fragoso, bancário, estavam a espera do filé à parmegiana, tão famoso da Casa dos Contos e aprovados pelos clientes. “É a primeira vez que saímos e a sensação é de liberdade, me passa uma normalidade. Aqui está dentro das regras e nos sentimos seguros. É o início da retomada de uma nova vida, sair, ver pessoas, alivia o estresse da rotina dentro de casa”, destacou Laisa. E Túlio confessou que, apesar de satisfeito com a oportunidade de sair, sente “falta de mais pessoas no restaurante, causa um estranhamento tantas mesas vazias”.
Espaços
Walmir Brandão, gente do La Grepia, no Centro, há 12 anos no restaurante, também destacou que o delivery é o que tem ajudado a encarar a pandemia: “O almoço está fraco, ainda engrenando. Acredito que os clientes ainda estão receosos. Acho que inseguros com o espaço fechado. O que é contraditório, já que na rua, em muitos lugares por aí, o espaçamento é muito menor, ficam mais próximos e aqui há a distância correta de acordo com as regras. Obedecemos todo o protocolo”.
Para Walmir, com o passar dos dias, o cliente vai voltar. No entanto, ele destaca que o público do La Grepia, acompanha os anos do restaurante, portanto, "60% do público da noite tem mais de 50 anos, a maioria, e este grupo acho que está mais cauteloso em sair de casa”. Mas o gerente não desanima: “Ter fé é persistência”.
Quase 6 mil mortes em Minas
Após ter divulgado no sábado o boletim epidemiológico sem o número de mortos pela COVID-19 referente às últimas 24 horas, a Secretaria Estadual de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) publicou o dado no informativo de ontem. No novo boletim, foram notificados 129 novos óbitos por coronavírus no estado, elevando o número total para 5.827 mortos. De acordo com o novo boletim epidemiológico, Minas Gerais somou 2.926 novos casos de coronavírus. Com este número, o total de casos da COVID-19 em Minas Gerais sobe para 234.804, sendo que 198.462 pacientes já se recuperaram. Os casos em acompanhamento no Estado são de 30.505.
A SES-MG atribuiu a não divulgação do número de óbitos no boletim epidemiológico de sábado a uma instabilidade no sistema de notificações do Ministério da Saúde, em Brasília. Porém, de acordo com o Ministério da Saúde, não houve qualquer erro nos dados ou nos sistemas do governo federal. A pasta entrou em contato com a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais para fornecer orientações e confirmar que o problema foi solucionado pela gestão local.
Ja o Brasil chegou a 126.650 mortes e 4.137.521 casos confirmados de COVID-19 ontem. Nas últimas 24 horas, houve acréscimo de 447 óbitos e 14.521 infectados, segundo dados do balanço do Ministério da Saúde. Números que evidenciam que o novo coronavírus segue ativo e circulando no país. De acordo com levantamento do Worldometers, atualizado ontem, o Brasil ultrapassou a Itália em número de mortes por milhão de habitantes e, agora, é o oitavo país do mundo com maior mortalidade por COVID-19 – enquanto tem 593 mortes por milhão de habitantes, o país europeu tem 588.
Na semana passada, o Brasil já havia ultrapassado o índice de mortes por milhão de habitantes dos Estados Unidos (583) e da Suécia (577), “país que não fez nenhum controle e que voltaram atrás pedindo desculpas”, como afirmou o pesquisador Domingos Alves em tom de crítica à “insistência ao comportamento negacionista dos governantes brasileiros".
Domingos é um dos responsáveis pelo Portal COVID-19 Brasil, iniciativa formada por pesquisadores das universidades de São Paulo (USP) e de Brasília (UnB). Segundo ele, quando o país atingiu 100 mil óbitos, a estatística do número de mortes por milhão de habitantes foi usada para minimizar a tragédia dessa marca, já que o Brasil estava no 12º lugar do ranking. “Mas o Brasil já está subindo e, nos próximos dias, vai para o sétimo lugar nessa classificação que o governo colocou como uma coisa boa. Até o fim da semana que vem devemos passar, na sequência, a Grã-Bretanha e a Espanha. Até sexta-feira desta semana, nós já estaremos em quarto, quinto lugar", prevê Domingos.
DESRESPEITO NAS PRAIAS
A cena se repete. Areias e calçadões do Rio de Janeiro voltaram a registrar aglomerações e as estradas foram tomadas por engarrafamentos em direção à Região dos Lagos. No balanço da COVID-19, o Brasil chegou a 126.203 mortes e 4.123.000 de infectados, com acréscimo de 682 óbitos e 30.168 casos confirmados nas últimas 24 horas. No fim de semana que antecedeu o feriado de 7 de Setembro, as cenas de desrespeito ao distanciamento social também repetiram-se no litoral de São Paulo. No Rio (foto), a prefeitura autorizou o banho de mar nas praias, mas a permanência na areia, com barracas, segue proibida, exigência que foi amplamente desrespeitada ontem. O mesmo ocorreu em relação ao uso obrigatório da máscara no calçadão. “Isso que aconteceu no Rio é muito preocupante e só vamos ver o efeito daqui a duas semanas”, projeta o médico sanitarista e membro da Fundação Getulio Vargas (FGV) Walter Cintra.