Ele era “tio” porque era o mais velho. O único acima dos 30 em uma banda em que os demais integrantes estão na casa dos 20, Breno Braga Batista, o Tio Wilson, 34, também não era de Brumadinho, onde a Lagum foi criada, em 2014. Era de Contagem, onde vivia com a mulher, Ellen Cassim. E foi o último a entrar na banda – chegou em 2016, depois que outros bateristas passaram pela Lagum.
“Eu já tocava em outros projetos em BH, quase tudo voltado para o rock. Achava que poderia passar um pouco de experiência para eles, mas vi que eu é que tinha muito que aprender”, afirmou Tio Wilson ao Estado de Minas no ano passado. “O rock impunha uma viseira mais fechada, cada um gravava no seu quadrado. Na Lagum é um processo mais coletivo, até por envolver mais referências musicais”, acrescentou ele.
Tio Wilson foi baterista de bandas e artistas que tocavam no circuito roqueiro de Belo Horizonte. Integrou a banda Karmin e acompanhou a cantora Gabi Mello.
Como as milhares de postagens de fãs chorosos ao longo do dia de ontem destacaram, era o cara gente boa, agregador, generoso. Aquele que mantinha contato direto com os fãs, respondendo pessoalmente às mensagens nas redes sociais. Também era muito ligado à família. Era filho de William Vieira Batista, o William Barreiro (PSB), vice-prefeito de Contagem, e Janice Braga.
“Ele era um cara muito gente boa, extrovertido, aberto. O que chamava a atenção era o jeito positivo, sempre de bom humor. Mesmo antes dos shows, era sempre leve, passava um ar de serenidade”, comentou João Ferreira, vocalista e guitarrista da Daparte, banda que estreou em show em 2015, dividindo o mesmo palco com a Lagum em um evento de Saint Patrick’s Day.
“Um cara incrível e talentoso demais”, destacou o cantor e compositor Jão. “Força, irmãos. Muitas força. Meus sentimentos. Eterno Tio”, postou Vitor Kley. “Menino bom, seguirá presente, eternamente em nossos corações”, publicou Rogério Flausino, vocalista do Jota Quest. Em seu Instagram, Tio Wilson, ainda um desconhecido em maio de 2013, postou uma foto ao lado de Flausino no pub Major Lock. Mais tarde, a casa na região Centro-Sul de BH, com seu palco mínimo, foi cenário em que a então iniciante Lagum fez várias temporadas.
Banda que ganhou cancha na noite da cidade, a Lagum foi criada em 2014 por iniciativa do vocalista Pedro Calais, o principal compositor, quando ele compôs Califórnia, canção cheia de mensagens positivas (o que é uma das marcas do grupo). Morador de Brumadinho, Calais postou um vídeo no Facebook com esta canção e conseguiu uma data em uma casa noturna de BH. Para tal, montou uma banda com seus amigos próximos.
“No início, não passava de brincadeira. Agora, com o segundo disco, a responsabilidade aumenta. A ideia é lançar esse CD agora já pensando no terceiro. Que a gente viva disso para o resto da vida”, disse ao EM Wilson quando do lançamento do segundo álbum, Coisas da geração (2019).
A trajetória da Lagum dialoga tanto com os velhos tempos, do analógico, quanto os novos, do digital. A banda despontou através do bom e velho CD, Seja o que eu quiser (2016). Independente, foi gravado com as economias do shows. A cada nova apresentação a banda distribuía o disco gratuitamente. A onda só se multiplicou com a projeção das redes sociais.
Houve, naquele primeiro momento, uma ajuda essencial. Neymar, em plena Copa do Mundo, tocou a canção Deixa (parceria com Ana Gabriela) em seu stories. Não mais restrita à Grande Belo Horizonte, a Lagum chegou ao segundo álbum, pela Sony Music, com produção do britânico Paul Ralphes.
Quando a pandemia chegou os músicos cancelaram tudo, claro. Mas lançaram dois singles, Hoje eu quero me perder (em março) e Será (com Iza, em junho). O derradeiro show de Tio Wilson teve os ingressos esgotados após um minuto da abertura das vendas.
“Ele morreu com honra, morreu fazendo o que ele nasceu pra fazer e ensinou muito sobre ser grato e sensível”, publicou Pedro Calais na homenagem que fez nas redes sociais ao amigo.