Tempo de obras para salvar um patrimônio de Minas. Com mais de 300 anos de história, o Mosteiro de Macaúbas, Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, onde vivem freiras enclausuradas, leva ao pé da letra o isolamento social, reduzindo o contato além-muros ao mínimo possível. Mas nem com as restrições impostas pela pandemia do novo coronavírus o restauro de uma das mais importantes construções coloniais do interior do Brasil, conforme especialistas, está parado. Dentro da campanha Abrace Macaúbas, a abadessa Maria Imaculada de Jesus Hóstia comanda a retomada com o serviço no chamado Coro Baixo, espaço no qual as monjas ficam durante as missas. Até março, antes de Macaúbas fechar o portão principal à visitação, os ofícios religiosos eram realizados e abertos aos fiéis diariamente, às 7h, e aos domingos, às 10h30.
Depois de exatos três anos de lançamento da campanha, a equipe coordenadora da iniciativa autorizou a destinação de recursos para a restauração do piso do Coro Baixo, que pode ser visto durante as missas através de venezianas de madeira. "Para conseguir realizar as obras em caráter de urgência, uma vez que parte do piso cedeu no início do mês passado, as irmãs contaram com a assessoria do Iepha, responsável pelo tombamento desde 1978, a fim de orientar a equipe especializada que trabalha na restauração do mosteiro há mais de 20 anos", detalha o presidente da Associação Cultural Comunitária de Santa Luzia, Adalberto Andrade Mateus, integrante da comissão organizadora da campanha. O piso do Coro Baixo é dividido em campas, locais onde, nos séculos 18 e 19, eram sepultadas as recolhidas, entre elas a irmã Germana Maria da Purificação (1782-1856), considerada milagrosa.
União
A campanha Abrace Macaúbas é resultado do esforço contínuo de várias instituições em frentes diversas e etapas acompanhadas pelo Ministério Público de Minas Gerais e fiscalizadas pela Secretaria Municipal de Cultura e Turismo de Santa Luzia, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e Iepha-MG, e coordenada em parceria com a Associação Cultural Comunitária de Santa Luzia e apoio do Memorial da Arquidiocese de BH.
Adalberto Mateus explica que a campanha já conduziu ações fundamentais, como a restauração da porção sul do chamado Muro da Lenha, que circunda o mosteiro, realizada pela prefeitura, a contratação do projeto elétrico, e a descupinização de toda a construção, ambas com recursos doados de forma espontânea. Entre as próximas ações, o mosteiro também implantará projeto de combate a incêndio.
Uma conta para recolher as doações foi aberta na Caixa Econômica Federal. Em agosto de 2020, havia R$ 486.873.74, valor ainda insuficiente para a realização das intervenções necessárias. Qualquer quantia pode ser depositada com as seguintes informações: Banco: Caixa Econômica Federal, Nome: Mosteiro de Nossa Senhora da Conceição Macaúbas, Agência:1066 – Operação 013 – Conta Poupança: 75.403/4, CNPJ: 19.538.388/0001-07.
Local acolheu de devotas a órfãs
O Mosteiro de Macaúbas, como é carinhosamente chamado o recolhimento das religiosas concepcionistas, fica na zona rural de Santa Luzia, e tem um vinho famoso produzido pelas monjas a partir de rosas. Entre orações e trabalho duro, elas cuidam dos roseirais e de árvores frutíferas, também para a produção de bebidas e doces.
Na entrada principal da construção, onde se lê a palavra clausura, vê-se em destaque a pintura de um personagem fundamental nesta história: o eremita Félix da Costa, que veio da cidade de Penedo (AL), em 1708, pelo Rio São Francisco, na companhia de irmãos e sobrinhos. Demorou três anos para chegar a Santa Luzia, onde construiu uma capela dedicada a Nossa Senhora da Conceição, de quem era devoto. No século 18, quando as ordens religiosas estavam proibidas de se instalar nas regiões de mineração por ordem da Coroa portuguesa, havia apenas dois recolhimentos femininos em Minas: além de Macaúbas, um em Chapada do Norte, no Vale do Jequitinhonha.
Tais espaços recebiam mulheres de várias origens, as quais podiam solicitar reclusão definitiva ou passageira. Assim, os locais abrigavam meninas e mulheres adultas, órfãs, pensionistas, devotas. Algumas se estabeleciam temporariamente, para “guardar a honra”, enquanto maridos e pais estavam ausentes da colônia, ou ainda como refúgio para aquelas consideradas desonradas pela sociedade da época.
Macaúbas recebeu figuras ilustres, como as filhas da escrava alforriada Chica da Silva, que vivia com o contratador de diamantes João Fernandes. A casa na qual Chica se hospedava fica ao lado do convento. Como parte do pagamento do dote das filhas, Fernandes mandou construir, entre 1767 e 1768, a chamada Ala do Serro, com mirante e 10 celas (quartos para as religiosas).
Colégio
Em 1847, o recolhimento passou a funcionar também como colégio, tornando-se um dos mais tradicionais de Minas. Essa situação durou até as primeiras décadas do século 20, quando a escola entrou em decadência devido à chegada de congregações religiosas europeias, com grande experiência na educação de meninas. Já em 1933, a construção passou a abrigar o mosteiro da Ordem da Imaculada Conceição.