Os descartes de esgotos e a degradação provenientes de atividades agrícolas predatórias lançam mais poluentes no Rio Paraopeba do que os metais pesados e minerais que podem ser relacionados com os rejeitos do rompimento da Barragem B1 da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho. Essa é uma das constatações de um levantamento feito sobre o manancial desde abril de 2019 pelo Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia (COPPE) da UFRJ, por encomenda da Vale (confira tabela no final).
Os levantamentos feitos em 28 pontos do rio mostram que "o Rio Paraopeba dá sinais de recuperação à sua condição anterior ao rompimento". De acordo com uma das responsáveis pela pesquisa, a professora Fabiana Valéria da Fonseca, da Escola de Química da UFRJ, mais de 150 pessoas se envolveram nas atividades, inclusive com quatro coletas de campo realizadas de abril de 2019 a março deste ano.
"É um estudo independente, em períodos de seca e de chuva, em que monitoramos todos os parâmetros de qualidade da água para verificar o enquadramento nas normas estaduais e federais", afirma a professora.
Uma das conclusões do estudo é que nas áreas urbanas e espaços rurais de intensa produção agrícola ocorrem altas concentrações de fósforo, sulfetos e nitratos provenientes dos resíduos dessas atividades. Com isso, o rio voltaria ao enquadramento de classe 2, antes do rompimento, quando era possível o abastecimento para consumo humano, após tratamento convencional, recreação de contato primário, como natação e mergulho, a irrigação de hortaliças, plantas frutíferas, parques, jardins, aquicultura e atividade de pesca.
Em maio de 2020, um levantamento do Instituto Mineiro da Gestão das Águas (IGAM) mostrou que as concentrações de manganês, ferro e alumínio continuavam acima dos limites. Por outro lado, os metais pesados, extremamente prejudiciais ao homem e ao meio ambiente, e a turbidez, que é a quantidade de partículas que deixam as águas turvas, estavam satisfatórios.
Os nitratos estiveram acima dos índices da legislação, de 10 MG/L, em 12 pontos, identificados apenas na terceira coletagem, em seca, estando abaixo nas demais. "Muitos dos pontos (acima do permitido) estão situados em áreas de plantação agrícola, indicando possível presença de fertilizantes, além da possibilidade de despejos de efluentes urbanos, que promovem o descarte de nitrogênio amoniacal, cuja conversão à nitrato ocorre naturalmente", aponta o estudo.
O limite de 0,02 mg/L de concentrações de fósforo foi excedido em um ponto na primeira amostragem, sob chuva, sete na segunda, 11 na terceira e 17 na quarta campanha, também sob precipitação. "Foi possível observar aumento gradual na concentração de fósforo total ao longo das quatro coletas. Esse resultado pode estar relacionado a efluentes urbanos e a lixiviação de fósforo a partir de plantações agrícolas suplementadas com fertilizantes", indica o levanmtamento da UFRJ. "A concentração elevada de sulfeto em 17 amostras da quarta coleta reforçam essa avaliação por serem também resultado dessas atividades".
Ambientes tóxicos
Outra grande preocupação é com a ecotoxicidade, que é a medição de pontos onde as condições da água podem trazer efeitos danosos para organismos da fauna, não diretamente ligados à saúde humana. Nos trechos a partir da captação de Juatuba e até a confluência com o Córrego da Morada foram encontrados ambientes tóxicos para peixes e algas nas quatro coletas, justamento onde fósforo e nitrato têm altas concentrações devido a efluentes urbanos principalmente.Sob chuvas ou na seca a presença de metais como ferro, alumínio e manganês dissolvidos na água praticamente se mantêm dentro dos parâmetros exigidos pelas legislações ambientais. Foram identificados 21 metais e ametais no Partaopeba,m sendo que o ferro, comum na região e na barragem rompida, é a partícula mais presente em suspensão. Durante as chuvas, há aumento das concentrações totais desses metais em muitos trechos.
O estudo sugere que as presenças maiores de ferro total, alumínio total e manganês total sejam efeito da suspensão dos elementos pela chuva, que podem estar no fundo e leito do rio, mas que são facilmente removidos por processos de tratamento de água convencionais, o que não ocorre no estado dissolvido em grandes concentrações.
A turbidez também se mostra controlada na estação seca, mas ocorre na época de chuvas. Essa é a característica da concentração de partículas em suspensão na água e que pode a deixar turva acima do limite permitido de 100 UNT.
"Dados obtidos após alta incidência pluviométrica mostraram uma grande elevação desse parâmetro, variando entre 120 e 215 UNT para os pontos antes da Barragem de Retiro Baixo (ponto máximo de alcance dos rejeitos do rompimento). Dados históricos confirmam essa tendência indicando que os valores medidos nas diferentes coletas estão dentro do comportamento temporal da qualidade da água do Rio Paraopeba", conclui o estudo.
Poluentes
Confira as condições do Rio Paraopeba
Nitratos
Acima dos limites de de 10 MG/L da legislação ambiental em 12 pontos
Cloretos e sulfatos
Abaixo do limite de 250 mg/L da legislação em todas as amostragens
Turbidez (partículas em suspensão que tornam a água turva)
Foram quatro pontos acima na primeira coleta no período chuvoso, na terceira dois pontos e na quarta, com chuva, 19 pontos
Fósforo
O limite de 0,02 mg/L foi excedido em um ponto na primeira amostragem, sete na segunda, 11 na terceira e 17 na quarta campanha
Mercúrio, prata e selênio
Dentro dos limites estabelecidos por legislação
Arsênio e lítio
Valores muito baixos em relação ao limite estabelecido na legislação
Alumínio total
Redução na concentração deste parâmetro ao longo das coletas 1 a 3 e aumento significativo na concentração das amostras da coleta 4
Alumínio dissolvido
O parâmetro alumínio dissolvido estava acima do limite legislado (0,1 mg/L) em quatro pontos da coleta 1, dois na coleta 2, nenhum na coleta 3 e três pontos da coleta 4
Chumbo total
Todos os pontos analisados nas coletas 1, 2 e 3 apresentaram valores de chumbo total abaixo do estabelecido na legislação, 0,01 mg/L. Na quarta campanha, dois pontos estiveram acima do limite da legislação
Cobre dissolvido
Na primeira coleta eram 22 pontos acima do limite. Na segunda, terceira e quarta coletas apenas um ponto do rio tinha concetração alta de cobre em cada uma desses oportunidades
Ferro dissolvido
Na primeira coleta, o parâmetro ferro dissolvido apresentou valores acima da legislação (0,3 mg/L) para três pontos. Na segunda campanha foram três, na terceira e quarta campanhas todos os pontos de amostragem estiveram abaixo deste limite
Manganês total
Manganês total esteve alto em 19 pontos na primeira coleta, sete na segunda, três na terceira e 18 na quarta (influencia das chuvas por ser material em suspensão e não dissolvido)
Manganês dissolvido
Presença de dois parâmetros acima na primeira coleta e um na quarta
Mercúrio, níquel, cloreto, fluoreto e cianeto
Estiveram abaixo do limite estabelecido pela legislação nos pontos de amostragem considerados