O Ministério Público estadual (MPMG) denunciou a proprietária do abrigo Sol Nascente, em Taquaraçu de Minas, cidade localizada na Região Central, por tortura, maus-tratos e desobediência à ordem judicial. Dois internos com dependência química também foram denunciados por tortura. Eles teriam ajudado a dona da instituição a agredir um abrigado de 51 anos.
A denúncia narra nove episódios de violência ocorridos entre maio e junho deste ano. Em um deles, uma idosa com sofrimento mental é agredida com tapas pela dona do abrigo e impedida de deitar na cama durante o dia. Em outro, um idoso de 80 anos, com Alzheimer, e outro de 85, com Parkinson e Alzheimer, ficavam amarrados na cama durante à noite, sem suporte de cuidadores, até o dia seguinte, com fraldas sujas, sobre roupas de cama molhadas.
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Um dos casos mais marcantes é o de um idoso de 91 anos, com tumor na área do ouvido e ferimento na orelha. Segundo a denúncia, a dona do abrigo recebeu orientações médicas para cuidar da ferida, mas em vez disso teria deixado ocorrer miíase na lesão, que é presença de larvas de mosca no local. E, para limpar o machucado, a mulher, por conta própria, teria usado água sanitária, cortado parte da orelha do idoso com tesoura e aplicado produto para tratar bicheira em animais.
Além disso, a denúncia narra que a dona da instituição desobedeceu a ordem judicial de 2018 que proibiu um ex-administrador do abrigo de frequentar o local. Em depoimento, uma testemunha teria dito à polícia que o homem - companheiro da proprietária da instituição e denunciado, na época, por maus-tratos - continuava a ir ao local. Na ocasião, a Justiça também proibiu a instituição de acolher pessoas com menos de 60 anos, com sofrimento mental ou com dependência em drogas e álcool.
“A denunciada, em decorrência do desprezo pelas vidas das pessoas que estão acolhidas no local, continua mantendo menores de 60 anos, deficientes mentais e dependentes químicos em um mesmo local, em flagrante desobediência à decisão judicial e à legislação brasileira”, afirmam as promotoras de Justiça Anelisa Cardoso Ribeiro e Luciana Corrêa Crawford, autoras da denúncia.
Abrigo já havia sido interditado a pedido do MP
No ano passado, o Ministério Público havia conseguido na Justiça a interdição total da Sol Nascente. A medida foi solicitada após novas denúncias de maus-tratos e de irregularidades no local. Em 2018, a pedido do MP, a Justiça já havia determinado o afastamento de um dos responsáveis pela instituição, acusado de maus-tratos, e estipulou prazo de 12 meses para a regularização do local.
“A situação é grave e as medidas menos drásticas anteriormente adotadas não surtiram o efeito esperado”, afirma trecho da liminar concedida pela juíza Maria de Lourdes Oliveira para interditar totalmente o local. A decisão menciona que ficou constatada a manutenção das irregularidades e que há “risco concreto de danos graves aos idosos e deficientes internados” na instituição, o que comprometeria ainda mais “a já grave situação a que estão submetidos os internos”.
A Justiça também determinou o afastamento da proprietária e diretora do abrigo, acusada de maus-tratos, e a nomeação de um administrador provisório para a instituição, além de obrigar o município de Taquaraçu de Minas a designar um servidor do seu quadro de pessoal para realizar, em até 120 dias, a desinstitucionalização de todos os internos do local.
“O que se nota é que a instituição vem funcionando como verdadeiro depósito de pessoas com algum tipo de transtorno ou sofrimento mental, contrariando a lei e acarretando sérios prejuízos à saúde dos internos, que permanecem abandonados sem preservação da individualidade, sem plano terapêutico, sem trabalho específico de estabilização do quadro clínico e, muito menos, sem estímulo à autonomia, o que os ajudaria na reinserção ao meio familiar ou, de forma autônoma, na sociedade”, afirmou a promotora de Justiça Anelisa Ribeiro.