A audiência de conciliação entre Vale e o governo estadual, em virtude da tragédia da barragem de Brumadinho, terminou sem acordo definitivo. Durante as cerca de cinco horas de reunião, encerrada no início da noite desta quinta-feira, no Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), as partes debateram as premissas desejadas pela mineradora para a formalização do trato. Um novo encontro foi agendado para o próximo dia 17. A ideia é encerrar as discussões sobre os pontos elencados pela companhia e, a partir daí, conversar sobre os valores das indenizações.
Leia Mais
Audiência entre governo e Vale sobre Brumadinho já dura mais de 4h; mineradora quer centralizar reparação em acordo únicoTrincas em barragem de Brumadinho podem prejudicar buscas por vítimasPandemia atrasa remoção de rejeitos em BrumadinhoZema, sobre Brumadinho: 'Quero evitar que o processo fique parado'Caminhão tomba e motorista fica preso em estrada de Casa Branca, em BrumadinhoO presidente do TJMG, desembargador Gilson Soares Lemes, afirmou que o encontro foi muito proveitoso. “Vale e as instituições jurídicas se mostraram muito empenhadas em realizar esse acordo. Agora, com o afastamento de quase todas as premissas postas pela Vale, acredito que em 17 de novembro seja possível chegar a um acordo final”, disse, em breve entrevista coletiva após a audiência presidida por ele.
Entre as premissas colocadas pela Vale, está um pedido pela centralização das ações socioeconômica e socioambiental, além do processo movido pelo estado em virtude dos danos que Minas Gerais herdou do desastre. Segundo o desembargador, a conexão das questões ajuizadas não impede outros processos.
“Esse acordo não elimina a possibilidade de qualquer ação individual. Esse acordo busca solucionar danos socioeconômicos e materiais causados ao estado”, explicou.
Estado ressalta avanços
O Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) foi à reunião com o objetivo de desatar os nós impostos pelas premissas da Vale. “Nós avançamos. Um acordo pressupõe diversas etapas e, hoje, superamos uma importante etapa: as premissas colocadas pela Vale como condição para sentar à mesa e discutir o valor. O próximo momento vai ser discutir o valor que vamos obter para a reparação ao meio ambiente e indenização aos atingidos”, disse o procurador-geral do MP mineiro, Antônio Sérgio Tonet.
Dos R$ 54 bilhões requisitados pelo governo, R$ 28 bilhões foram solicitados na petição para cobrir indenizações por danos morais coletivos e prejuízos sociais. O acordo em pauta na audiência não se confunde com as ações indenizatórias individuais.
“Estamos partindo para a realização de um acordo e contemplar a reparação do meio ambiente e a indenização aos familiares das vítimas e atingidos”, completou o procurador.
A Vale se comprometeu, ainda, a estender o pagamento do auxílio emergencial aos atingidos pelo rompimento da barragem do Córrego do Feijão até 30 de novembro. A tragédia, ocorrida em janeiro do ano passado, deixou 259 mortos e 11 desaparecidos.
Outras premissas
A Vale queria, ainda, a definição de um prazo para a duração do acordo de conciliação — tempo que pode, eventualmente, ser prorrogado. A mineradora diz, também, não desejar repetir o modelo adotado após o rompimento em Mariana, que culminou na criação da Fundação Renova para gerir o trabalho de reparação.
“Em tratativas anteriores e como premissa do acordo, trata-se de transação acerca da responsabilidade civil e não haverá, em hipótese alguma, confissão ou reconhecimento prévio de culpabilidade ou responsabilidade administrativa ou criminal”, argumenta a mineradora, no último dos nove pontos.
O tópico, segundo Tonet, não inviabiliza ações criminais ajuizadas contra os responsáveis pelo desastre. “O processo criminal continua, independentemente do acordo. Isso não significa que as pessoas da Vale que estão subscrevendo o acordo estão assumindo culpa”.
A audiência começou pelo ponto tido como mais burocrático, que pede a consolidação dos Termos de Ajuste de Conduta (TACs) já firmados por ocasião da tragédia. O trecho frisa a intenção da companhia de “estabelecer médias globais de reparação, ou seja: que envolvem ações coletivas, mantendo a premissa do acordo. Acordo, também, para que os conceitos “reparação integral”, “recuperação” e “restauração” sejam delimitados de forma clara, como estabelece a legislação ambiental vigente à época do desastre.
Os ajustes, diz a Vale, são essenciais para evitar riscos e conflitos sobre o que deve ser feito. Governo e companhia debateram, ainda, formas de dar transparência à participação popular nos processos de decisão sobre compensações. A mineradora pede que prazos, condições e limites sejam estabelecidos.
Acordo pode ser o maior da América Latina
A segunda parte dos R$ 54 bilhões — mais de R$ 26 bilhões — seria utilizada para custear projetos para reparar os danos causados pelo rompimento da barragem em Brumadinho, como a correção de falhas em bacias hidrográficas. Além disso, o dinheiro seria utilizado em empreendimentos voltados para o estado, como o Rodoanel de Belo Horizonte, conforme citado pelo ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas, no mês passado.
O advogado-geral do Estado, Sergio Pessoa, crê que os valores obtidos podem dar forma ao maior acordo do tipo em toda a história da América Latina.