Uma descoberta fascinante, agora reconhecida internacionalmente. A revista científica Science, publicada pela Associação Americana para o Avanço da Ciência, citou uma pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) como um dos ensaios de destaque de 2020, fora daqueles voltados ao novo coronavírus.
Trata-se do descobrimento do Yaravírus na Lagoa da Pampulha. O ser vivo tem maior parte dos seus genes jamais catalogada pela humanidade.
“Desafia a compreensão dos cientistas. É uma entidade biológica completamente nova”, afirma Jônatas Santos Abrahão, do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas (ICB) da UFMG, que coordenou o estudo.
O Yaravírus foi encontrado em 2017 no cartão-postal de BH. Desde então, Grupo de Estudo e Prospecção de Vírus Gigantes do ICB vasculhou mais de oito mil bancos de dados de micro-organismos ao redor do mundo, mas nada semelhante foi achado.
“É possível que este vírus seja raríssimo, somente encontrado em locais com características semelhantes ao que encontramos”, diz Jônatas.
Porém, segundo o pesquisador, ainda não é possível garantir que haja relação da poluição encontrada na Lagoa da Pampulha com o surgimento do misterioso ser vivo.
“Não sabemos. Precisamos de mais tempo para chegar à alguma conclusão”, afirma.
Uma coisa, contudo, o cientista consegue garantir: não há qualquer risco para o ser humano, ao contrário do novo coronavírus.
“Não representa nenhum risco. Absolutamente não infecta nenhum tipo de vertebrado, incluindo o ser humano. Até aonde a gente sabe, é um vírus exclusivamente de ameba", ressalta Jônatas Abrahão.
O vírus ameboide foi denominado como Yaravírus em homenagem ao mito da Iara, personagem marcante do folclore brasileiro.
''Estranho''
A pesquisa da UFMG foi citada pela Science como uma das “histórias favoritas não relacionadas à COVID-19” em 2020.
“Eles estão vivos? Estão mortos? Os vírus são uma das coisas mais estranhas da Terra. Agora, os cientistas (da UFMG) descobriram um sem genes reconhecidos, fazendo dele a coisa mais estranha entre um grupo já bastante excêntrico", informou a publicação em inglês.
O Grupo de Estudo e Prospecção de Vírus Gigantes, criado em 2011, é pioneiro no isolamento e caracterização desses grandes organismos.
Suas pesquisas visam ao desenvolvimento de testes e diagnósticos mais eficazes para doenças por meio da produção de proteínas em microrganismos gigantes.
Tupanvírus
Em 2018, o mesmo grupo de pesquisadores do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG descobriu no Pantanal o Tupanvírus.
Desta vez, foram as propriedades físicas do micro-organismo que chamaram a atenção dos cientistas: se trata do vírus mais longo já catalogado pela humanidade.
“O Tupanvírus, assim como o Yaravírus, fascina os cientistas de todo mundo porque nos fazem lembrar que existem entidades biológicas fantásticas escondidas por aí. Basta a ciência receber apoio para procurá-las”, afirma Jônatas Abrahão, integrante da pesquisa.
Outro vírus gigante descoberto pelo grupo foi o Samba, encontrado nas águas do Rio Negro, na Amazônia.
Pandemia
Segundo ele, neste ano o grupo de pesquisadores precisou interromper os trabalhos com vírus gigantescos para se dedicar à pandemia da COVID-19. Contudo, alguns cientistas já começaram a retomar as operações do coletivo científico.
“Pretendemos continuar nessa pesquisa, não só para entender melhor este vírus tão misterioso (Yaravírus), mas também para descobrir novos vírus em território nacional”, explica Jônatas.
De acordo com ele, o poder público deu bastante apoio aos virologistas em 2020, mas só para buscar avanços nos estudos sobre o coronavírus.
Ele garante que esses investimentos não se limitaram somente à área biológica. Contudo, Jônatas pede para que haja "regularidade" nos repasses e menos "contingenciamento".