Grandes e intensas áreas de instabilidade associadas ao calor e à umidade elevada do ar se espalharam pelo Centro-Sul de Minas Gerais e provocaram muitos temporais no Sul do estado, na Zona da Mata mineira e na Grande Belo Horizonte. Só nos seis primeiros dias de janeiro, na regional Centro-Sul da capital mineira já choveu 70% do volume esperado para o mês, e na Regional Noroeste, 58%. Ontem, o temporal deixou estragos: ruas inundadas, árvores caídas, carro arrastado e até um posto de gasolina atingido por raio. Lojas foram tomadas pelas águas e comerciantes ainda calculam os estragos. A previsão para hoje é de muitas nuvens, com pancadas de chuva e trovoadas isoladas na capital mineira. As temperaturas continuam altas e devem variar entre 19°C e 31°C.
O meteorologista Ruibran dos Reis, do Climatempo, explica que pancadas de chuva como a da tarde de ontem são causadas pela conjunção de calor e umidade do ar. "O calor combinado à alta umidade forma uma linha de instabilidade. É como se fosse uma aglomeração de nuvens que caminham em sequência. A linha se formou no início da tarde e choveu forte de Divinópolis (Centro-Oeste) a Juiz de Fora (Zona da Mata), passando pela capital mineira", explicou. Também houve temporal em Ouro Preto (Central), Ponte Nova (Zona da Mata) e Muriaé (Zona da Mata). Ele ainda atenta que a previsão é de calor e tempo abafado em todo o estado, com a possibilidade de novos temporais. "Deve chover pelo menos até o fim de semana. E as chuvas podem se intensificar na sexta (amanhã) e no sábado. Podem ser mais fortes do que a chuva de hoje (ontem)", alertou.
A Região Centro-Sul de Belo Horizonte foi a mais atingida em termos de volume de água da chuva ontem. Em apenas duas horas, a regional registrou 50,2 milímetros de chuvas, segundo a Defesa Civil da cidade. Ainda de acordo com o órgão municipal, em seis dias já choveu 70% do esperado para todo mês na região. Pelas ruas dos bairros Santa Lúcia e São Bento havia lama e rastros de alagamento no fim da tarde. Na Rua Laplace, um veículo foi arrastado pela enxurrada. Placas de asfalto foram arrancadas com a força da água. Por volta das 17h, funcionários da prefeitura já faziam a limpeza da via.
Comércios e casas do local sofreram com o temporal. “Toda vez que chove, o barranco desce”, conta a auxiliar administrativo Thayane Cavalcante, de 31 anos. Ela trabalha em um pet shop e parte do estabelecimento ficou alagada. “Entrou água na altura de quase um metro. Perdemos móveis, geladeira, sofá e o revestimento novo na parede que tínhamos acabado de reformar. Os cachorros tiveram que sair. Ficou puro barro. Já alagou outras vezes, mas não nesse nível de hoje. Todo mundo ficou assustado. A gente ficou no meio da chuva tirando as coisas lá de dentro”, relembra Thayane, ainda limpando o comércio.
Susto
O carro que foi arrastado pela enxurrada é do motorista do pet shop Gabriel Campos, de 35, que viveu momentos de desespero ao tentar salvar o carro. “A chuva começou branda, e, de repente, começou a descer uma enxurrada bem forte, tipo cachoeira mesmo. Meu carro começou a ser levado pela enchente até que chegou perto de uma árvore e virou de lado. A enxurrada começou a levantá-lo”, narra o funcionário. Segundo ele, o veículo foi levado por 20 metros e chegou a ficar cerca de 50% coberto pela água. “No desespero, entrei no carro e, como tenho um pouco mais de experiência, subi no calçamento de grama, que é onde não tinha correnteza”, conta Gabriel. “Estou assustado até agora. Fiquei com o pensamento de que é o único bem que eu tenho, mas o maior deles, é a vida. Só que no desespero que bateu forte eu fui. Coloquei Deus na frente.”
Comércios da Rua Coronel Antônio García de Paiva também foram atingidos pela enxurrada. Quando Nildo Camargos, de 54, gerente de um bar espeteria, chegou ao local para trabalhar, não chovia forte mais. “A gente inicia às 15h30. Chegamos às 15h e nos deparamos com tudo sujo, com muito barro aqui dentro. Agora estamos fazendo a limpeza para abrir novamente”, disse, por volta das 17h. O comerciante conta que durante as chuvas de janeiro do ano passado ele perdeu um freezer. “Toda vez que chove em BH a gente fica pensando nessas tragédias. A prefeitura tem que ver todos os canais, ir limpando. Se fizesse trabalho de limpeza na época da seca ia sair muito lixo daqui de dentro”, reclama Nildo.
Proprietária de uma papelaria dentro da galeria Center São Bento, Mariama Rocha, de 38, também compara a chuva de ontem com os temporais de 2020, que exigiram reformas na sua loja. “No ano passado, foi de noite, não deu pra fazer nada. Hoje (ontem) pelo menos a gente estava aqui, então foi menos estrago. Tinha muita gente tirando a água. Sem contar que depois daquilo eu subi o piso. Então, o fluxo de água que entrou foi menor.”
Outras áreas
Um raio atingiu a fiação da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) sobre um posto de combustível na Rua Javari, 93, bairro Concórdia, na Região Nordeste de Belo Horizonte. A descarga elétrica desceu até as bombas de abastecimento, causando um incêndio. Segundo o Corpo de Bombeiros, populares realizaram o início do combate às chamas com extintores de pó químico seco. Quando agentes da corporação chegaram ao local, a situação já estava controlada. Não houve vítimas, mas um carro Siena Branco foi atingido.
Além disso, os bombeiros atenderam 15 chamadas para o corte de árvore com risco iminente de queda, 47 para árvores caídas em via pública, 20 para árvores caídas sobre imóveis/residências e outras 20 para vistorias. Já a Defesa Civil de BH atendeu a uma ocorrência de danificação ou destruição de habitações na Região da Pampulha, um desabamento parcial de muro de arrimo na Região Leste e três ocorrências de infiltração nas regiões Centro-Sul, Oeste e Noroeste.
Mortes e desabrigados em MG
Minas Gerais já registra oito mortes, uma delas ocorrida em Belo Horizonte, na temporada de chuvas, que teve início em outubro e vai até março, segundo o último boletim da Coordenadoria de Defesa Civil de MG. O último foi em Muriaé, de uma mulher de 54 anos. Outras seis pessoas ficaram feridas. O número de desabrigados subiu ontem de 135 para 203, e o de desalojados, de 585 para 655, aponta o boletim de ontem. A situação climática exige atenção. Por isso, a Defesa Civil de BH reforça as recomendações à população, como evitar áreas de inundação, não se abrigar nem estacionar veículos debaixo de árvores, ter atenção em encostas e morros e não atravessar ruas alagadas. Em caso de aparecimento de fendas, depressões no terreno, rachaduras nas paredes das casas e o surgimento de minas d’água, avisar imediatamente a Defesa Civil (199).
PRECIPITAÇÕES POR REGIÃO*
Acumulado de chuvas (em mm) e percentual sobre a média de janeiro
Barreiro 92,4 28,1%
Centro-Sul 230,6 70,1%
Leste 146,2 44,4%
Nordeste 148,8 45,2%
Noroeste 191,4 58,2%
Norte 115,0 34,9%
Oeste 173,4 52,7%
Pampulha 127,6 38,8%
Venda Nova 163,4 49,7%
Média de janeiro: 329,1mm
* De 1º a 6 de janeiro
Fonte: Defesa Civil de Belo Horizonte