Jornal Estado de Minas

COVID-19

Reação à vacina? Centenários falam o que sentem após serem imunizados


“Sou brasileiro, maior de idade e vacinado.” A frase, cheia de atitude, já foi ouvida milhares de vezes, geração após geração, da boca de jovens que já se acham donos do seu nariz. Mas agora chegou a hora de uma turma muito especial repeti-la com mais orgulho e do alto da longevidade: “Sou brasileiro (a), maior de 100 anos e vacinado (a) contra a COVID-19.”



E, um ano depois de o primeiro caso da doença ser registrado no país, fazer das palavras, em todo canto, um brado de esperança capaz de ecoar por todas as idades.

Em Sabará, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, a alegria toma conta de dona Augusta Pereira Chagas desde que recebeu, há uma semana, a primeira dose do imunizante.

“Estou satisfeita, porque quero ter mais força na vida, sentir segurança e poder abraçar meus netos e bisnetinhos que ainda precisam muito de mim. Agora, espero ansiosa a segunda dose”, disse a senhora, centenária desde 2 de novembro e com muitos planos para o futuro, entre seus bordados, receitas e aconchego familiar.

A voz de dona Augusta, a exemplo da de Maria Geralda, de 105 anos, e de seu Armando, a poucos meses de chegar perto de completar a mesma idade, está firme e forte no seu direito à saúde e à imunização.



E serve como exemplo e esperança para moradores de um país que teve o primeiro diagnóstico da doença em fevereiro de 2020 e acumula 10.139.148 casos, com 245.977 mortos. Na frente desse número dramático estão os mais vulneráveis no chamado grupo de risco: os idosos.

Segundo a Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), a estimativa populacional de idosos com 90 anos ou mais, em Minas, é de 107,9 mil pessoas. A assessoria da SES-MG informa, em nota, que ainda nesta semana divulga o total de vacinados nessa faixa etária.

Por enquanto, apenas 2,65% dos brasileiros (5.614.633) foram imunizados contra a doença, que assombra o planeta e foi declarada pandemia pela Organização Mundial de Saúde (OMS) em 11 de março.

"Tomei vacina a minha vida inteira", conta Armando da Conceição, vacinado na fazenda onde está em quarentena (foto: JAIR AMARAL/EM/D.A PRESS)

PRIMEIRO CASO 

Foi em 26 de fevereiro de 2020, uma quarta-feira de cinzas, que houve a confirmação do primeiro caso de COVID-19 no Brasil. O paciente era um homem de 61 anos, morador da capital paulista, que fizera uma viagem à Itália entre 9 e 21 daquele mês.





Na época, procurou um serviço de saúde com sintomas respiratórios – a confirmação ocorreu depois de ele ser submetido a dois exames que deram positivo para a infecção. Na sequência, 30 pessoas da família foram colocadas em observação. A partir de então, começou a escalada tenebrosa da COVID-19, com muito bate-cabeça entre autoridades federais e estaduais, atitudes negacionistas de desprezo à ciência, queda de dois ministros da Saúde e lentidão na vacinação, ao mesmo tempo em que avançava um doloroso calvário para vítimas e familiares.

maria Geralda Fernandes, de 105 anos, recebeu a proteção e comemorou, com alívio: "Vacinei, graças a Deus! Estou livre!" (foto: RAMON LISBOA/EM/D.A PRESS)

VACINA E RABADA COM BATATAS 

A centenária Augusta Pereira Chagas quer o melhor para sua saúde e sabe bem do que gosta. Para comemorar a vacina, aplicada no sistema drive-thru montado pela Prefeitura de Sabará, via Secretaria Municipal de Saúde, ela saboreou uma rabada com batatas, preparada por ela e pelo neto Carlos Eduardo Chagas de Souza, de 32. “Foi uma disputa entre os netos para saber quem a levaria para vacinar. Todo mundo queria, e havia uma série de recomendações, como dar notícia o tempo todo no grupo de WhatsApp da família, verificar qualquer reação, enfim, tomar todos os cuidados”, revela a filha caçula e mãe de Carlos Eduardo, Mirtes da Piedade Chagas e Souza.

Vizinho da vovó, Carlos Eduardo se comprometeu a preparar com dona Augusta, para o almoço de sábado, a iguaria, e acabou sendo o condutor da matriarca. “Foi uma tranquilidade para ela e para toda a família. Ficamos aliviados”, conta Mirtes, pedagoga, dona da casa onde a mãe passa a quarentena, que já vai para um ano.





Lúcida e bem-humorada, só lamentando um pouco de dificuldade para ouvir, dona Augusta está à frente de uma família que soma 58 integrantes: nove filhos, 25 netos e 24 bisnetos. Natural de Sete Lagoas, na Região Central de Minas, e moradora de Sabará há mais de cinco décadas, ela se despede do repórter de forma afetuosa: “Um grande abraço... Abraço de velho é muito bom, pois é quentinho”.

Em Sabará, a primeira etapa da imunização inclui profissionais da área de saúde, idosos institucionalizados e pessoas acima dos 90 anos. Já foram vacinadas 2.650 pessoas com a primeira dose e 779 com a segunda. Para quem tem acima de 85, está aberto cadastramento, que poderá ser feito pela internet e também por telefone, sendo necessário informar nome completo, data de nascimento, endereço, CPF, telefone de contato, e-mail de contato e nome do responsável pelo idoso (caso necessário). Após esse cadastro, a Secretaria Municipal de Saúde entra em contato para agendar a aplicação.

“NADA ME PEGA, NÃO. SOU FORTE”

Em Taquaraçu de Minas, município com 4,1 mil habitantes, também na Grande BH, o fazendeiro Armando da Conceição, que completará 105 anos em 15 de abril, foi vacinado na quinta-feira. “A dose dele estava reservada”, disse o secretário municipal de Saúde, Célio Marcolino da Fonseca. Na cidade, onde os profissionais de saúde também foram imunizados, receberam a primeira aplicação 21 idosos com mais de 90 anos.





O neto de seu Armando, Leopoldo Alves, advogado, informou que o avô vinha se tratando de uma leve infecção e só poderia ser vacinado dois dias após terminar de tomar o antibiótico prescrito pelo médico. O senhor centenário continua em quarentena na sua Fazenda Aragão, na comunidade rural de Campo de Santo Antônio. “Nada me pega, não. Sou forte. Tomei vacina a vida inteira, o braço nem ardia. Tenho anos de vida para dois”, brincou o fazendeiro, logo após a injeção aplicada pelo técnico de enfermagem Jailson da Cruz, que foi até o local.

Viúvo há uma década, seu Armando foi casado por 74 anos com Maria da Piedade da Conceição, tendo 13 filhos, 36 netos, 31 bisnetos e um trineto. Antes da saída da equipe do EM, teve tempo para o bolo de fubá com café típico da hospitalidade mineira e o sorriso confiante de quem tem longa estrada e fé na vida.

EM BELO HORIZONTE 

A Prefeitura de BH informa que não vai divulgar o número de vacinados por faixa etária. Mas pessoas acima de 89 anos imunizadas sabem muito bem que integrar  essa turma só traz a paz.



“Vacinei, graças a Deus! Estou livre!”, resume com satisfação dona Maria Geralda Fernandes, de 105 anos. Acolhida na Casa Zita, ligada à ação social Providens, da Arquidiocese de BH, ela mostra o cartão de vacinação e já espera a hora de tomar a segunda dose. Na instituição moram 20 idosos, entre 74 e 105 anos, a maioria na faixa dos 80.

A Secretaria Municipal de Saúde informa que o cadastro dos acamados com idade entre 86 e 88 anos teve início no dia 15, e que o requeri- mento pode ser feito no portal da prefeitura ou pelo telefone 156.

A vacinação para esse público também esteve disponível em 31 postos da capital até a última sexta, sem necessidade de cadastro. A lista dos locais pode ser acessada no site da prefeitura (prefeitura.pbh.gov.br).

A vacinação de pessoas a partir de 89 anos é agendada. Os que optaram por ir a uma unidade de saúde recebem chamado da prefeitura por telefone, com informação sobre data, horário e local para aplicação. O cadastro para a vacinação desse público terminou com cerca de 19 mil inscrições nessa faixa etária.

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