Santa Maria de Itabira amanheceu no noticiário pela tragédia que se abateu sobre a cidade: as fortes chuvas fizeram encostas caírem sobre algumas casas e o Rio Girau, que é só um filete de água em tempos de seca, agigantou-se e tomou o município. Muita gente perdeu o pouco que tinha. Duas mortes foram confirmadas e pelo menos quatro pessoas ainda estão desaparecidas.
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Barragens em Itabira estão em 'parâmetros de segurança adequados', diz ValeCoromandel e Monte Carmelo transferem dois pacientes para Belo HorizonteChuva dá trégua em BH; Lagoa da Pampulha tem domingo com aglomeraçãoChuva alaga e causa deslizamentos em Santa Maria de ItabiraBombeiros confirmam cinco mortes em soterramento em Santa Maria de Itabira"Para conferir de perto", Zema vai para Santa Maria de ItabiraRisco de enchente faz Defesa Civil disparar alerta laranja em ValadaresDefesa Civil alerta para chance de granizo na noite deste domingo em BHO autor que subscreve este texto conhece bem a cidade. Nasci em Itabira em 1989, porque Santa Maria não tem maternidade. Sempre morei na cidade, onde fiz meus melhores amigos e guardo lembranças incríveis da infância. A mudança para Belo Horizonte veio em 2007 para estudar. Pais, avó materna, tias e bons amigos ainda estão por lá. Uma tia viu a casa recém-reformada praticamente submersa. O imóvel onde morei na infância virou continuação do rio.
Santa Maria ainda é a típica 'Cidadezinha Qualquer' de Carlos Drummond de Andrade - não dá pra dizer que ela tenha sido a inspiração do poeta itabirano, porque só surgiu em 1943, treze anos depois da publicação do livro 'Alguma Poesia'. O município da região Central, a 30 km de Itabira e a 130 km de Belo Horizonte, ainda tem 'casas entre bananeiras / mulheres entre laranjeiras / pomar amor cantar'.
Embora alguma modernidade tenha chegado à cidade, Santa Maria vive no ritmo do poema de Drummond: 'Um homem vai devagar / Um cachorro vai devagar / Um burro vai devagar / Devagar... as janelas olham/ Eta vida besta, meu Deus'. Neste domingo, isso mudou. A vida besta, parada, tranquila, virou vida triste para todo mundo. Santa Maria ganhou as manchetes pela sua dor.
Na madrugada de domingo, as informações já corriam pelos grupos de WhatsApp. A água invadiu as casas dos bairros que margeiam o Rio Girau: Lambari, Nova Santa Maria, Centro, Conselho e Poção. Muita gente acordou sentindo a água no corpo. Já não dava tempo de salvar nada: eletrodoméstico, guarda-roupa, carro, TV, cama, roupa. Uma vida toda indo embora com o rio. Imóveis no Bairro Poção, que fica próximo a uma encosta, foram soterrados. Nesta manhã de domingo, o Corpo de Bombeiros conseguiu resgatar sobreviventes. Escolas ficaram destruídas; o comércio no centro da cidade foi atingido.
Santa Maria é conhecida na região por ser continuação da MGC-120, onde precisa passar quem vai para as regiões de Guanhães, Passabem, Ferros, Água Boa, Rio Vermelho. A estrada ficou interditada pelos deslizamentos de terra.
Na cidade, nasceu o compositor José Duduca de Morais, autor do hino do estado de Minas Gerais. A letra fala em 'lavradores de pele tostada, boiadeiros vestidos de couro... / Operários da indústria pesada, garimpeiros de pedra e de ouro... / E poetas de doce memória e valentes heróis imortais... / Todos eles figuram na história do Brasil e de Minas Gerais'. Agora, esses homens citados por De Morais, ao lado de outras mulheres valentes, terão a missão de reconstruir Santa Maria de Itabira.