Uma das maiores tragédias ambientais e humanitárias da história do país, o rompimento da barragem B1 da Mina de Córrego do Feijão, em Brumadinho, foi desencadeado por perfurações verticais em um ponto frágil da estrutura.
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A tese da perícia é diferente daquela sustentada pela Vale até então, de que o incidente havia sido provocado pelo próprio peso do reservatório, associado às chuvas do fim de 2018.
Fragilidade
Conforme o laudo, a escavação gerou a ruptura do reservatório no alteamento de número oito, a 68 metros de profundidade. A camada era formada por um material mais fino, com pouca capacidade de suportar pressão.
O delegado Luiz Augusto Pessoa Nogueira explicou que as perfurações não ameaçariam a barragem caso ela apresentasse condições mínimas de estabilidade. Esta, no entanto, não seria a situação da estrutura em 2019.
“O motivo foi a perfuração de uma sonda mista que chegou em uma sessão da barragem que estava muito sensível ao processo de liquefação. A liquefação funciona como ondas de água que se propagam para a próxima sessão da barragem, causando um efeito dominó, que é muito rápido. O colapsamento da barragem durou 30 segundos, desde a primeira sessão que começou a se liquefazer”, detalhou o policial.
A perícia diz que a Vale abriu os orifícios a fim de estudar a composição das camadas que compunham o dique, além de instalar equipamentos que monitoram a pressão de líquidos - os chamados piezômetros.
Meses antes - entre outubro e novembro de 2018 -, a mineradora havia contratado uma empresa e especializada em investigação geotécnica para verificar as condições de resistência das diferentes seções da barragem.
O relatório contendo a localização dos pontos frágeis do reservatório teria sido entregue à Vale, mas, segundo a PF, a companhia procedeu com as perfurações verticais antes de analisar o documento.
O relatório contendo a localização dos pontos frágeis do reservatório teria sido entregue à Vale, mas, segundo a PF, a companhia procedeu com as perfurações verticais antes de analisar o documento.
"É como se a pessoa fosse fazer um exame de imagem e não entregasse o resultado ao médico para análise", comparou o delegado Nogueira.
Hipóteses afastadas
A investigação das causas do rompimento da barragem de Brumadinho trabalhou com outras cinco hipótese além das perfurações em pontos frágeis.
Uma delas é a defendida pela Vale. Uma empresa de geotecnia contratada pela empresa concluiu que o desastre foi provocado pelo próprio peso da estrutura, em condição não drenada. Este quadro teria gerado deformidades que, combinadas com as fortes chuvas de janeiro, teria ocasionado o estouro.
Exames de piezometria, no entanto, revelaram que a condição da barragem era drenada.
"Identificamos também que, anos antes, as chuvas foram bem mais severas, não houve essa condição extraordinária de chuvas em 2018", argumentou o perito Leonardo Mesquita de Souza.
As demais hipóteses descartadas pela PF foram:
- Elevação da pressão d’água interna;
- Carregamento de rejeitos provocado por detonações em mina próxima;
- Carreamento de rejeitos por Dreno Horizontal Profundo (DHP) com possibilidade de erosão interna progressiva;
- Incidente de ruptura hidráulica durante instalação de DHP em 11/06/2018;
Inquérito continua
O delegado Luiz Augusto Pessoa Nogueira esclareceu que as conclusões da perícia não encerram o inquérito. Numa próxima etapa, a PF diz que pretende realizar novas diligências e deve indiciar outros envolvidos.
Procurada pela reportagem, a Vale informou que tomou conhecimento do laudo nesta sexta-feira (26/2) e pretende avaliar "o inteiro teor do documento" antes de se manifestar.
Confira a nota da empresa da íntegra:
"A Vale informa que tomou conhecimento nesta sexta-feira (26) da expedição do laudo da perícia técnica da Polícia Federal sobre as possíveis causas do rompimento da Barragem I, da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG). A empresa avaliará o inteiro teor do laudo e oportunamente se manifestará nos autos por intermédio de seu advogado David Rechulski."