Jornal Estado de Minas

COVID-19 1 ano

Saber e autocontrole na batalha pela vida


“Tive de me reinventar”

Alessandra Magalhães Arcanjo, 34 anos, fisioterapeuta, que passou a trabalhar no modelo de atendimento remoto, além daquele presencial


“No início da pandemia, os atendimentos que realizava com o método Pilates e algumas outras modalidades foram alterados para o modelo remoto, o que antes não era autorizado pelo Conselho de Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Apesar de essa adaptação ter ocorrido de forma inesperada, foi uma ótima ferramenta para que os clientes/pacientes mantivessem as atividades, e a grande maioria se adaptou bem à nova realidade, mesmo os mais idosos. Também tive que me adaptar e me reinventar rapidamente e, apesar do grande desafio inicial, também foi uma ótima oportunidade para desenvolver essa nova vertente. Com o retorno gradual aos atendimentos presenciais, houve adaptações novamente, como a utilização de EPI’s tanto para profissionais quanto para pacientes, rígidos protocolos de higiene antes, durante e após os atendimentos, o distanciamento entre os pacientes no decorrer da sessão, entre outros. Mas aqueles clientes/pacientes que não conseguiram se adaptar nem aos atendimentos por videochamada nem ao retorno presencial com as mudanças necessárias e paralisaram as atividades tiveram prejuízos consideráveis na evolução de seus tratamentos.”




 

(foto: Arquivo pessoal)
 

“Combateremos até o fim”

Natã Oliveira Andrade, 42 anos, médico plantonista do CTI do Hospital São Francisco e do Hospital São Lucas. Ele e a mulher, 
enfermeira, se contaminaram na linha de frente do combate à doença


“Tem sido desafiador cada novo dia na linha de frente do combate à COVID-19. Inicialmente, nos encontrávamos assustados e sem informações consistentes. Os primeiros meses foram críticos. E, ao mesmo tempo que construímos estratégias de cuidado, também construímos estratégias para nossa própria proteção. Entre altos e baixos dentro das curvas de contaminação, os medos eram sempre os mesmos: receio pela própria vida e das pessoas que amamos. Em um curto espaço de tempo, me infectei, e minha esposa que é enfermeira em uma ala com pacientes infectados, também. Mas, buscamos forças na fé e na missão de salvar vidas. Nada de grave aconteceu, e permanecemos lutando e dando o nosso melhor para devolver saudáveis às suas famílias  pessoas que chegam até nós doentes. Nesse período, porém, tivemos dificuldades, como no manejo de pacientes críticos, e demos o nosso eu em um trabalho interminável e com uma força sobrehumana para tudo correr da melhor forma possível. Mas a exaustão não tardou. Não há como negar: estamos exaustos. Não tem sido fácil, mas vamos em frente. Combateremos até o fim.” 
 

(foto: Arquivo pessoal)

“Continuamos no caos”

Ana Maria Rodrigues dos Santos, 35 anos, cuidadora de idosos, que perdeu vários pacientes para a COVID-19. Ela alerta que para vencer a pandemia é preciso do envolvimento de toda a população


“Tomei conhecimento da pandemia quando o vírus já provocava um caos na cidade. O comércio se fechou e ficamos em casa em isolamento total. Não trabalhei por um tempo e só voltei ao trabalho em setembro do ano passado. Vivemos uma situação muito difícil para todos nós, que afetou financeiramente e tive que restringir muitos gastos. Minha percepção é de que falta consciência de muitos, por estarmos vivendo uma pandemia, mas as pessoas não respeitam a necessidade de se isolar e prevenir-se. No início do isolamento tive a impressão de que estávamos vivendo uma situação de risco, mas que passaria logo. Hoje, acho que continuamos no caos. Quando voltei a trabalhar, estive com vários pacientes de risco e perdi muitos deles para a COVID-19. Isso me deixou em situação bem difícil. Como cuidadora, peço que as pessoas tomem o máximo de cuidado que puderem para que o vírus não se propague mais e possamos superar essa situação. Temo pelos meus familiares porque estamos lidando com uma doença desconhecida. Se cada um fizer sua parte vamos vencer e retomar nossa vida normal.” 
 

(foto: Leo Lara/Divulgação)
 

“Precisamos da ajuda de todos”

Melissa Valentini, 45 anos, médica infectologista do Grupo Hermes Pardini, que renovou a esperança com a c hegada das vacinas, mas recomenda as medidas sanitárias contra o vírus


“Este último ano foi muito desafiador. No início, tinha muito receio de me contaminar e levar a doença para meus familiares. Depois que avaliamos os protocolos de segurança e utilização dos equipamentos de segurança fiquei mais tranquila. No trabalho, mantenho o uso de máscaras por todo o período, higienização das mãos muito frequente e atendimento de pacientes com suspeita de COVID-19 com toda a paramentação adequada. Nunca trabalhei tanto e com uma carga tão grande de estresse e responsabilidade. E o apoio do meu marido e dos meus filhos foi essencial. Com a carga excessiva de trabalho, fiquei muito ausente. Não conseguimos conversar, mas eles entendem que estávamos diante de um momento único e que é essencial que me dedique integralmente ao meu trabalho. O que dá forças é saber que posso fazer a diferença na vida das pessoas, tanto no individual quanto no coletivo. Lidar com pacientes e colegas que ficaram emocionalmente fragilizados com toda essa situação também foi desafiador. E, para isso, precisamos ter serenidade, nos manter ativos e coerentes com o que acreditamos, e sermos exemplo. Cada um sabe as dores que sente e como consegue lidar com elas. Temos uma esperança com a chegada das vacinas, mas ainda é cedo para falarmos em fim de pandemia. Precisamos manter a vida nesse ‘novo normal’: uso de máscaras, distanciamento, higienização das mãos e evitar as aglomerações. Ainda precisamos da ajuda de todos.” 
 

(foto: Arquivo pessoal)
 

“Um desafio diário”

Renata Vital Franco Pimenta, 43 anos, enfermeira obstetra da Maternidade Julia Kubitschek e do Centro de Saúde Etelvina Carneiro/PBH. Ela vive a rotina exaustiva de atendimentos e acredita em missão


“É muito tenso estar na linha de frente. Um desafio diário. Recebemos pessoas com medo, fragilizadas e, às vezes, até hostis. Na obstetrícia com a parturiente, o contato é ainda mais intenso. Em todas as situações, saímos da sala molhados de suor. Nós, profissionais de saúde, também temos medo. No início, ninguém conhecia nada sobre a doença. Os protocolos estavam sendo construídos e em constante reconstrução. Os colegas médicos, enfermeiros e técnicos de enfermagem tentando entender as rotinas implantadas e a cada momento surgia uma nova nota técnica. Recebíamos à noite, no final de semana, no feriado. Estudávamos coisas que no outro dia já haviam mudado. Ninguém sabia nada. Todos estavam à procura de respostas. Cheguei a pensar em mudar de casa para não correr o risco de contaminar meus familiares. Pensava qual era o risco/benefício da minha presença em casa. Por vários meses, cheguei a dobrar carga horaria, fazendo 20 plantões noturnos em um mês, além de trabalhar em uma unidade básica de saúde durante o dia. Chego, todos os dias em casa correndo para tirar a roupa e ir direto para o banho, e sempre choro pedindo a Deus que me lave e tire toda a contaminação de meu corpo. Isso é muito difícil. O cansaço é real, palpável. Há dia em que chego em casa e mal dou conta de comer. Junto minhas forças para ver as atividades da escola com minha filha. Algumas vezes, nem isso consigo fazer diante do cansaço físico, mental e emocional. Mas temos que seguir em frente, temos uma missão.” 
 

(foto: Arquivo pessoal)
 

“Desistir não é uma opção”

Daniel da Cunha Ribeiro, 33 anos, especialista em fisioterapia em terapia intensiva, presidente da Associação Brasileira de Fisioterapia Cardiorrespiratória e Fisioterapia em Terapia Intensiva e coordenador do serviço de fisioterapia do Hospital da Unimed-Contorno


“Vivemos períodos angustiantes e de muitas perguntas sem resposta. O que nos mantém firmes nessa luta diária é o bem maior: o paciente. Não tem sido fácil, mas nós, fisioterapeutas, temos obrigação ética de seguir a prática baseada nas melhores evidências científicas e isso exige muitas horas de estudo. Nos dedicamos muito para garantir ao paciente as melhores práticas em saúde. Juramos nos dedicar ao paciente e garantir o seu bem-estar. Assim, avaliamos as necessidades individuais e traçamos um plano terapêutico baseado no diagnóstico fisioterapêutico. E, por mais que algumas situações pareçam nos colocar em uma ‘sinuca de bico’, desistir não é uma opção, pois, nesse momento, somos verdadeiros pilares de apoio. Por isso, pensar no grande número de pessoas que perderam suas vidas e ter a certeza de que podemos ajudar nesse combate é o que nos move. Gostaria de agradecer ao time multidisciplinar que atua na linha de frente no combate à COVID-19, principalmente aos fisioterapeutas. Nós somos profissionais indispensáveis no tratamento de condições agudas e crônicas de saúde e temos papel fundamental para a adequada condução dos casos de pacientes infectados. Que possamos continuar desempenhando nosso papel com primor e contribuindo para a saúde da população.” 
 

SEM TRÉGUA: 92,1% dos médicos na linha de frente do combate à COVID-19 no Brasil já apresentaram algum sintoma de exaustão, de acordo com pesquisa realizada pela Associação Médica Brasileira (AMB) 

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