Jornal Estado de Minas

COVID-19

Idosos que receberam segunda dose da vacina afirmam: sensação é de alívio



Os braços que carregaram durante décadas cadernos de alunos, puxaram com delicadeza as linhas do bordado feito no linho e até comandaram um bloco de carnaval já receberam as duas doses da vacina e, com as mãos postas, agradecem a Deus, a Santa Rita e à ciência pela esperança fortalecida contra a COVID-19.



Aos 94 anos, a professora aposentada e bordadeira talentosa Terezinha Mateus se mostra feliz da vida por estar imunizada, deixando os olhos azuis brilharem para demonstrar tanto alívio. “A gente fica mais tranquila, né? Pode pensar melhor em tudo.”

Viúva e matriarca de uma família formada por seis filhos, sete netos e uma bisneta, dona Terezinha, devota de Santa Rita, mora ao lado da Igreja do Rosário, em Santa Luzia, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, e tem planos pós-pandemia.

“Quero ir à Igreja Matriz de Santa Luzia e ao Mosteiro de Macaúbas para agradecer. O coronavírus é um sofrimento muito grande para todo o mundo e, mesmo vacinada, vou continuar usando máscara e tomando cuidado”, garante.





Para Terezinha, que também foi supervisora de ensino e conta muitas histórias sobre escolas da zona rural e campanhas de vacinação no século passado, o dedo em V representa a segunda dose da CoronaVac e a vitória da esperança em tempos tão difíceis.

No município, segundo a prefeitura, já receberam a dose de reforço 1.769 pessoas (profissionais de saúde, maiores de 18 anos institucionalizados com deficiência, idosos de instituições de longa permanência e idosos acima de 80 anos).

Em outras cidades incluindo BH, onde 73.169 idosos a partir de 86 anos receberam a segunda dose, o momento é de confiança e expectativa quanto à imunização em massa da população. E de alívio para quem já recebeu as duas aplicações.





Inêz Aguiar do Nascimento Rocha, de 89 anos (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)


'BOM PRA CARAMBA'


Em Ibirité, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, o comentário do aposentado João Teodoro, de 82, é superlativo para descrever a sensação de receber segunda dose da vacina. “Foi bom para caramba!”, ele diz, antes de uma sonora gargalhada. Sem qualquer tipo de reação ao imunizante, seu João, natural de Manhuaçu, entende que ainda é muito cedo para fazer planos: “Vamos ter que esperar muito tempo para sair, abraçar as pessoas”.

Casados há 58 anos, seu João e dona Cecília, de 78, tiveram 11 filhos e veem a família crescer com os 27 netos e 8 bisnetos. “Receber a segunda dose ainda é para poucos, mas tenho confiança de que muita gente vai ser vacinada”, diz ele. Ao lado, a esposa mesmo aguarda a vez, pois ainda não tem idade.

Nascida e criada em Ibirité, Inêz Aguiar do Nascimento Rocha vai completar 90 anos em 20 de abril e quer chegar lá cheia de energia para comemorar a data, do jeito que for possível, com os seis filhos e seis netos. “Pelo menos, recebi as duas doses da vacina, o que me deixa bem animada”, revela. Recuperando-se de uma queda em casa, dona Inêz se considera “de castigo” devido às limitações. “Minha casa tem dois pavimentos e uma escada com 19 degraus. Antes de cair, eu cozinhava, arrumava, fazia tudo. Agora, ficou impossível.”





Viúva de José Rocha, que era dono de uma loja de material de construção, dona Inêz faz questão da “carapuça” (como se refere ao acento circunflexo) no nome e faz valer o sobrenome Rocha. “Sou forte, ajudava meu marido a carregar saco de cimento. Quando criança, montava cavalo em pelo, gostava de pedalar, era a única menina na turma de 11 meninos.”

No início do seu rígido confinamento, a moradora de Ibirité começou a desenhar a cidade da sua infância. “Tudo era bem diferente, tinha muita fazenda”, recorda-se. Por isso, quer realizar um desejo tão logo termine a pandemia. “Vou sair por aí com a minha neta Maria Eugênia, para mostrar a ela todos os lugares de que gosto tanto”.

Dedé Pimentel, 88 anos (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press )

SEM EFEITOS COLATERAIS

Em Belo Horizonte,  dona Carmen Lima, de 98,  recebeu a segunda dose da vacina e se declara “muito bem e feliz” por estar imunizada: “Mesmo não dando conta de sair mais, pelo menos posso receber a visita dos meus netos e amigos”. Ela conta que não sentiu nenhum efeito colateral. A filha, Zuleika Lima Barbosa, a cadastrou na prefeitura, e as doses foram aplicadas no intervalo de 15 dias.




“Agora, estou satisfeita e posso sonhar. Quero ver o Galo ser campeão e conhecer nosso novo jogador, o Hulk.” E manda um recado. “Se ele não puder vir me ver, pelo menos uma camisa do Galo com autógrafo”, pede ela, que trabalhou durante 40 anos como catadora de papéis e mora na Pedreira Prado Lopes, vizinha ao bairro Lagoinha, na Região Noroeste.

Em outro ponto da cidade, o produtor rural aposentado Dedé Pimentel, de 88, viu a preocupação se transformar em alívio depois de ser vacinado. “Tomei a primeira dose em 13 de fevereiro, e a segunda em 6 de março. Confesso que fiquei apreensivo quando tomei a primeira vacina na Rua Paraíba, e a segunda no Corpo de Bombeiros. Mas só ardeu um pouco e não senti nenhuma reação. Felizmente, não tive que tomar nenhum remédio”, conta o morador do bairro Cruzeiro, na Região Centro-Sul de BH.

Aliviado, Dedé conta que aguarda o resultado da eficácia da vacina. “Minha expectativa é ótima, espero que dê certo. Estou muito satisfeito de ter tomado uma vacina produzida por um povo com sete mil anos de civilização”, diz ele, em relação à CoronaVac, desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac.





Carmen Lima, 98 anos (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A Press)


A hora da imunidade

De acordo com o médico infectologista Carlos Starling, a segunda dose da vacina contra a COVID-19 é a que realmente imuniza. “A primeira provoca um estímulo de reação no organismo, mas não suficiente para gerar anticorpos em nível protetor. A segunda dose é que dá proteção compatível com o que foi publicado nos estudos da fase três. Sem a segunda dose, a pessoa não estará imunizada completamente”, explica.

Segundo o médico, no caso da vacina de Oxford, após o 21º dia já é possível um nível de anticorpos “muito satisfatório, mas a segunda dose é que vai conferir a proteção máxima. Cada uma tem um nível de proteção, conforme o que já foi publicado.”

Após a segunda dose, a imunidade se torna efetiva em torno de 14 a 21 dias, explica Starling. Quanto à duração da imunização, ele diz que ainda não há dados suficientes. “Acreditamos que seja em torno de um a dois anos. Mas isso ainda tem que ser confirmado por estudos prospectivos, porque não temos tanto tempo assim para avaliar os pacientes que receberam a vacina.”

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