Trinta e cinco mandados de prisão temporária e 124 de busca e apreensão estão sendo cumpridos em 39 municípios na operação Expresso, que investiga esquema bilionário de sonegação fiscal no ramo de comercialização de café em grãos crus. A ação foi desencadeada de forma coordenada, nesta terça-feira (16/3), em Minas Gerais, São Paulo e Espírito Santo.
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Os envolvidos também são suspeitos de crimes de falsidade ideológica, lavagem de dinheiro e associação criminosa. O prejuízo aos cofres públicos pode chegar a R$ 1 bilhão em impostos, multas e correção monetária.
O valor é suficiente para comprar 17,2 milhões de doses de vacinas contra a COVID-19. “Daria para fazer 670 quilômetros de asfaltos. A obra mais cara aqui em Londrina no ano passado foi a de um viaduto de R$ 18 milhões. Fariam 55 viadutos”, exemplificou o delegado da Receita Federal de Londrina, Reginaldo César Cardoso. O montante também abriria 5.540 novos leitos de UTI.
O esquema
As investigações começaram em março de 2019, a partir de uma operação desencadeada em Uberlândia, no Triângulo Mineiro. O esquema envolve a participação de produtores de café em grão cru de Minas Gerais e também do Espírito Santo, indústrias e corretores do Paraná e empresas de fachada em São Paulo. Ainda estariam envolvidos transportadores, proprietários e representantes de torrefações paranaenses conhecidas no ramo cafeeiro nacional.
A partir das apurações e cruzamento de dados entre os órgãos envolvidos na operação, eles conseguiriam identificar os "mentores intelectuais". "Não é uma fraude nova, ela já se perpetua por vários anos. A gente conseguia chegar com facilidade nas empresas laranjas, mas com dificuldade nas empresas beneficiadas", disse Cardoso.
Como funcionava o esquema
Produtores vendiam o café para indústrias do Paraná. Esse intermédio era feito pelos chamados corretores. Entretanto, para evitar a dedução do ICMS – taxado na operação - eles agiam de “má-fé”. Para isso, eram emitidas notas fiscais falsas para evitar o recolhimento do tributo. Eles usavam empresas de fachadas e laranjas para viabilizar o esquema fraudulento.
As operações envolvendo empresas dos dois estados possibilitavam o não recolhimento do ICMS sobre as notas fiscais falsas. Paralelamente, outra empresa “noteira”, situada em São Paulo, emitia notas fiscais falsas destinadas a atacadistas e torrefações do Paraná. “Alguns corretores agindo de má fé oferecem um kit para essas empresas (...) Eles dissimulam, ao invés da Nota Fiscal seguir o caminho normal, eles criam intermediários. Uma empresa mineira para vender para o Paraná ela teria que pagar 12% de ICMS. Ocorre que se vender o café dentro do estado de MG, ele não precisa pagar”, explica o auditor da Receita Federal de Minas Gerais, Flávio Andrada.
Na aquisição irregular do café em grão cru, os destinatários do Paraná se beneficiavam com o crédito de milhões de reais em ICMS de operações interestaduais fraudulentas que nunca foram pagos.
As investigações apontam ainda que, por diversas vezes, o produto adquirido por meio de notas fiscais falsas oriundas de São Paulo era destinado a empresas de café solúvel de Londrina e de Cornélio Procópio, ocasião em que, simulando uma venda da mercadoria dentro do Paraná, os atacadistas emitiam uma terceira nota fiscal falsa, acarretando aos próprios atacadistas o não recolhimento do tributo.
Prejuízo bilionário
As investigações apontam que as “noteiras” – empresas de fachada - de Minas Gerais e de São Paulo emitiram mais de R$ 6 bilhões em notas fiscais falsas, entre janeiro de 2016 e fevereiro de 2021, sendo R$ 2 bilhões só em 2020. Os valores devidos aos cofres mineiros passam de R$ 350 milhões e de R$100 milhões aos do Paraná, considerando multas e correções.
Houve também sonegação de tributos federais. O montante, neste caso, pode chegar a R$ 200 milhões. Para regularizar a situação, os produtores podem aproveitar o período do imposto de renda para fazerem a “denúncia espontânea”. “Aqueles que esperarem a ação fiscal, vão perder o benefício da denúncia espontânea”, afirma Andrada. Neste caso, o valor estimado a ser declarado de R$500 milhões pode chegar a R$ 3 bilhões quando aplicados juros e multas.
A operação
A força-tarefa é coordenada pela Polícia Civil do Paraná, por meio de sua Divisão Estadual de Combate à Corrupção, com a atuação integrada, dentro das atribuições de cada órgão envolvido, da Receita Federal do Brasil; das receitas estaduais de Paraná, Minas Gerais e São Paulo; dos ministérios públicos do Paraná e Minas Gerais; das polícias civis do Espírito Santo, São Paulo e Minas Gerais; e da Polícia Científica do Paraná.
Os mandados judiciais foram cumpridos em 39 municípios: Londrina, Carlópolis, Cornélio Procópio, Ibaiti, Jandaia do Sul, Mandaguari, Maringá, Matinhos, Pérola, Rolândia e Santo Antônio da Platina, no Paraná; São Paulo, Espírito Santo do Pinhal, Hortolândia, Itatiba, Itu, Leme, Santo Antônio do Jardim, São Bernardo do Campo e Santos, em São Paulo; Vitória, Colatina e Vila Velha, no Espírito Santo; Belo Horizonte, Aimorés, Andradas, Borda da Mata, Divino, Itamogi, Itueta, Manhuaçu, Matozinhos, Miraí, Muriaé, Ouro Fino, Patrocínio, Poços de Caldas, São Sebastião do Paraíso e Varginha, em Minas Gerais.
O balanço final da operação ainda não foi divulgado.
*Amanda Quintiliano especial para o EM