Hospitais preveem falta de medicamentos essenciais para intubação
Com avanço da COVID-19, escassez de remédios como sedativos já é considerada crítica e Ministério da Saúde requisita estoques da indústria para suprir o SUS
Por
Déborah Lima
19/03/2021 06:00 - Atualizado em 19/03/2021 07:12
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A crise de falta de leitos hospitalares em todo país, diante da piora dos indicadores da COVID-19, se agrava devido a um novo obstáculo criado pela escassez de medicamentos básicos para intubação de pacientes contaminados pelo vírus em estado grave. Com a explosão de internações, entidades representantivas do setor de Saúde temem o desabastecimento de insumos e remédios essenciais. Ontem, o Ministério da Saúde requisitou os estoques da indústria de medicamentos que compõem o chamado “kit intubação”, incluindo anestésicos e bloqueadores musculares, para abastecer a rede do Sistema Único da Saúde (SUS) por 15 dias. Em Minas Gerais, o número de diagnósticos da doença respiratória alcançou, ontem, 1.003.104 e os óbitos somam 21.303 desde o início da pandemia.
Profissionais da saúde e gestores hospitalares reclamam da falta de medicamentos básicos para intubação, como Midazolan, Fentanil, Rocurônio e Propofol, entre outros. A queixa é que, além dos preços altos, a demanda elevada pressiona o fornecimento. “Estamos vendo insumos que já estão sendo colocados em lista de espera, indicando que há um risco de começar a faltar. Aliado a isso houve aumento de até 700% dos preços de alguns dos itens como o Midazolam”, afirma Wesley Marques, superintendente da Associação e Sindicato dos Hospitais, Clínicas e Casas de Saúde de Minas Gerais (conhecida como Central dos Hospitais).
Hospitais da Região Metropolitana de Belo Horizonte consultados pela reportagem do Estado de Minas informaram que, no momento, o estoque tem sido suficiente. Porém, médicos afirmam que todos os tipos de sedativos e bloqueadores neuromusculares – necessários para os procedimentos em terapia intensiva – correm o risco de faltar a curto prazo. É o que diz Rogério Sad, médico intensivista e coordenador do Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital Vera Cruz. “Alguns sedativos vem faltando. Não sei até quando isso vai durar não”, comenta.
Rogério Sad explica que a escassez não é um problema localizado e pode se tornar mais grave, repetindo o que ocorreu no ano passado, no início da pandemia do novo coronavírus. “Na verdade, isso está acontecendo em todo o mercado. A indústria aumentou os preços dos insumos em geral, assim como das luvas e máscaras. Isso levará a uma nova crise de desabastecimento como na primeira onda de COVID-19”, prevê o médico.
No Hospital Vera Cruz, não há mais vagas para pacientes com COVID-19 em leitos de CT (Centro de Terapia Intensiva). A lotação evidencia a necessidade de utilização dos insumos. “É preocupante para os dois lados da doença: para os profissionais de saúde e para os pacientes. Se faltar luva, capote, e outros EPIs (equipamentos de proteção individual), coloca muito em risco a saúde das pessoas que cuidam dos pacientes. Faltando medicação, sedação, tudo influencia no melhor tratamento possível desses doentes. Isso nos preocupa muito”, diz o coordenador do CTI do Vera Cruz.
Em seu limite de atendimento, após expansão, Hospital Vera Cruz, de Belo Horizonte, vê dificuldade de encontrar sedativos (foto: Hospital Vera Cruz/Divulgação - 7/5/19)
O médico intensivista observa que mesmo após ampliação do atendimento, o sistema hospitalar em geral enfrenta uma situação de limite de capacidade. “No caso de COVID que os pacientes precisam muito de ventilador, sem sedativo é quase impossível ser feito. Precisamos ter muito cuidado nesse momento. Todo o sistema está no limite, no Vera Cruz ampliamos em quase 30% e mesmo assim estamos completamente lotados.”
A Central de Hospitais informou ainda que cobra posicionamento da indústria farmacêutica em relação à disparada de preços dos medicamentos e insumos, pois ainda não ficou claro se faltam os produtos ou se há abuso na cobrança. “Essa é uma resposta que a indústria precisa nos dar. São grandes empresas produtoras envolvidas que certamente tiveram tempo de identificar este aumento e adaptar a sua cadeia produtiva, haja vista que não se tem expectativa de a COVID desaparecer do nosso meio tão cedo”, afirma o superintendente da associação, Wesley Marques. Uma preocupação é que a intubação necessita de sedativos.
Reutilização
A Prefeitura de Belo Horizonte informou que as unidades hospitalares geridas pela Secretaria Municipal de Saúde não sofreram desabastecimento e que o monitoramento dos estoques é realizado diariamente. A pasta não informou se tem encontrado dificuldade ao adquirir os insumos. Em entrevista ao EM na última terça-feira, o secretário de Saúde da capital, Jackson Machado, revelou que o município tenta obster autorização para reutilizar um material fundamental nas salas de terapia intensiva, os tubos endotraqueais, que servem para intubar os pacientes.
A Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG) admitiu que houve aumento do consumo de medicamentos usados em terapia intensiva, o chamado “kit intubação”, “mais especificamente de itens necessários à intubação de pacientes, indicando um cenário crítico de escassez”, diz a nota enviada à reportagem. “Ainda nesse contexto, a SES-MG efetuou planejamento extraordinário para aquisição de itens de uso hospitalar no contexto da terapia intensiva e está em contato constante com o Ministério da Saúde, o qual também está fazendo aquisição desses medicamentos e distribuindo aos estados”, completa o texto.
Importação negociada Ontem, a Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) se reuniu com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que sinalizou a liberação de importação dos insumos, facilitando processos como medida emergencial. “Estamos passando por um segundo problema: além de não ter leito, vai ter mortes por falta de medicamentos. A Anvisa foi hábil nesse planejamento. Não é só questão de medicamentos, são todos os produtos, como filtros para respiradores, por exemplo”, afirmou o presidente da Abramge, Reinaldo Scheibe, em entrevista à imprensa.
Na mesma reunião com a Anvisa, a Associação Nacional de Hospitais Privados (Anahp) entregou documento com a lista de medicamentos essenciais para o tratamento de pacientes acometidos pela COVID-19. A entidade pesquisou os remédios junto a seus associados – 40 responderam à consulta. Para alguns medicamentos há reserva suficiente para apenas cinco dias, em média, como é o caso do propofol e cisatracúrio.
Curta duração
Estimativa de estoques nos hospitais é crítica
» Previsão para uso em cinco dias: Propofol, Cisatracurio e Atracúrio
Coronavírus são uma grande família de vírus que causam infecções respiratórias. O novo agente do coronavírus (COVID-19) foi descoberto em dezembro de 2019, na China. A doença pode causar infecções com sintomas inicialmente semelhantes aos resfriados ou gripes leves, mas com risco de se agravarem, podendo resultar em morte. Vídeo: Por que você não deve espalhar tudo que recebe no Whatsapp
Como a COVID-19 é transmitida?
A transmissão dos coronavírus costuma ocorrer pelo ar ou por contato pessoal com secreções contaminadas, como gotículas de saliva, espirro, tosse, catarro, contato pessoal próximo, como toque ou aperto de mão, contato com objetos ou superfícies contaminadas, seguido de contato com a boca, nariz ou olhos.