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Estado de Minas COVID-19

''Sem sossego até para chorar quem se foi'', desabafa parente de infectados

Além de fileiras de parentes de vítimas do novo coronavírus que se formam nos hospitais, doentes do interior que fazem tratamento revelam seu temor ao EM


21/03/2021 06:00 - atualizado 21/03/2021 07:40

A assistente Jose Lima sofre junto do marido por ter perdido a sogra para o coronavírus e ainda não ver a recuperação do sogro, também contaminado, enquanto pessoas com outras doenças chegam do interior (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
A assistente Jose Lima sofre junto do marido por ter perdido a sogra para o coronavírus e ainda não ver a recuperação do sogro, também contaminado, enquanto pessoas com outras doenças chegam do interior (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
A falta de contato e de notícias dos doentes internados com COVID-19 fazem com que muitos parentes fiquem vagando em torno das instituições de saúde da região hospitalar de Belo Horizonte, onde está concentrado o maior número de pessoas afetadas pela doença respiratória em Minas Gerais. Aflitos, os familiares nem sabem como e se poderão ver seus entes que foram infectados.

Além das filas de parentes nas recepções dos hospitais em busca de notícias sobre mães, pais, filhos, companheiros e  amigos internados no isolamento imposto pela enfermidade, outra fileira, menos interativa com o atendimento dos hospitais, também é comum em todas as instituições.

É uma fileira acomodada nos fundos dos prédios para liberação dos corpos das pessoas que perderam a batalha para o vírus pandêmico. “Minha sogra morreu e a gente não sabe onde ela pegou a doença. Ela não saía para nada. Mas era muito religiosa. No culto ela ia. Pode ser que tenha pegado quando estava justamente rezando por nós”, conta a assistente de serviços gerais Jose Lima de Souza, de 22 anos. A sogra dela, Maria Aparecida Souza Silva, de 55, ficou 15 dias internada na Santa Casa de Misericórdia de BH ao lado do marido, Galdino Silva, de 66, que ainda está em estado grave.

Higienização frequente do táxi que dirige e o uso de máscara e luva são medidas essenciais para Claudison Silva, que precisa levar a mulher com frquência à área hospitalar, onde também trabalha (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)
Higienização frequente do táxi que dirige e o uso de máscara e luva são medidas essenciais para Claudison Silva, que precisa levar a mulher com frquência à área hospitalar, onde também trabalha (foto: Edésio Ferreira/EM/D.A Press)

“Foi um sofrimento doído e uma demora demais para a cabeça do meu marido e da nossa família. A gente chegou a ver um vídeo dela que os enfermeiros mostraram, intubada e sedada. Disseram que teve uma melhora, a gente até comemorou. Estávamos rezando em casa, sempre na sua intenção. Mas depois que os rins pararam, ela teve infecção generalizada. E aí o Senhor a chamou para junto dele”, lamenta a auxiliar. “Meu marido está desorientado, porque vai ter de enterrar a mãe, mas não se pode esquecer do pai, que ainda pode ser salvo. Essa doença está em todas as casas. Não nos dá sossego nem para chorar as pessoas que se foram”, desabafa Jose.

Longe de casa

Ao redor das unidades de saúde da região hospitalar, o medo de quem não tem um parente doente, mas que faz parte do movimento estrutural da região ou precisa de atendimentos paralelos, também é evidente. Na Praça Doutor Lucas Machado, que é contígua ao passeio da Santa Casa, entre a Avenida Brasil e a Avenida Francisco Sales, cada canteiro de palmeiras e suculentas se tornou um banco para espera ao ar livre de pacientes de outras especialidades que temem se aglomerar no atendimento interno dos hospitais, um ambiente propício à contaminação pelo novo coronavírus. A maioria deles vem do interior e não pode interromper seu tratamento.

“Na nossa cidade, Pará de Minas, há muitos doentes nos hospitais Nossa Senhora da Conceição e Padre Libério. Está uma tristeza só por lá também. Então, quando venho para o meu tratamento de leucemia, que faço desde 2018, o que mais dá é medo. Ainda mais sabendo que tem mais doentes na Santa Casa do que lugar para eles ficarem”, desabafa a aposentada Severina Francisca Alves de Souza, de 46.

Corajosa, a acompanhante dela, a professora Elvânia Vitória de Souza, de 50, afirma que não vai deixar a amiga sozinha nesse momento. “Ela precisa de tratamento e precisa de alguém com ela. Com o coronavírus ou sem, eu vou sempre ficar ao lado dela. A gente se protege, usa a máscara, tem álcool em gel. Lá dentro eles me disseram que tem isolamento, mas não posso entrar”, disse.

Na fila dos táxis que servem a quem chega e sai da região hospitalar, o taxista Claudison José da Silva, de 47, se viu preso à região e faz de tudo para não ser contaminado. “Meu ponto tem de ser esse, porque a minha mulher faz tratamento de câncer na Santa Casa. Por isso, só me resta mesmo rezar e higienizar tudo do carro, das maçanetas aos bancos, usar máscaras e luva. Sei que já transportei uma esposa de um doente de COVID-19 e outros parentes. Deu medo. Não sei se uma pessoa contaminada veio dentro do meu táxi, pode acontecer e eu nem ficar sabendo. Por isso tenho de tomar cuidado e conviver com esse medo”, disse.


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